‘Sissi’ trabalha na capital, mas vive em Trindade, a cerca de 10 quilómetros. “Está sempre a faltar a luz”, queixa-se, relatando que já desistiu de comprar alimentos para pôr no frigorífico.
“Ainda ontem cheguei a casa e tinha o congelador todo derretido”, lamenta.
Na capital, há noites em que o apagão é geral e, subitamente, a cidade toda fica às escuras. Aos poucos, começam a acender-se luzes, aqui e ali, nas casas onde há geradores.
Ismael Neto, proprietário de um hotel no centro da capital, reclama: “Estão a enganar o pessoal. Não temos energia e o consumo é o mesmo?”.
Para manter o hotel a funcionar, tem dois geradores, que arrancam sempre que há quebras no abastecimento de energia elétrica, mas diz que o gasto de combustível é muito elevado.
Manuela, residente na capital, relata que recentemente esteve três dias sem luz, em casa. Para contornar a falta de eletricidade, numa altura em que por volta das 19:00 já é noite cerrada, liga o gerador enquanto a família janta e depois “para ver um bocadinho a televisão”, mas depois “tem de se desligar, porque fica caríssimo”.
“Ainda esta noite estive às escuras, usamos a luz do telemóvel”, comentou, apontando que a crise de abastecimento de energia elétrica tem provocado o aumento dos incêndios, porque “as crianças andam pela casa com velas ou as velas ficam acesas e acabam por queimar cortinados ou a mesa”.
Na roça Agostinho Neto, a maior do país, no distrito de Lobata, o problema também se verifica.
“Falta a energia porque cortaram os cabos”, relata Lucas, um morador.
Em Neves (distrito de Lembá), mais distante da capital, também são frequentes os cortes de energia.
“Têm de trocar os cabos velhos por uns novos. A energia vem com muita força e queima os elétrodos”, descreveu uma comerciante, que confessou: “Fiquei agora dois dias sem luz e fiquei maluca”.
A proprietária de um restaurante na capital também se queixa do prejuízo causado pelas quebras constantes de energia: “Temos de deitar comida fora. Às vezes chegam clientes e falta a luz, nós tentamos sempre preparar qualquer coisa, mesmo que as pessoas tenham de comer à luz das velas, mas o cozinheiro não gosta, porque não é muito seguro”, afirmou.
Elson, 30 anos, trabalha como guia turístico. “É uma lástima. Essa falta de energia é o problema mais grave que está a acontecer no país neste momento”, contou à Lusa.
A falta de energia, luz e estradas foi o motivo invocado pela população da roça Rosema, no distrito de Lembá, para impedir o acesso às urnas nas eleições legislativas, autárquicas e regional do Príncipe, no passado domingo.
No último dia de campanha, o partido no poder (Ação Democrática Independente, de Patrice Trovoada), promoveu um comício-festival durante horas, com vários artistas, em São Tomé. “Porque é que não faltou a luz ali?”, perguntou ‘Sissi’.
O problema, que alguns dizem durar há seis meses, mas que se terá agudizado no verão, não deverá ter, no entanto, solução em breve.
Em setembro passado, o Governo atribuiu a crise a “cortes programados devido aos equipamentos que estão em manutenção”, prometendo uma solução “dentro de mais algumas semanas”.
O executivo disse lamentar “sinceramente os eventuais danos de conforto que possam causar às pessoas”, e diz ter orientado a Empresa de Água e Eletricidade para “redimensionar” a distribuição de energia “para não serem os mesmos consumidores a beneficiarem” dessa racionalização.
Em declarações aos jornalistas, o ministro das Infraestruturas, Carlos Vila Nova, prometeu “trabalhar e paulatinamente solucionar” o problema da crise no fornecimento de energia elétrica às populações, adiantando que dentro de “mais algumas semanas” tem a situação “muito mais bem controlada”, a pensar na época festiva do Natal e do Ano Novo.
O governante sublinha que o país “está dependente” do fornecimento de acessórios importados e da disponibilidade das marcas e técnicos para se deslocarem a S. Tomé.
Carlos Vila Nova sublinhou que São Tomé e Príncipe precisam de pelo menos 25 megawatts de energia para abastecer as duas ilhas. Uma fonte da Empresa de Água e Eletricidade (Emae) disse à Lusa que “atualmente o país não produz mais de nove quilowatts”.
O país tem um parque geral de produção de energia composto duas centrais de Santo Amaro, construída pelos Taiwaneses, uma central elétrica da capital, que data do período colonial, onde estão instalados os equipamentos mais robustos e com maior dificuldade de funcionamento.
Tem ainda a central de Bobo Forro que contempla grupos de geradores de uma empresa privada italiana. Existe uma única central hidroelétrica do rio Contador, no norte de São Tomé, que produz apenas dois quilowatts, além de outras de pequenas dimensões inoperantes há vários anos.
O governo tem procedido nos últimos meses a uma extensão de eletricidade, um pouco por todo o país, que foi bastante criticada pela oposição que acusa o executivo de “sobrecarregar a capacidade dos grupos geradores instalados e prejudicar os fornecedores habituais com fins eleitoralistas”.
Mas o governo defende que “essa extensão energética é uma necessidade”, defendendo que o investimento feito na Empresa de Água e Eletricidade ao longo dos últimos anos é na produção, no transporte de energia e na rede de distribuição.
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