Passavam poucos minutos das 11h quando Francisco Proença de Carvalho, advogado de Ricardo Salgado, entrou na sala de um hotel lisboeta para dar início à conferência de imprensa que serviu de reação às acusações ontem produzidas pelo Ministério Público no âmbito da Operação Marquês.
Depois de cumprimentar os jornalistas e o seu cliente, o advogado começou por elogiar o ex-banqueiro, dizendo que não podia deixar evidenciar a força, firmeza, coragem e dignidade "ao longo deste período bastante complicado da sua vida e da sua família".
Em seguida, Francisco Proença de Carvalho informou que iria ler um comunicado e que não haveria lugar a perguntas dos jornalistas. E explicou porquê, dando dois motivos. "O motivo, primeiro, é deontológico. Como alguns saberão, os advogados estão sujeitos a limitações nos seus estatutos para discussão pública dos casos que têm em mãos" e só o devem fazer sob autorização do seu cliente e "na justa medida da defesa da dignidade e dos interesses" do mesmo. "É isso que faremos", concluiu, antes de prosseguir para o segundo motivo.
"O segundo motivo tem a ver com o seguinte: apesar de termos sido incentivados para comentar publicamente este caso por comunicados oficiais da Procuradoria-Geral da República" e também "por pessoas que já tiveram e têm responsabilidades relevantes no Ministério Público e nos órgãos de comunicação social" que, de algum modo, glorificaram "esta acusação, nós entendemos que não podemos ter esta acusação" porque "os factos, as provas e o direito numa democracia só podem ser discutidos no local próprio e esse local próprio é só um: um tribunal".
Explicadas as razões para não haver lugar a perguntas no final da conferência de imprensa, Francisco Proença de Carvalho passou então a ler o comunicado.
Depois de confirmar que Ricardo Salgado foi notificado, "ainda que irregularmente, da acusação da denominada Operação Marquês", o advogado afirmou que o seu cliente tem mantido um "comportamento discreto e de absoluto respeito por todas as investigações em curso, colaborando para o esclarecimento da verdade e estando sempre ao dispor das autoridades para o que for necessário".
E prosseguiu, atacando o Ministério Público, dizendo que este respeito "tem-se mantido apesar das múltiplas violações dos seus direitos, violações permitidas por aqueles que, por lei, tinham o direito de garantir que os direitos dos arguidos num estado de direito democrático fossem respeitados".
"Acusações infundadas" e "bóia de salvação"
"O Dr. Ricardo Salgado não praticou qualquer crime e esta acusação é totalmente infundada quanto a si", continuou Proença de Carvalho, afirmando que "o processo não tem, nem pode ter, factos e provas de qualquer crime" e evidenciando que "tendo o inquérito durado mais de quatro anos, só muito recentemente é que o nome do Dr. Ricardo Salgado surgiu no processo a partir de notícias plantadas na imprensa numa tentativa de o envolver num caso a que é absolutamente alheio".
Em seguida, o advogado do ex-banqueiro diz que este foi "uma espécie de bóia de salvação para um processo que se estava a afogar nas suas múltiplas teses contraditórias", não deixando também de referir que o seu cliente foi também "uma salvação para outras pessoas".
Depois de referir que "este processo infringiu todas as regras de decência", Proença de Carvalho afirmou que se verificou, ao longo do mesmo, "uma sistemática violação do segredo de justiça, numa chocante promiscuidade com alguns órgãos de comunicação social, com o claro objetivo de condenar na praça pública o Dr. Ricardo Salgado" sem que este se pudesse defender.
Afirmando que há muito que a opinião pública foi "intoxicada com sistemáticas mensagens distorcidas para destruir a imagem do Dr. Ricardo Salgado", o advogado do ex-banqueiro referiu ainda que "este processo ficará na história da justiça portuguesa como um dos piores exemplos de violações de direitos e garantias que qualquer cidadão, pobre ou rico, deve ter num estado de direito democrático no século XXI" e justificando tal facto com a acusação "ter o conforto de saber que o juiz de instrução", referindo-se ao juiz Carlos Alexandre, "em regra limita-se a aderir e a aceitar tudo o que é requerido, ou até a ir mais longe que o próprio Ministério Público".
"O Dr. Ricardo Salgado não se deixará condicionar ou esmagar por qualquer ato abusivo praticado por quem deveria ser o primeiro a defender a legalidade e levará até às últimas consequências a sua defesa", continuou Proença de Carvalho. Pedindo que, depois das sucessivas prorrogações de prazo para ser produzida acusação, fosse também concedido à defesa o tempo suficiente para o exercício digno dos seus direitos, o advogado concluiu reafirmando que "o Dr. Ricardo Salgado virá a ser, mais tarde ou mais cedo, ilibado deste processo".
O Ministério Público acusou na quarta-feira 28 arguidos da ‘Operação Marquês’, incluindo Ricardo Salgado e o ex-primeiro-ministro José Sócrates, de quase 200 crimes, entre os quais se contam corrupção passiva de titular de cargo político, branqueamento de capitais, falsificação de documentos e fraude fiscal qualificada.
No caso de Ricardo Salgado, o Departamento Central de Investigação e Ação penal acusou o ex-banqueiro de 21 crimes económicos e financeiros: corrupção ativa de titular de cargo político, corrupção ativa, branqueamento de capitais, abuso de confiança, falsificação de documento e fraude fiscal qualificada.
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