De acordo com o jornal britânico The Guardian, o plano de Robert Tsao foi anunciado esta quinta-feira em conferência de imprensa, com o empresário de 75 anos a envergar um colete à prova de bala e capacete.
O fundador da United Microelectronics Corp disse que vai investir um milhar de milhão de dólares taiwaneses (32 milhões de euros) da sua fortuna pessoal para “treinar três milhões de pessoas em três anos”.
O plano passa por, em coordenação com a organização de defesa civil de Taiwan, a Kuma Academy, aplicar 60% do financiamento para criar esse exército civil e os restantes 40% para treinar 300 mil pessoas com armas de fogo.
Tsao justificou este plano com o que considera ser a crescente hostilidade de Pequim e do Partido Comunista Chinês. “Se nós conseguirmos resistir às ambições da China, não só seremos capazes de salvaguardar a nossa terra, mas também faremos uma enorme contribuição à situação mundial e ao desenvolvimento da civilização”, disse.
Esta postura representa uma viragem no posicionamento de Tsao, que defendeu anteriormente a reunificação de Taiwan e da China, chegando até a renunciar à sua cidadania taiwanesa em protesto às investigações do governo à United Microelectronics Corp.
No entanto, a repressão do movimento pró-democracia em Hong Kong levada a cabo pelo governo chinês fê-lo mudar de ideias, tendo dito ontem que a sua cidadania taiwanesa tinha sido restaurada e que pretendia “morrer em Taiwan e defender o seu povo”.
A Kuma Academy foi criada em 2021 perante a vontade de muitos taiwaneses de receberem treino militar e aprenderem táticas de guerrilha. A invasão da Ucrânia por parte da Rússia em fevereiro aumentou o interesse da população, mas o Governo taiwanês optou por investir em melhorar o seu exército regular e de reserva, já que desde que abandonou a política de conscrição obrigatória, viu o número dos seus militares descer até menos de 90 mil membros.
Depois deste anúncio, a United Microelectronics Corp distanciou-se publicamente do seu fundador, que se retirou da empresa há mais de 10 anos.
O anúncio foi feito depois das forças armadas terem disparado tiros de advertência contra aeronaves não tripuladas (‘drones’) chinesas que sobrevoavam a zona das ilhas Kinmen.
O comunicado referiu igualmente que os aparelhos eram de “uso civil”, mas não deu mais detalhes.
A mesma fonte disse que as aeronaves regressaram à cidade chinesa vizinha de Xiamen depois dos tiros de advertência terem sido disparados. Taiwan tinha disparado em outras ocasiões anteriores sinalizadores como advertência.
O incidente ocorre num período de crescentes tensões entre Taipé e Pequim.
No início deste mês, após a deslocação da presidente da Câmara dos Representantes norte-americana, Nancy Pelosi, a Taiwan - a visita de mais alto nível realizada pelos Estados Unidos à ilha em 25 anos – Pequim lançou exercícios militares numa escala sem precedentes, que incluíram o lançamento de mísseis e o uso de fogo real.
Durante quase uma semana, o Exército de Libertação Popular fez um bloqueio marítimo e aéreo de facto ao território.
China e Taiwan vivem como dois territórios autónomos desde 1949, altura em que o antigo governo nacionalista chinês se refugiou na ilha, após a derrota na guerra civil frente aos comunistas.
Pequim considera Taiwan parte do seu território e ameaça a reunificação através da força, caso a ilha declare formalmente a independência.
Taiwan mantém o controlo sobre uma série de ilhas nos arquipélagos Kinmen e Matsu, no Estreito de Taiwan, uma herança do esforço dos nacionalistas de Chiang Kai-shek para manter uma posição próxima do continente, depois da guerra civil.
O Ministério da Defesa de Taiwan disse que as ações da China não intimidam os 23 milhões de habitantes da ilha, afirmando que apenas fortalecem o apoio às forças armadas e ao estatuto do território como uma entidade política independente.
As autoridades disseram que os sistemas de defesa contra ‘drones’ estão a ser reforçados, como parte de um aumento de 12,9% no orçamento anual da Defesa para o próximo ano.
Taipé está a planear um aumento no valor equivalente a 1,6 mil milhões de euros, para um total de quase 14 mil milhões de euros.
Os Estados Unidos da América (EUA) também estão a preparar um pacote de defesa avaliado em 1,1 mil milhões de dólares (quase o mesmo valor em euros, ao câmbio atual) para Taiwan, que inclui mísseis anti-navio e ar-ar, visando repelir uma possível tentativa de invasão chinesa.
Após os exercícios chineses, os EUA enviaram dois navios de guerra para o Estreito de Taiwan, onde a China reclama soberania.
Políticos oriundos dos EUA, Japão e países europeus continuam a visitar Taipé para prestar apoio diplomático e económico.
O governador do Estado norte-americano de Arizona, Doug Ducey, está atualmente em visita a Taiwan para discutir a produção de semicondutores, ‘chips’ essenciais que são usados em produtos eletrónicos e se tornaram parte da competição tecnológica entre os EUA e a China.
Ducey está a tentar atrair fornecedores para a nova fábrica de 12 mil milhões de dólares (cerca 11,9 mil milhões de euros, ao câmbio atual) que a Taiwan Semiconductor Manufacturing Corp. (TSMC) está a construir no seu Estado.
Na semana passada, o governador do Estado do Indiana visitou Taiwan numa missão semelhante.
Taiwan produz mais de metade da oferta global de ‘chips’ semicondutores de ponta.
O disparo de mísseis da China durante os exercícios militares interrompeu o transporte marítimo e aéreo, expondo a possibilidade das exportações de ‘chips’ sofrerem limitações ou de serem suspensas.
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