Este estudo, coordenado pelo Centro Cardiovascular da Universidade de Lisboa e que envolveu investigadores da Nova Medical School, da Faculdade de Medicina do Porto e do Instituto Gulbenkian da Ciência, mostrou igualmente que as pessoas com níveis muito baixos de vitamina D apresentam uma resposta demasiada agressiva à covid-19, que leva a formas mais graves da doença.
“Muitos outros estudos internacionais vieram reforçar que, de facto, a população quando tem deficiência de vitamina D e apanha o coronavírus – como outros vírus respiratórios e outras infeções respiratórias — a capacidade de resposta [do sistema imunitário] é diferente e o risco de severidade é maior”, explicou à agência Lusa Conceição Calhau, da Nova Medical School.
O projeto VITACOV, cujos dados vão ser hoje divulgados, avaliou, entre agosto de 2020 e janeiro deste ano, 517 doentes admitidos nas urgências dos Hospitais de Santa Maria, em Lisboa, e São João, no Porto.
Os resultados podem ajudar a compreender outros dados científicos obtidos no ano passado noutras investigações que demonstraram que cerca de 60% da população portuguesa apresenta níveis de vitamina D muito baixos, quando comparado com cerca de 20% da população finlandesa, por exemplo, para a mesma época do ano.
“Já existia um histórico de caracterização genética da população portuguesa em que já havia a ideia de que a prevalência destes polimorfismos que afetam as vias da vitamina D é superior na população portuguesa, quando comparada com outros países da Europa, e nós confirmámos que isto estaria associado depois à severidade [da covid-19]”, explicou.
Estes novos dados, segundo os investigadores, provam que não é correto supor que os países com mais exposição solar, como Portugal, não apresentam problemas com a deficiência de vitamina D.
Defendem ainda, face a estes resultados, a importância da caracterização genética, da monotorização da vitamina D e a adoção de outras recomendações ao nível populacional.
“Não é verdade a ideia de que somos um país de sol, que basta apanhar sol e que não vale a pena suplementar”, insistiu Conceição Calhau, que é coordenadora da licenciatura em Ciências da Nutrição na NOVA Medical School – Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa.
A especialista explica ainda que aquilo a que se chama ‘doses diárias recomendadas’ para as vitaminas em geral já têm muitas décadas, vêm da altura das grandes guerras, em que se racionada alimentos, e que estes valores eram o mínimo para não ter doença.
“Estávamos em tempo de racionar os alimentos, em concreto a vitamina D, associada ao raquitismo nas crianças e as doenças ósseas do adulto”, afirmou, acrescentando: “Mas quando sabemos que a vitamina D está relacionada com a regulação da pressão arterial, por exemplo, com o sistema imunitário, com a divisão celular (….) percebemos que aquilo que é o macro nós não estamos a ver porque estamos a falar de alguma patologias com alguma cronicidade”.
Adiantou ainda que a vitamina D é ativada pelo organismo e transformada numa hormona, como o cortisol ou a insulina ou as hormonas da tiroide, e que “tem funções tão importantes que vão muito para além do metabolismo do osso”.
“Se doseamos a vitamina D e ela está baixa, pelo menos temos aqui um dado que nos leva a ter a atitude da prescrição de um suplemento de vitamina D”, considera a especialista, insistindo: “Em Portugal nós não temos uma incidência solar capaz [de outubro a maio]. Não temos a incidência da radiação para poder catalisar no fundo aquilo que temos na pele para se produzir a vitamina D”.
Por outro lado, recorda, “temos uma população que cada vez foge mais da gordura” e a vitamina D encontra-se nos alimentos “na fase lipídica”.
“Como principalmente nos laticínios as pessoas ou já não comem ou comem só light, também não temos na alimentação grandes fontes de vitamina D”, acrescenta.
Conceição Calhau considera que em Portugal ainda há muito preconceito relativamente a suplementar vitamina D e que a questão da covid-19 acabou por voltar a levantar a questão.
“Se calhar não devemos tanto trabalhar com recomendações populacionais, mas individualizar, o que significa que as pessoas deveriam não só dosear os seus níveis de vitamina D, como fazem com a glicose e o colesterol, mas também fazer uma avaliação do seu padrão genético para saber se de facto têm este erro genético”, conclui.
O projeto VITACOV, financiado Fundação para a Ciência e Tecnologia, foi coordenado pelo Centro Cardiovascular da Universidade de Lisboa, em parceria com a empresa HeartGenetics, uma ‘start-up’ que nasceu no Instituto Superior Técnico.
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