Bolsonaro está com 67 anos, Michelle com 40. Lula está com 76 anos, Rosângela com 55. Tanto Michelle como Rosângela são terceira esposa dos dois mais adversários candidatos à presidência do Brasil. Tudo separa os dois casais em combate pela presidência de um país onde mais de metade da população tem menos de 28 anos e é negra ou mestiça.
As sondagens mostram que a sedução do voto feminino é uma questão determinante nesta campanha: Lula (perto dos 50% da intenção de voto de mulheres) quase dobra a previsão para Bolsonaro (à volta de 26%)
Michele, emocional, está ativíssima na muito calculada primeira linha da campanha de Bolsonaro: cabem-lhe as missões de recuperar o voto feminino e de mobilizar os evangélicos, a quem descreve Lula como um demónio. Também lhe cabe o papel de cara amável do presidente candidato que é célebre por frases misóginas e pela agressividade com que se refere às questões de género.
Rosângela, cerebral, evita protagonismo. É conselheira pessoal de Lula, designadamente para a comunicação pelas redes sociais e no contacto com os meios artísticos; aparece ao lado do marido, mas discreta, deixa todo palco para ele.
Quem está em volta de Rosângela trata-a carinhosamente por Janja. Ela e Lula casaram-se em maio último, após cinco anos de namoro que começou quando ele estava preso por ordem do então juiz Sergio Moro. Janja e Lula conheciam-se da militância no PT, na campanha para a primeira eleição presidencial, em 2002. Ela era uma das dirigentes do ativismo feminista no partido. Formada em sociologia na universidade de Curitiba, Rosângela trabalhou 20 anos na empresa pública que gere uma das maiores barragens no mundo, a de Itaipu.
Michelle conheceu o então capitão na reserva Jair Bolsonaro quando este, em 2007, era deputado no parlamento de Brasília e ela secretária num dos gabinetes parlamentares, depois de ter trabalhado como produtora de eventos e como modelo.
Michelle conquistou simpatias ao aparecer como intérprete de língua gestual do candidato que em 2018 veio a ser eleito presidente. É um modo de comunicação que ela aprendeu com um tio surdo.
É atribuído a Michelle, evangélica fervorosa, papel decisivo na aproximação do marido – Jair Bolsonaro é católico – à religião que cultiva. Antes ainda da primeira candidatura presidencial, Michelle começou a levá-lo aos cultos na Igreja Batista. A fé veio a ser uma oportunidade para Bolsonaro ampliar a agenda conservadora que defende, com absoluta valorização da família e oposição total ao aborto e à união homossexual. Bolsonaro passou a ter entre os evangélicos os seus mais determinantes aliados. Os evangélicos constituem a vertente religiosa com maior crescimento e influência no Brasil, designadamente nos centros de poder político.
A visão do mundo, a partir dos altares que frequentam, como um confronto entre o bem e o mal é um argumento para Michelle, ao colocar Lula como Lucífer, reclamar a adesão dos evangélicos ao combate contra a representação do diabo. Michelle chegou a clamar num dos comícios da atual campanha: “Quem hoje governa o Brasil, mais do que o meu marido, é Jesus!”.
Lula, sempre fogoso nos discursos políticos, já se viu obrigado a, com Rosângela ao lado, clamar que é injúria apresentá-lo como demónio e inimigo de Deus. Ouviu-se nessa ocasião uma rara declaração de Rosângela em campanha: “Importante é que, em vez de polémicas religiosas sem sentido, se discuta como sair da crise económica e da fome e de como devolver a esperança a um país onde foi instalado tanto ódio”.
Há uma outra realidade no Brasil: há duas outras mulheres, Simone Tebet e Soraya Thronicke, são elas mesmas candidatas presidenciais, têm mostrado vigor na argumentação mas as sondagens dão-lhes percentagens de votos que não passam dos 5%.
As sondagens mostram Lula sempre a crescer nestas últimas semanas. Os 50% na primeira volta, 54% se houver segunda, atribuídos pelos últimos números da Datafolha, a três dias da votação apontam de modo muito forte Rosângela para próxima primeira dama. Talvez ela goste mais de aparecer como a socióloga feminista que é mulher do presidente Lula. Quando faltavam três semanas para a eleição, num comício ao anoitecer em Nova Iguaçu, Rosângela soltou-se, chegou-se à frente e deu o tom: “Eu queria pedir para vocês acenderem as luzes dos celulares porque eu queria ver se eu via alguma princesa por aí ou por aqui. Não tem! Sabe por quê? Porque aqui só tem mulher de luta! E são essas mulheres que vão ganhar essa eleição no 1º turno para Luiz Inácio Lula da Silva!”.
Há tradição de pesquisas eleitorais (sondagens) certeiras no Brasil. Se a tendência ficar confirmada, ao lado do presidente vai ficar uma mulher de luta, não uma princesa.
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