Têm entre 19 e 31 anos, são candidatos a juntas de freguesia e câmaras municipais. Uns fundaram partidos, outros concelhias, outros veem-se a braços com que verdadeiras batalhas políticas que outros diriam que não eram para gente tão nova.
Mas a idade não os preocupa. Aliás, a maioria defende que é uma vantagem: não há vícios nem telhados de vidro. Não querem carreiras na política, querem que a sua participação cívica seja sempre uma atividade paralela às áreas que amam e a que se dedicam.
Esta é uma viagem de Lisboa a Bragança por oito das candidaturas mais jovens destas eleições autárquicas para ouvir o que nova geração nos quer dizer.
Santa Clara, Lisboa
Diogo Reis tem 31 anos e é candidato do RIR à junta de freguesia de Santa Clara, em Lisboa, naquela que é a única candidatura do partido à capital portuguesa.
Entrou na política pelo Partido Socialista, onde esteve até 2019. Os incêndios de Pedrógão Grande e a atuação socialista na sequência desta tragédia desiludiram-no e em 2018, depois de integrar uma lista de oposição a António Costa liderada por Daniel Adrião com uma proposta pela eleição em primárias dos deputados, que foi chumbada, decide abandonar o partido.
“Quando a Comissão Nacional do PS chumbou essa proposta, entendi que estava esgotado ali o meu caminho no Partido Socialista. Entretanto recebi o convite do Tino para o ajudar a fundar o RIR e sou hoje um dos 25 fundadores”, conta.
Já pelo Reagir, Incluir e Reciclar (RIR) foi o cabeça de lista pelo círculo eleitoral de Braga nas últimas eleições legislativas. Mas como Diogo já não vive no distrito minhoto, nestas eleições não achou que fazia sentido uma candidatura a norte, mas sim à sua atual freguesia, “o cantinho pobre da cidade de Lisboa”.
Estudante de direito e com Jorge Sampaio como grande referência autárquica, acredita que tem “uma hipótese” numa freguesia que diz estar “esquecida e abandonada” nas mãos do PS.
A idade tem-no empurrado para a frente com as pessoas a dizerem-lhe que é preciso juventude e sangue novo, algo que contrasta com a idade da atual presidente da junta, Maria da Graça Pinto Ferreira, que tem 73 anos.
Tem como objetivo ganhar para voltar a criar sinergias entre a junta e os cidadãos e garantir que esta não continue a ser uma zona esquecida da cidade. Um dos maiores feitos que ambiciona é a criação de uma esquadra da PSP ali, uma promessa eleitoral do PS nas últimas intenções que não foi cumprida. Isto na freguesia que tem a maior taxa de criminalidade na cidade.
Alenquer
Mário Bettencourt Amaro tem 20 anos, é presidente da concelhia do CDS-PP de Alenquer, é o candidato à autarquia dos centristas e tem um grande desafio pela frente: derrotar o Partido Socialista, o único a comandar os destinos do concelho desde 1976.
Conta ao SAPO24 que começou a ganhar interesse pela política aos 16 anos, tendo rapidamente percebido que para no sistema político ter alguma representatividade tinha de estar ligado a um partido. Procurou um partido que se sentisse confortável e encontrou casa no CDS. “O meu grande critério era ser um partido onde pudesse ter um pensamento livre e que não fosse preso a nenhuma ideologia. O CDS tem várias alas diferentes de pensamento e convivem todas perfeitamente”, conta revelando que se filiou na Juventude Popular aos 17 anos e depois no CDS aos 18 anos.
A idade nunca foi um constrangimento, nem no partido nem na candidatura. “Acima de tudo é preciso ter capacidade de trabalho. Se ela for reconhecida a idade não é um problema. Até porque a idade não é um sinónimo necessário de maturidade ou capacidade de gestão”, sublinha afirmando que o que não falta são casos de pessoas que chegam a presidente de câmara sem terem tido experiência autárquica prévia e que em relação aos outros têm uma grande vantagem: “não tenho telhados de vidro, não tenho um passado do qual me envergonhe, não tenho coisas que as pessoas me possam atirar à cara”.
O facto de ter uma luta contra um partido que se eterniza no poder não o assusta. “Nós falamos com as pessoas e sabemos que existe um grande descontentamento. 45 anos do mesmo partido não é necessariamente um reflexo de que as coisas estejam polarizadas para o lado do PS. Forma-se uma teia de interesses, as pessoas têm algum receio de dar a cara por projetos políticos por alguma ligação à câmara. Nós fazemos um papel que é muito interessante e ainda mais interessante por não haver rotatividade”.
Talvez seja por isso que quando o convidamos a nomear uma figura autárquica não hesite em escolher os deputados da Assembleia Municipal de Alenquer e os vereadores sem pelouro que formaram a tão difícil oposição ao longo dos anos.
Para mudar o concelho não traz só a promessa de sangue novo, mas sim um programa com um grande tema: planeamento urbanístico e ordenamento do território.
“Nós aqui em Alenquer temos um problema sintomático que é precisamente a falta de ordenamento. Temos polos industriais em cima de zonas residenciais ou em cima de zonas agrícolas, aparecem polos logísticos em zonas completamente aleatórias, zonas industriais sem as acessibilidades devidas. Olhamos para o abandono do interior do concelho, que é maioritariamente motivado pela falta de planeamento e que leva depois ao crescimento de periferias sem a devida qualidade arquitetónica o que leva depois a uma descaracterização dos locais”, revela, explicando que a boa prática do planeamento tem depois várias repercussões ao nível das infraestruturas, sendo um ponto para melhorar a vida de todos os munícipes.
O objetivo é ganhar, mas caso isso não aconteça é continuar a lutar.
Santarém
Marcos Gomes tem 24 anos e é o candidato da Iniciativa Liberal a Santarém.
Não se pode dizer que o anuncio da candidatura do jovem que cresceu em Almoster tenha surpreendido alguém. Filho do presidente de junta da sua freguesia natal, desde cedo que foi convidado a olhar para a envolvência política e para a forma como as decisões políticas afetam a vida das pessoas.
Foi durante o confinamento que, perante uma série de decisões governativas que não achou coerentes e com as quais discordou que Marcos Gomes decidiu procurar um partido político em que encaixar. Filiou-se na Iniciativa Liberal, começou a participar nas atividades e foi convidado para liderar a candidatura a Santarém, por ser uma cidade que este conhece bem.
A idade é um contraste com um “concelho que está cada vez mais envelhecido” e um tema que quis tirar logo da campanha com uma jogada ao bom estilo do partido: um cartaz na cidade. “Já brincaram com a nossa idade, agora vamos às ideias”, pode ler-se junto a uma imagem em que o candidato aparece com um bigode desenhado.
Para Marcos, a maior vantagem da candidatura é nenhum dos candidatos “depender do sistema e nenhum de nós estar envolto no sistema partidário e ser dependente desta vida política”.
“Nenhum de nós nesta candidatura quer fazer da política carreira. O sistema partidário está montado dentro deste vício de crescimento político. Eu não consigo acreditar que fazer carreira da política possa ser um objetivo. Para mim a política tem de ser uma vocação, tem de ser um objetivo específico”, sublinha.
Tomar
Mykhaylo Shemliy, também conhecido por ‘Misha’, nasceu na Ucrânia em 1999 e veio para Portugal com oito anos. A entrada na política só começou mais tarde, já quando estava no primeiro ano da licenciatura de Gestão de Empresas. Juntamente com um colega ouviu falar do Volt, do movimento, e contactaram as pessoas responsáveis que as convidaram a serem os coordenadores do distrito de Santarém.
Misha não era para ser o candidato à Câmara Municipal de Tomar, mas uma recusa à última hora atirou-o para os boletins de voto. A família ficou surpreendida, mas apoiou-o desde logo.
A idade, essa, não foi um obstáculo, nem no partido, nem na candidatura. Só nas redes sociais ouviu alguns comentários, mas conta que se autodisciplinou a não ir ver o que as pessoas diziam nas notícias. “Percebi que era uma perda de tempo”, diz.
O facto de ter apenas 22 anos diz que pode ser uma vantagem, uma vez que a maioria da abstenção no concelho vem da parte dos jovens.
Viseu
Diogo Chiquelho tem 22 anos e é o candidato do PAN ao concelho de Viseu. A “veia de ativista” no campo do ambiente, e que consequentemente gerou uma veia animalista, levaram-no a filiar-se no PAN aos 18 anos.
Olha para o trabalho do PAN a nível nacional como uma inspiração para o que quer fazer a nível local. “Ninguém pode dizer que se falava de questões de direitos dos animais antes de surgir o PAN, era um tema de terceira ou quarta liga. E no ambientalismo era igual, falava-se do ambientalismo que se aprendia em Estudo do Meio na escola primária. O verdadeiro ambientalismo, que se baseia na verdadeira ciência, foi o PAN que o introduziu”, diz.
Em Viseu, Diogo não quer esquecer os grandes temas e por isso adapta-os à realidade local. Quer que o concelho aposte nos incentivos à produção local, “sobretudo a sustentável”, algo que diz que os outros “partidos têm alguma aversão porque quando se fala em fomentar este tipo de produção também estamos a falar em não olhar tanto para as grandes indústrias com processos produtivos altamente comprometedores do meio ambiente”, e uma aposta na economia circular para diminuir o desperdício.
A família não tem duvidas nas capacidades do Diogo, mas o próprio confessa que alguns membros ficaram receosos pelo combate em que ele estava a entrar.
“Estamos a entrar num mundo que está altamente consumido por gerações que não se renovam há muitos anos. Estamos a falar de pessoas com considerável experiência na área e que ganharam algum calo e algumas raízes e isso é algo preocupante. Este mundo de tubarões assusta sempre. Depois, um jovem de 22 anos entrar num combate autárquico, eleitoral em que estou a competir com pessoas com 50, 60, 70 anos, com muita experiência de vida e política, obviamente assusta. Contudo é só uma reação inicial, depois é de total apoio e de total incentivo, também ”, sublinha.
A idade foi um ataque que não veio. “Estava à espera de um ataque nesse sentido”, confessa-nos.
“Se há necessidade de se trazer esse argumento para cima da mesa é porque das duas uma, ou não tem mais argumentos ou o meu conteúdo é de tal forma rico que tem de ir para a parte pessoal para conseguir contrapor o que quer que seja. As pessoas percebem que existe uma necessidade de renovar os quadros políticos, os jovens não vêm com intenções de fazer carreirismo político. Eu, pessoalmente. não venho. Sou a favor da limitação de mandatos e até de candidaturas porque não é bom quando se ganham raízes na política”, diz.
Sernancelhe
Gonçalo Santos tem 24 anos e é o candidato da CDU a Sernanchelhe, concelho que sempre foi governado por partidos de direita.
Para contar como entrou na política, mete-se aos ombros de filósofos. “A minha entrada na política deve-se a ser humanista, progressista e comunista. E dando uso à representação aristotélica, um homem que não viva na cidade ou é porque é um Deus ou é porque é uma besta. Dando uso à representação platónica, é na cidade que o ser humano pode desenvolver as suas virtudes. É também por isso que estou na política e não só”.
O não só deve-se a um sentimento de combate ao “medo que é vivido” no concelho. Gonçalo diz-nos que ‘aqui’ o medo reina em várias frentes: “na situação económica, na depauperação, muitos somos os que não conseguem ser autosuficientes, com uma vida boa”. No fundo, “medo porque não tem sido uma terra para poder viver bem”.
As pessoas fogem para a cidade e por isso Gonçalo quer fugir para dentro da Câmara e poder transformar as condições de vida do concelho, ele que também já saiu para ir estudar para Coimbra e que se filiou na Juventude Comunista Portuguesa em 2020.
Se se imagina a fazer uma carreira na política? “Não imagino uma carreira na política, faço. Vou fazendo, porque o que importa é o percurso, a consciência e a responsabilidade”.
Santo Tirso
Ana Isabel Silva tem 26 anos e é a candidata do Bloco de Esquerda à Câmara Municipal de Santo Tirso.
Confessa-nos que, apesar de se ter sempre identificado com o BE, “tinha aquele preconceito de me juntar a um partido em que tínhamos de pensar todo igual”. Começou por isso a aparecer em ações como independente, relacionadas com a sua área, a ciência, e quando estava a finalizar o mestrado decidiu juntar-se e fundou com uma amiga a estrutura de Santo Tirso.
É precisamente às costas da jovem cientista e da equipa que compõe a candidatura que o Bloco está pela primeira vez a concorrer em eleições autárquicas a este concelho. E os números não têm sido um problema porque depois da fundação da concelhia “muitos outros jovens se começaram a juntar”.
A idade também não é um problema para esta candidatura, nem podia ser. Para além de Ana Isabel ter apenas 26 anos, o candidato à Assembleia Municipal tem 19 anos.
“Eu acho que as pessoas por um lado gostam muito disso, porque dizem que é preciso que os jovens se envolvam mais”, diz.
Se há desvantagem na idade não é tanto na dos candidatos, mas na do partido que aqui é novo e que por isso ainda tem um caminho a fazer para criar relação com as pessoas. A idade essa comporta uma grande vantagem: não temos vícios nenhuns e trazemos caras novas e novas ideias.
A candidatura coloca em cima da mesa a necessidade do combate às alterações climáticas, numa zona muito industrial, políticas de igualdade de género, respeito pela comunidade LGBT. “Outra das propostas novas que temos posto em cima da mesa é o trabalho, o respeito pelo trabalho digno. Somos uma zona muito industrial que tem sido marcada por baixos salários e muita precariedade”, diz.
A inspiração política para fazer mais e melhor pelo concelho vem lá de fora, do outro lado do Atlântico. “ Inspiro-me muito no Bernie Sanders, pela primeira vez achei que um político estava a dizer tudo aquilo que eu pensava”, sublinha Ana Isabel Silva.
Sobre o futuro há uma certeza, a carreira é a na ciência e não na política, embora uma coisa não impeça a outra.
Bragança
André Xavier tem 19 anos e é o candidato do Bloco de Esquerda a Bragança. O cartão do cidadão diz que é novo, mas a sua primeira eleição, ainda antes de começar a campanha, já o colocou na ‘piscina dos grandes’ com uma quezília interna no partido.
Primeiro anunciou-se que o advogado Manuel Vitorino, de 65 anos, era o candidato pelo Bloco de Esquerda à Câmara de Bragança, mas depois foi anunciada que a candidatura era a de André Xavier.
“Foi um desentendimento pequenito entre a concelhia e a distrital. Mas o único nome que foi aprovado pela distrital foi o meu e não o do outro possível candidato”, disse.
O jovem natural de Mirando do Douro diz que começou a ganhar o gosto pela política depois de uma ida ao Parlamento Europeu através da escolha e a convite de um eurodeputado. Quando foi altura de escolher um partido, a decisão também não foi difícil. Leu, estudou e encontrou no BE o local ideal para meter em prática as suas ideias.
Filiou-se este ano no partido e deixou a família “chocada” quando lhes revelou que ia ser candidato à Câmara Municipal de Bragança. Na rua, diz que a palavra que mais ouve é “coragem”.
“Não queria que a minha idade fosse vista como um argumento para me rebaixar. O que nós todos temos enquanto candidatos é melhorar e trazer o melhor futuro para o concelho. É um argumento que não tem qualquer tipo de base. A idade não é um critério fundamental, pelo contrário, eu tenho idade para ser eleito e para eleger. Existe uma limitação no caso do PR, aqui não”, lembrou.
O objetivo do André é colocar questões como “sustentabilidade, cultura, acessibilidade e inclusão” na agenda do concelho.
A política, essa, será sempre um complemento porque o sonho é só um: ser professor.
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