Em causa está a subespécie ‘baeticum’ da planta ‘Rhododendron ponticum’, que, apontada pelos profissionais David Malva, Manuel Malva e João Farminhão como “icónica na história da conservação da natureza em Portugal”, só está identificada em três zonas do globo: uma em Espanha, na serra do Aljibe, e duas em Portugal, no sudoeste alentejano e nas bacias dos rios Antuã e Vouga.

Será a proximidade desses dois rios do distrito de Aveiro e da Área Metropolitana do Porto a justificar a presença da planta de flor roxa em 26 pontos de Oliveira de Azeméis, dos quais cerca de 20 eram “até agora desconhecidos da ciência”.

Demonstrando como o rododendro ‘baeticum’ resistiu localmente à última glaciação do planeta, as 26 populações da planta foram mapeadas de forma “metódica, exaustiva e refinada”, o que João Farminhão, presidente da Sociedade Portuguesa de Botânica, considera “um contributo valioso para a avaliação do estatuto de conservação desta espécie”.

Se a nível nacional o levantamento permite ampliar o conhecimento sobre a subpopulação da bacia do Antuã e facilita a “futura atualização da Lista Vermelha da Flora Vascular de Portugal, que estima o risco de extinção das espécies vegetais”, a nível internacional o trabalho não é menos relevante. “O mapeamento refina a delimitação do refúgio glaciar da Beira Litoral, uma das 52 regiões mais importantes para a conservação da biodiversidade em toda a Bacia Mediterrânica”, explicou o biólogo.

A consciência quanto à relevância da planta detetada em Oliveira de Azeméis surgiu depois de David Malva ter mostrado ao tio imagens de um encontro familiar numa zona ribeirinha. “Tirei uma fotografia em que, por mero acaso, surgia uma flor de rododendro no plano de fundo”, contou o técnico da Câmara Municipal de Oliveira de Azeméis, que trabalha no Serviço de Atividades de Desporto na Natureza.

O que outros teriam ignorado captou a atenção do biólogo e gestor ambiental Manuel Malva, que alertou o sobrinho para a importância da subespécie ‘baeticum’.

O técnico municipal partilhou depois a informação com os seus colegas de serviço e, em conjunto, seguiram-se dois anos de “procura metódica no território”, o que culminou com o mapeamento de 26 núcleos do ‘Rhododendron ponticum subsp. Baeticum’.

Manuel Malva acompanhou esse trabalho e afirmou: “A dificuldade no acesso a algumas linhas de água, seja pela orografia acidentada ou pela vegetação densa, tornou o processo particularmente desafiante, o que ajuda a explicar o até então desconhecimento da existência de muitos destes núcleos”.

O biólogo realçou que “muitas destas populações de rododendro estão isoladas entre si, alcantiladas em desfiladeiros de linhas de água, geralmente em áreas de difícil acesso, onde as arborizações de eucalipto e as espécies invasoras não conseguiram ainda chegar de forma significativa”. É isso que faz das 26 populações agora identificadas “preciosos redutos da vegetação de outrora” e um património natural “que merece todos os esforços de conservação, por forma a garantir-se a sua salvaguarda para o futuro”.

Entre as ações que a equipa do Serviço de Atividades de Desporto na Natureza já está a desenvolver com vista a essa preservação inclui-se o controlo da acácia, árvore invasora de crescimento rápido que está em “expansão descontrolada” na zona, e também a sensibilização da população local para a pertinência deste rododendro em concreto e da biodiversidade em geral.

A própria Câmara Municipal “redefiniu os limites da Paisagem Protegida do Rio Antuã” de modo a integrar os novos núcleos da planta rara, prevendo-se agora a definição de trilhos que permitam dar a conhecer o rododendro ‘baeticum’, mas evitem visitação excessiva nas áreas mais sensíveis.

“Desconhecia-se a extensão real da ocorrência desta subespécie e ficámos verdadeiramente surpreendidos ao mapear manchas espontâneas de rododendro de uma ponta à outra do concelho”, admitiu David Malva, antecipando que a flor roxa proporcionará na primavera “um autêntico espetáculo natural em alguns ribeiros” do território.