O debate eleitoral nos ecrãs entre Scholz e Merz não teve vencedor claro e assim, tudo aponta para mudança de governo daqui a duas semanas na Alemanha. A liderança passa do SPD para a CDU, necessariamente em coligação: provavelmente, regresso do bloco central com o SPD, eventualmente com os Verdes.

As sondagens colocam a coligação à direita formada pela CDU/CSU com 30% das intenções de voto, a direita ultra do AfD com 20%, os social-democratas têm no horizonte, com 16%, o pior resultado de sempre, e os Verdes, com 14%, confirmam ter passado ao escalão dos partidos principais no cenário político da Alemanha. Os liberais FDP e a esquerda mais à esquerda Die Linke estão à beira dos 5% mas arriscam-se a não atingir essa fasquia que é condição para ganhar assento no parlamento alemão. O populismo BSW está com a mesma perspetiva.

O debate entre Olaf Scholz, líder do SPD e chefe do governo alemão nos últimos três anos e meio, e Friedrich Merz, líder da democrata-cristã CDU (o partido de Angela Merkel) foi rico na argumentação e cordial no tom, sempre respeitoso. Discutiram, sem quebrar pontes para o futuro, sobretudo, imigração, economia e política externa. São as questões centrais na atual Alemanha, a antiga locomotiva europeia mas há dois anos em recessão, muito pelas consequências da escassez de recursos energéticos em consequência do fecho da torneira do gás russo, ricochete das sanções a Moscovo pela invasão da Rússia. 

Scholz e Merz acusaram-se mutuamente logo nos primeiros minutos da hora e meia de debate. O pretendente Merz arrazou o ainda chefe do governo pelas promessas incumpridas e pela falta de credibilidade que trouxe a Alemanha a dois anos de retrocesso. Scholz acusou Merz de ter “quebrado um tabu” e “faltado à palavra” ao aceitar, há 10 dias, o apoio da extrema-direita AfD na votação parlamentar sobre política migratória. “Desgraçadamente, não sei se vai voltar a fazê-lo”, insistiu o chefe do SPD numa alusão a possíveis futuros entendimentos entre a CDU e os ultras, depois do rompimento do cordão sanitário que tem isolado os verdes.

Esta questão do muro político à extrema-direita está a inflamar a Alemanha e a mobilizar para as eleições muita cidadania que parecia estar fora do voto. A rejeição de qualquer abertura à extrema-direita pôs na rua, em manifestações, 200 mil pessoas há uma semana em Berlim e 250 mil neste sábado em Berlim. Várias pessoas disseram aos repórteres que não tinham pensado em ir votar, mas que já decidiram ir. 

Pode estar neste sobressalto o facto de a aliança de direita, apesar do mau estado do país com a governação liderada pelo centro-esquerda, não crescer significativamente acima dos 30%.

Merz, líder da CDU, já percebeu o erro de se ter aproximado da AfD através das políticas migratórias. Foi criticado dentro do partido, a começar por Angela Merkel, e gerou onda política de choque na Alemanha. Merz repete, agora, diariamente, e fê-lo com ênfase no debate na noite de domingo, que nunca fará acordos com a AfD e que não aceitará os votos deles para formar govermo.

Esta questão da política migratória, pelas implicações com a extrema-direita, sobrepôs-se à económica que parecia central. Scholz defendeu-se do mau estado da economia com o argumento de que “não fui eu quem invadiu a Ucrânia”. Merz retorquiu: “Então, perante essa crise, porque é que insistiu no fecho das centrais nucleares que funcionam?”. Sobre Trump, foi notória a convergência crítica dos dois líderes.

Daqui a duas semanas a Alemanha muda de governo. O debate deste domingo mostra que as pontes estão abertas para o regresso à grande coligação moderada formada pela CDU/CSU/ com o SPD. É um bloco central que a Alemanha conhece bem. A negociação vai ser árdua e, provavelmente, demorada. É de prever muitas minúcias no contrato de governo. O SPD sente que, com o erro migratório da CDU, recuperou fôlego nesta  ponta final da campanha.

A economia vai ser prioridade para o novo governo. A energia nuclear que Merkel tinha decidido fechar vai certamente fechar à Alemanha. Baixar o custo da energia é a esperança de motor de arranque para a reativação da economia. Merz e Scholz mostram que importa estarem juntos para que a Alemanha e a Europa mostrem força diante de Trump e Musk, É de admitir que Merz tenha vontade de desafiar os Verdes, com alinhamento moderado de resposta à emergência climática que lhes dá muitas simpatias, para que se juntem à futura coligação governamental. Merz sabe que será mais difícil governar com os Verdes na oposição.