Dezenas de milhares de manifestantes reuniram-se em frente ao parlamento no sábado à noite, atirando pedras e lançando fogo-de-artifício.

Uma imagem do fundador do partido governamental, O Sonho Georgiano, Bidzina Ivanishvili - um bilionário obscuro que fez fortuna na Rússia - foi queimada em frente ao parlamento.

O Ministério do Interior da Geórgia informou hoje que 27 manifestantes, 16 polícias e um trabalhador dos meios de comunicação social foram hospitalizados.

O primeiro-ministro, Irakli Kobakhidze, avisou que "qualquer violação da lei será enfrentada com todo o rigor da lei".

"Nem os políticos que se escondem nos seus gabinetes e sacrificam os membros dos seus grupos violentos a um castigo severo escaparão à responsabilidade", afirmou hoje o chefe do Governo, numa conferência de imprensa.

Kobakhidze negou que a integração europeia da Geórgia tenha sido interrompida.

"A única coisa que rejeitámos foi a chantagem vergonhosa e ofensiva, que foi, de facto, um obstáculo significativo à integração europeia do nosso país", disse.

No sábado, o primeiro-ministro disse que "entidades estrangeiras" não especificadas desejavam ver a "ucranização" da Geórgia com um "cenário ao estilo Maidan" - uma referência à revolução na praça Maidan de 2014 na Ucrânia, que depôs o então Presidente ucraniano, amigo de Moscovo, e desencadeou uma década de mudanças importantes para a Ucrânia, acabando por conduzir à sua atual guerra com a Rússia.

Kobakhidze também rejeitou a declaração do Departamento de Estado dos EUA, no sábado, que anunciou suspender a sua parceria estratégica com a Geórgia, condenando a decisão de Tbilissi de suspender os seus esforços de adesão à UE.

"É possível constatar que a administração cessante está a tentar deixar à nova administração um legado tão difícil quanto possível. Estão a fazer isso em relação à Ucrânia e agora também em relação à Geórgia", disse Kobakhidze sobre os EUA.

"Vamos esperar pela nova administração e discutir tudo com eles", comentou, numa alusão ao início do mandato de Donald Trump na Casa Branca, a partir de 20 de janeiro.

A vitória contestada do partido no poder, Sonho Georgiano, nas eleições parlamentares de 26 de outubro, que foi vista como um referendo sobre as aspirações da Geórgia à adesão à UE, provocou grandes manifestações e levou a um boicote da oposição ao parlamento.

A oposição afirmou que a votação foi manipulada com a ajuda da Rússia, o antigo senhor imperial da Geórgia, e que Moscovo espera manter Tbilissi na sua órbita.

Em declarações à The Associated Press no sábado, a Presidente pró-ocidental da Geórgia, Salome Zurabishvili, disse que o seu país estava a tornar-se um Estado "quase russo" e que o partido no poder, Sonho Georgiano, controlava as principais instituições.

"Não estamos a pedir uma revolução. Estamos a pedir novas eleições, mas em condições que garantam que a vontade do povo não será novamente deturpada ou roubada", afirmou Zurabishvili.

"A Geórgia sempre resistiu à influência russa e não aceitará que o seu voto seja roubado e o seu destino seja roubado", defendeu.

O anúncio do governo de que iria «suspender as negociações de adesão à UE ocorreu horas depois de o Parlamento Europeu ter adotado uma resolução considerando a votação do mês passado como não sendo livre nem justa. Para Bruxelas, as eleições representaram mais uma manifestação do contínuo retrocesso democrático da Geórgia, "pelo qual o partido no poder, Sonho Georgiano, é totalmente responsável".

A UE concedeu à Geórgia o estatuto de país candidato em dezembro de 2023, na condição de cumprir as recomendações do bloco, mas suspendeu a sua adesão e cortou o apoio financeiro no início deste ano, após a aprovação de uma lei de "influência estrangeira", similar a uma existente na Rússia e amplamente vista como um golpe para as liberdades democráticas.

Os legisladores da UE apelaram a uma repetição da votação parlamentar no prazo de um ano, sob supervisão internacional rigorosa e por uma administração eleitoral independente. Apelaram também à UE para que imponha sanções e limite os contactos formais com o governo da Geórgia.

O primeiro-ministro georgiano denunciou o que descreveu como uma "cascata de insultos" por parte dos políticos dos 27 e considerou que o Parlamento Europeu se tornou "uma arma de chantagem contra a Geórgia, o que é uma grande vergonha para a União Europeia".

Kobakhidze afirmou ainda que a Geórgia rejeitará quaisquer subvenções orçamentais da UE até ao final de 2028.

Os críticos acusam o Sonho Georgiano de se tornar cada vez mais autoritário e inclinado para Moscovo. O partido aprovou recentemente leis semelhantes às utilizadas pelo Kremlin para reprimir a liberdade de expressão e os direitos das pessoas LGBTQ+.

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