A secular boa vizinhança com a província galega foi testada pela força das chamas que, impelidas por um forte vento vindo de sul, fez avançar para norte e destruir quase tudo por onde passou, desde Marufe, no concelho de Monção, até bem dentro da Galiza.
O comandante dos Bombeiros Voluntários de Monção, José Passos falou à agência Lusa do "maior incêndio dos últimos 20 anos" no concelho e que teve no terreno 250 operacionais entre bombeiros, INEM, Cruz Vermelha e GNR.
Iniciado ao princípio da noite de sábado, o incêndio dimensionou-se durante a noite e "manteve-se pelas serras, onde começou a ser combatido, em momentos e com abordagens diferentes", explicou José Passos, reconhecendo que "os meios disponíveis deveriam ter sido mais".
"Foram chegando conforme as possibilidades, mas naquele que foi o pior dia do ano, percebi o difícil que foi a mobilização de meios", situação que ditou o reunir de forças com a "população, para que se unisse com tratores e cisternas e houvesse uma interligação com os bombeiros".
Apesar da ferocidade das chamas, José Passos confirmou que apenas houve "feridos ligeiros", situação que não impediu Céu Pedreira, residente na freguesia de Bela, de considerar que o incêndio "foi horrível".
"Os bombeiros não tiveram meios para socorrer todos, foi a população com água, mangueiras, baldes, tudo que viesse à mão que evitou que a tragédia fosse maior", recordou de um combate que "só ao final da tarde acalmou" do lado português.
Questionado sobre se após o incêndio em Pedrógão Grande, em junho, os terrenos começaram a ser limpos, a moradora negou-o, explicando que a limpeza das matas não foi feita, "ou porque os proprietários emigraram, ou porque são idosos e já não limpam" enquanto os mais novos "não querem limpar".
"Ninguém limpa, ninguém!", assegurou.
No caminho das projeções que levaram o fogo para Espanha Luís Campos, de 85 anos, apanha pinhas entre o terreno negro, parecendo indiferente ao forte cheiro a terra queimada.
"O fogo veio de Marufe e correu tudo por aqui abaixo. Foi daqui para Espanha", relatou de um incidente em que "o mais importante foi ninguém ter morrido", encolhendo os ombros enquanto admite que "deve ter sido fogo posto".
A poucos dias de passar o testemunho enquanto presidente da câmara de Monção, Augusto Domingues disse à Lusa que "arderam mais de seis mil hectares", numa devastação que destruiu "entre 35 e 40 locais para guardar o gado e material agrícola", situando-se na freguesia de Marufe a única casa ardida de primeira habitação.
"O valor total dos prejuízos só na quarta-feira estará contabilizado", disse, lembrando que em 20 anos como autarca nunca viveu uma situação como esta, desdramatizando os "comentários depreciativos do lado espanhol", afirmando que foram feitos quando as pessoas "estavam psicologicamente sob pressão".
Nelson Barbeitos, proprietário da serração que ardeu no domingo em As Neves, município do lado espanhol, disse à Lusa que naquele dia "cerca das 14:00, havia muito vento e as faúlhas vieram do lado do rio para a serração, infiltrando-se na estrutura que de imediato começou a arder, bem como tudo o que havia ao redor, camiões, tratores e carregadores".
"Não tivemos sorte nenhuma. Não apareceu um único camião para despejar água, nem bombeiros, nem do 112 ou 115, ninguém. Às 15:00, a mais de 200 metros daqui, estavam 400 graus de temperatura", revelou.
A serração criada em 1969 emprega atualmente 24 funcionários, afirmando o empresário espanhol que "uma peritagem feita na segunda-feira estima em 2,5 milhões de euros o total dos prejuízos".
"O fogo, pelo que sabemos, percorreu mais 40 quilómetros a partir daqui", contou Nélson Barbeitos, em sintonia com quem na segunda-feira se manifestou nas ruas contra a política de prevenção dos incêndios na Galiza.
A Lusa tentou contactar o autarca de Salvaterra do Miño, município raiano junto de Monção, que não se mostrou disponível para falar.
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