Connor Balthazor de 17 anos estava na sala de estudos quando foi chamado para uma reunião do jornal da escola. Um grupo de repórteres e editores do Booster Redux, publicação da Escola Secundária de Pittsburg, no Kansas, EUA, queria falar sobre Amy Robertson, contratada a 6 de março como diretora da instituição de ensino, conta o The Washington Post.
O jornal escolar, detalha a BBC que também noticiou o assunto, começou por trabalhar num perfil de Amy Robertson, mas, semanas depois, após alguma pesquisa e entrevistas, começaram a levantar-se suspeitas sobre as efetivas qualificações da professora. O artigo, que questionava a legitimidade das suas credenciais, acabou por ser publicado e Amy Robertson demitiu-se, a 4 de abril.
“Face às questões que surgiram, a Drª Robertson sentiu que era do melhor interesse do distrito demitir-se. O conselho diretivo concordou e aceitou a sua demissão. O conselho vai reabrir a posição e começará um novo processo de recrutamento”, pode ler-se no comunicado do Conselho de Educação das Escolas Comunitárias de Pittsburg.
À BBC, Trina Paul, editora do Booster Redux, explicou o que motivou a investigação. “Ela ia ser a diretora da nossa escola e queríamos assegurar que tinha as qualificações e credenciais adequadas. Tropeçámos em algumas coisas que a maioria pode considerar que não são legítimas”, conta.
Em resumo, os estudantes descobriram que a escola privada no Dubai onde Robertson trabalhou como diretora viu a sua licença suspensa em 2013 pelo governo dos Emirados Árabes Unidos. Além disso, a Universidade Corllins, instituição privada onde a professora tirou mestrado e doutoramento, não é acreditada pelo Departamento de Educação norte-americano, não tem morada física, nem site. Recaem sobre a instituição suspeitas de que é possível “comprar” qualificações.
Quando confrontada pelos estudantes, Robertson "deu respostas incompletas, referiu datas que não batem certo e revelou inconsistências", apontou o jornal escolar.
“A pesquisa que fizemos não alinhava com aquilo que ela nos dizia”, conta Gina Mathew, uma das jovens repórteres desta equipa de investigação, à NPR. “Essas inconsistências tinham de ser publicadas, para informar a comunidade sobre o que tínhamos descoberto”.
Ao jornal Kansas City Star, Robertson reiterou que as suas qualificações “são autenticadas pelo governo norte-americano” e acrescentou: “O estado atual da Universidade de Corllins não é relevante porque quando tirei o meu mestrado, em 1994, e doutoramento, em 2010, não existiam problemas”. Ainda assim, Robertson acabou por afastar-se do cargo.
Emily Smith, professora que acompanha o projeto de jornalismo Booster Redux disse estar “muito orgulhosa” dos seus estudantes. “Eles não tinham intenção de fazer ninguém demitir-se ou ser despedido. Trabalharam muito para descobrir a verdade”.
A demissão de Robertson catapultou os seis estudantes da equipa de investigação do Booster Redux para as notícias locais, nacionais e internacionais, com alguns jornalistas de renome a elogiar o trabalho realizado pelos estudantes, entre os quais Todd Wallack, jornalista da equipa Spotlight do jornal The Boston Globe, finalista dos prémios Pulitzer em 2013 e 2015.
A equipa Spotlight do The Boston Globe ficou célebre depois de revelar um escândalo de abuso sexual envolvendo a igreja católica, em 2002, o que deu posteriormente origem a um filme denominado "Spotlight" e que chegou ao grande ecrã em 2015.
David Fahrenthold, jornalista de política do The Washington Post e que também colabora com a CNN, deixou igualmente um elogiou aos alunos na mesma rede social.
Connie Schultz, escritora e jornalista vencedora de um Pulitzer em 2005, disse estar "orgulhosa de partilhar a profissão" com estes alunos. Os prémios Pulitzer distinguem a excelência no Jornalismo.
Conta o The Washington Post que os estudantes passaram semanas a investigar o passado de Robertson. Segundo a lei no Kansas, escreve o jornal, os repórteres das escolas secundárias estão protegidos de qualquer tipo de censura administrativa.
Todavia, reconhece Emily Smith, essa garantia reforça a necessidade de garantir que se faz um bom trabalho. Foi também necessário, conta, superar alguma hesitação natural em questionar as autoridades. Mesmo com "todos a dizerem-lhes para pararem de meter o nariz no que não lhes dizia respeito", os alunos persistiram, conta.
Apesar de apoiar a investigação, a professora que acompanha o projeto de jornalismo acabou por ter de se afastar, uma vez que integrava o comité que contratou Robertson. Os estudantes pediram então ajuda a Eric Thomas, diretor executivo da Associação de Imprensa do Kansas, assim como a outros jornalistas locais.
"No início foi excitante", conta Balthazor ao Post. "Era como nos filmes, um jornalista da grande cidade a correr atrás de uma pista".
O facto é que, desta vez, foram seis alunos - Gina Mathew, Kali Poenitske, Maddie Baden, Trina Paul, Connor Balthazor e Patrick Sullivan - de uma escola secundária de Pittsburg a fazer história. Quem sabe um dia isto não dá um filme.
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