Durante a reunião de hoje da Câmara do Porto, em que foi aprovada uma moção de recomendação ao Governo de implementação de um programa nacional de combate ao fenómeno de sem-abrigo, o autarca Rui Moreira respondeu: "eu gosto do Tio Patinhas, mas eu prefiro ser conhecido como Tio Patinhas do que como Zé Carioca”.
Acusando Odete Patrício de centralismo, e acrescentando que o município tem "vindo a substituir o Estado num conjunto de competências", Rui Moreira criticou ainda que o Governo apoie eventos como a Web Summit, mas "não aparece dinheiro para os sem abrigo".
Segundo a vereadora socialista, "foi anunciada em ‘mupis’ pela cidade a boa saúde financeira e a boa gestão financeira da câmara".
"Francamente, quando olho para tudo isto, para os números que a câmara evidencia e até publicita, eu recordo-me sempre do Tio Patinhas [personagem de banda desenhada], aquela figura dos livros infantis. Ele queria era acumular no seu cofre cada vez mais moedinhas para se sentar em cima e se sentir cada vez mais feliz e realizado", critico.
Odete Patrício destacou que a autarquia tem 223 milhões de euros, um valor que podia ser disponibilizado para ajudar a resolver o problema dos sem-abrigo.
"Tenho uma visão holística daquilo que são as verbas públicas. As verbas públicas são verbas de todos nós e quando há 'deficits' a nível do Orçamento do Estado [OE], quando o Estado não consegue ter meios suficientes para acudir a todas as necessidades do país, e quando há um município que tem verbas mais do que suficientes, (...) não pode disponibilizar um ou dois milhões para resolver um problema grave?", disse defendendo que não se pode estar "sistematicamente a pedir ao governo central para financiar tudo e mais alguma coisa".
O executivo aprovou hoje por unanimidade uma moção onde recomenda ao Governo a operacionalização da estratégia e de um programa nacional, financiado pelo OE, de combate ao fenómeno da existência de cidadãos sem-abrigo.
Na proposta do movimento do presidente da autarquia, defende-se ainda que seja recomendado à Área Metropolitana do Porto que realize o levantamento da situação vivida nos municípios que a compõe.
Durante o debate, a vereadora da CDU, Ilda Figueiredo, lamentou que as políticas de combate a este fenómeno não sejam "suficientemente solidárias", defendendo que esta é uma das áreas em que a regionalização tem um papel "importante".
Por seu turno, o vereador do PSD, Álvaro Almeida, defendeu que é preciso "passar das palavras aos atos", salientando que "é claro" que em termos de estratégia nacional, algo não está bem".
"Sinal de que não está bem é a atividade intensa do Presidente da República à volta deste assunto. Naturalmente, não dedicaria tanto tempo a este assunto, se não achasse que o plano não está a correr como deveria. É necessário passar das palavras aos atos", disse, lembrando que se encontra em fase de preparação o próximo OE.
A Câmara do Porto tem sinalizados 560 sem-abrigo, 140 a viver na rua e 420 em alojamentos temporários, sendo que a maioria são homens, entre os 45 e 64 anos, e estão nestas situações há mais de um ano.
O "Relatório de Análise de Dados - Inquérito de Caracterização das Pessoas em Situação de Sem-abrigo do Município do Porto", divulgado na quinta-feira pela câmara, faz a distinção entre as pessoas em situação de 'sem teto' (140) e 'sem casa' (420), traçando um perfil do sem-abrigo no concelho.
Este perfil, extrapolado a partir dos dados reunidos, retratam um homem entre os 45 e os 64 anos, solteiro ou divorciado, português e com uma retaguarda familiar inexistente. Terá o 2.º ou 3.º ciclo, baixas qualificações profissionais, competências pessoais e sociais deficitárias.
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