Tirando um par de vezes em que escrevi aqui sobre José Sócrates, é raro vir espreitar os comentários que os leitores deixam aos textos. A minha abstenção não se deve a sobranceria nem cobardia, só mesmo preguiça. No caso dos artigos em que visei o ex-primeiro ministro, a curiosidade com a caixa de c
2017 não é nada. É só um número vago, mesmo que seja recordista - o maior numeral de todos os Annis Domini. É o ano mais contemporâneo, mas com cada vez menos características para que lhe chamemos avançado. Em 2017 somos actuais, sem que isso nos impeça de conviver com ruindades antigas. O mal renov
Não acredito na reencarnação. De todo. Nem acredito na possibilidade de falarmos com os que já morreram. De todo. Mas acredito no uso estilístico da contradição, e é por isso que vou começar a relatar uma espécie de reencarnação, para depois me esvair numa sentida mensagem dirigida a alguém que já n
“Burro não é o que não sabe, é o que não quer saber”. Tenho pouca certeza se estou a citar correctamente o provérbio, mas fi-lo com um não-saber honesto - típico daqueles que, segundo o mesmo provérbio, não são os verdadeiros burros. Este ditado popular leva-me à dicotomia da estupidez que Robert Mu
Certo amigo que escrevia crónicas quinzenais revelou-me a sua angústia. Havia um nervoso (em nada miudinho) que o atacava na semana anterior à entrega dos artigos de opinião. Encontrar um tema que o determinasse a escrever era motivo de insónias e fastios. Agora que levo quase meia centena de textos
Já vi tantas vezes o filme “A Desaparecida” do John Ford, e sei-o tão ao pormenor, que tenho de conter-me para não estar constantemente a citá-lo, ou usá-lo em analogias, ou torná-lo introdução para os assuntos em que reflicto. Como podem perceber, a contenção hoje de nada me valeu. O que traz um we
Donald Trump Junior vai ser representado por um advogado da máfia nas alegações de interferência russa no processo eleitoral americano. Não foi fácil redigir a última frase mantendo a seriedade que o assunto exige. Parece ficção, daquela exagerada e inverosímil que nos ocupava a televisão nos anos 8
2017 é o ano em que os portugueses chegam a Julho a precisar mais duma silly season do que de férias. O ano em que o ambiente iodado da praia, o ar puro do campo, são menos salutares que telejornais a abrirem com ninharias: festas do bivalve ou escaldões de famosos. O Verão em que o corpo pede desca
Anuncio para hoje uma intervenção tripartida, entre curtas justificações e desabafos. Há duas semanas escrevi aqui, e mal – não posso deixar passar em claro. Na semana passada não escrevi aqui, e menos mal – deixei passar em claro; não posso. Na próxima semana não sei o que irá acontecer – talvez al
Há 33 anos e 1 dia morria o António Variações. Lembro-me como se fosse anteontem. Eu era bem pequenino, mas o Variações era bem grande; impensável esquecer-lhe a vida, impossível esquecer-lhe a morte. Por muito que Portugal ainda fosse um país de mentalidade fechada (por muito que ainda o seja), te
Algures em Lisboa há um bar de aspecto tão clandestino e decadente que, sendo certa a decadência, é provável a clandestinidade. Por isso abster-me-ei de lhe referir o nome – mas não para adensar qualquer mistério. De mistérios e encantos precisa pouco, até porque é um sítio onde simultaneamente memó
Fui ao Prós e Contras. Esta informação não parecerá contundente ao estimado leitor, mas só porque o estimado leitor ou nunca foi ao Prós e Contras ou, quando lá esteve, sabia o que andava a fazer. Eu tinha vaga ideia daquilo a que ia, agora tenho só ideia vaga.
Proponho o seguinte exercício: fechem os olhos e imaginem que o Brad Pitt está aí à vossa frente em tronco nu. Não se apoquentem que não há um pingo de perversão nisto que sugiro, e o objectivo até é, digamos que, científico. A segunda parte desta experiência passa por pensarmos noutro galã cinquent
De que se faz a História de Portugal? Num país, ora à beira-mar plantado, ora à deriva (pelos vistos, nem para lugares-comuns há consenso) onde é que se faz História hoje em dia? É neste momento particular, de optimismo e celebrações, que me interessa saber o que é isso de andar para a frente; se sã
Não sei forjar assinaturas — exceptuando a minha própria (sempre com ar falsificado quando me colocam a pressão de escrevê-la “como no B.I.”) — mas sou mestre a forjar indignações. Este parágrafo é o duma indignação forjada, uma irritação fácil de desmascarar. Digo-me indignado com a atenção recente
Não sei se os blogues ainda são relevantes, ou se foram mortos pelo Facebook (da mesma forma que o video matou a radio star, como na canção dos Buggles), mas lembro-me que há uma década ainda eram “a cena”. Fui um blogger desconhecido, embora com o pé dentro dum círculo nobre de blogadores, alguns q
Hoje estamos no rescaldo do 25 de Abril, tanto o hoje específico do 26 de Abril de 2017 como o Hoje do Presente, o hoje que foram todos os dias dos últimos 43 anos.
O mundo está descarrilado e incerto, um pouco ao contrário das marchas militares em Pyongyang. Essas são paradas espectaculares, coreografadas ao pormenor, sincronizadas ao milímetro e ao segundo. Estava a vê-las num noticiário e a deixar-me hipnotizar pelo efeito. Senti-me num regresso ao passado –
Tenho uma capacidade muito falsa de me surpreender com o meu país. A ruralidade, sobretudo, surpreende-me duma forma falsa. O maravilhamento é genuíno, mas a surpresa que o aumenta é falsa.
Isto é um espaço de opinião, mas hoje pretendo que seja um espaço de memórias. Ou, melhor, da falta delas. É que as opiniões são (por definição) subjectivas, e as memórias não deixam de sê-lo também – filtradas, revisionadas, selecionadas e (sabe-se lá) inventadas por quem as conta. Revelam-se muita
Havia tanto para não se dizer sobre o Brexit. É um assunto que tenho evitado, nem sei se pelo desalento se pelos contornos xaroposos do fim duma relação. Mas acho que é isto que me irrita e mantém calado sobre o assunto: a demasiada facilidade com se tecem metáforas de divórcio. Gosto de praticar pa
“Roll over Beethoven and tell Tchaikovsky the news” é um refrão, é a frase mais rock ‘n’ roll de sempre e é, talvez, a maior profecia que alguma vez se acompanhou à guitarra eléctrica. “Roll over” – uma ordem que simultaneamente significa “afasta-te para dar lugar” e “dá voltas na campa”. “Vai-te em
“Português indignado” são sinónimos ou uma redundância? É lugar-comum ou é comum estar-se neste lugar? É da nossa natureza sermos indignados, ou é a natureza das coisas que assim, inevitavelmente, nos torna.
Não é altura de falar sobre os Oscar porque a poeira já assentou. O glitter já assentou. A vergonha alheia já migrou para qualquer outro escândalo mediático. Mas a verdade é que as grandes reacções à cerimónia de 2017 não são aquelas que, durante 3 ou 4 dias, abalaram os meios de comunicação. A gran