Foi difícil para as centenas de pessoas que acorreram ao maior auditório da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO, na sigla inglesa) manterem uma cara sisuda ou não darem um passo de dança nas celebrações do dia da língua portuguesa e da cultura na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
Fugindo a celebrações mais solenes, as representações dos países da CPLP optaram por um evento que integrou humor, com diversas expressões culturais vindas de todas as origens lusófonas, uma aparente "contradição" que pareceu resultar.
"[A minha presença] assinala a contradição que há entre a solenidade e a comédia. A comédia normalmente não é para este tipo de salão, mas pode ser que este contraste tenha graça", disse o humorista português Ricardo Araújo Pereira, em declarações aos jornalistas, antes de subir ao palco.
O humorista partilhou durante cerca de 30 minutos os holofotes com o humorista franco-cabo-verdiano Fary Lopes, numa conversa informal sobre o humor e a língua portuguesa.
Ricardo Araújo Pereira explicou que há certas particularidades da língua portuguesa que a tornam divertida e única, como a diferença entre "quente" e "quentinho".
Para António Sampaio da Nóvoa, embaixador de Portugal na UNESCO, esta é uma oportunidade para mostrar as potencialidades da língua e reforçar a posição desta língua que, apesar de ser a quinta mais falada no mundo, não é língua oficial das Nações Unidas.
"[É um momento para] reforçar a língua portuguesa numa grande organização multilateral que é a UNESCO. (...) Se o português fosse língua oficial, talvez não fosse preciso chamar a atenção todo o tempo. Como não é língua oficial, precisamos manter o português na agenda do multilateralismo, fazer eventos e chamar a atenção dos nossos colegas embaixadores, fazendo todo o trabalho da valorização da língua", disse o antigo reitor da Universidade de Lisboa.
Mas também é preciso apostar na qualidade do ensino aos que já são falantes.
"O português já foi melhor e é isso que acontece com Cabo Verde e todos os outros países. Quando alargamos a base de ensino a todo o mundo, perde-se a qualidade, mas ganha-se em quantidade. O desafio do futuro é que se tenha mais quantidade e qualidade. A língua portuguesa é o nosso grande património", disse Hércules Cruz, embaixador de Cabo Verde em França e junto da UNESCO.
O património da língua portuguesa foi assinalado também através da música, com o grupo brasileiro Bateria Show, seguido por uma atuação do grupo moçambicano Kakana e um concerto do DJ Stereossauro, que teve como convidados o ‘rapper’ português Chullage e o cantor português Dino D’Santiago.
"É muito importante estar em palco e um grande orgulho. Sendo que este último disco é muito centrado e focado na língua portuguesa, não podia expectar que fosse convidado para isto. Não almejava que isso acontecesse", disse o português Tiago Norte, conhecido como Stereossauro.
A poesia também não foi esquecida, mostrando trabalhos feitos pelos alunos do ensino primário e secundário das secções de português de escolas francesas no âmbito do centenário de Sophia de Mello Breyner, assim como a literatura teve o seu espaço com um vídeo de Chico Buarque, distinguido na terça-feira com o Prémio Camões.
Um evento que marcou a UNESCO, como assinalou Francisco Ribeiro Telles, secretário executivo da CPLP.
"[Assinalar o dia da língua portuguesa] aqui na UNESCO tem um significado especial, tendo em conta a própria organização que é a amplitude que esta manifestação está a ter e o trabalho que se fez aqui é significativo", reconheceu o diplomata português.
A secretária de Estado portuguesa dos Assuntos Europeus, Ana Paula Zacarias, também presente, acrescentou: "Ao sermos portugueses, somos europeus, mas somos também gente do mundo. E somos gente de África, da América Latina e da Ásia e isso traz para dentro da União Europeia um valor acrescido. Portugal não é um país pequeno na União Europeia, pode estar na periferia, mas traz com ele uma tradição e uma cultura, assim como um peso político, que está acima do que seria imediato".
Integram a CPLP Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.
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