Em sessão plenária, o secretário de Estado adjunto e da Justiça, Mário Morgado, lembrou que, após ter sido "possível normalizar" em junho o funcionamento dos tribunais, durante a primeira vaga da pandemia, exige-se "agora novas medidas" excecionais de suspensão dos prazos processuais, por forma a evitar a propagação de contágios, mas de forma manter a "funcionalidade" do sistema e a realização de atos e diligências nos tribunais mediante "critérios de razoabilidade".
Conforme sublinhou o governante, as medidas propostas salvaguardam a prática dos atos urgentes, em que estejam em causa os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos, privilegiando-se a tramitação dos processos por via eletrónica ou meios à distância, podendo alguns dos atos ser feitos presencialmente desde que autorizados superiormente mediante condições de segurança sanitária.
Partidos como o PAN, BE e PCP e CDS-PP manifestaram apoio alargado ao diploma do Governo, embora propondo algumas alterações "cirúrgicas" ou minimalistas à proposta, tendo o PSD, através da deputada Mónica Quintela, sido o partido que colocou maior objeções ao teor das medidas, nomeadamente à possibilidade de os julgamentos se poderem realizar por meios à distância, alegando que tais "telejulgamentos" comprometem a publicidade da audiência e os princípios processuais da imediação e da oralidade.
"Admitimos contudo diligências por videoconferência e reconhecemos que para a prática de certos atos não seja preciso a presença das partes, podendo os mesmos serem praticados à distância", disse ainda Mónica Quintela, justificando que as alterações avançadas pelo PSD pretendem alcançar um maior equilíbrio entre segurança sanitária e segurança jurídica.
À semelhança de Telmo Correia (CDS-PP), a deputada social-democrata criticou o Governo por demorar uma semana para apresentar a proposta sobre suspensão de prazos processuais.
Lembraram que a 21 de janeiro o primeiro-ministro anunciou que tal suspensão iria avançar no dia seguinte, equívoco que gerou confusão e constrangimentos nos tribunais, razão pela qual o diploma terá agora que acautelar com precisão a questão da retroatividade das medidas que vierem a ser hoje aprovadas no parlamento sobre a matéria.
Pedro Filipe Soares (BE) considerou que a suspensão dos prazos processuais é uma "medida avisada" e de "bom senso" face à "gravidade da pandemia" e que a proposta do Governo "parece no geral correta", desejando o seu partido introduzir apenas alguns aperfeiçoamentos às medidas.
António Filipe (PCP) considerou também "inquestionável" a oportunidade das medidas apresentadas pelo Ministério da Justiça, mas alertou para a necessidade de solucionar com rigor e precisão algumas dúvidas que podem surgir quanto à retroatividade da suspensão dos prazos, por forma a evitar que isso venha a provocar "litigiosidade futura" nos tribunais sobre a sua aplicação.
A sessão parlamentar, que decorreu assim sem dissonâncias relevantes das diferentes bancadas parlamentares, terminou com uma intervenção de Mário Morgado que realçou que, apesar das medidas e limitações agora impostas, existe a intenção de deixar os tribunais a funcionar "ao máximo nível possível", para defesa dos direitos e garantias dos cidadãos.
Mostrou-se ainda recetivo aos "contributos" legislativos apresentados pelos deputados e prometeu que o Governo saberá "estar à altura das exigências" e dos desafios colocados pela pandemia, realçando os avultados investimentos já realizados quer na proteção sanitária individual dos operadores judiciários, quer nas medidas de limpeza e segurança sanitária dos tribunais, bem como na instalação de 646 salas de videoconferência.
O diploma em discussão no parlamento estabelece a suspensão de prazos para a prática de atos processuais e procedimentais não urgentes que corram nos tribunais, demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal.
O diploma prevê assim, entre outros aspetos, a tramitação nos tribunais superiores dos processos não urgentes, quando haja condições para assegurar a prática dos atos processuais através de meios de comunicação à distância adequados.
O diploma estipula que os processos, atos e diligências urgentes continuarão a ser tramitados, sem suspensão ou interrupção de prazos, atos ou diligências, prevendo-se contudo que quanto aos casos urgentes sejam cumpridas certas condições.
São definidos como casos urgentes os processos e procedimentos para defesa dos direitos, liberdades e garantias lesados ou ameaçados de lesão por quaisquer providências inconstitucionais ou ilegais, bem como aqueles que se revelem necessários a evitar dano irreparável ou de difícil reparação, designadamente os processos relativos a menores em perigo ou a processos tutelares educativos de natureza urgente e as diligências e julgamentos de arguidos presos.
Parlamento aprova diploma do Governo para simplificação processual na justiça tributária
Este diploma do executivo teve apenas as abstenções do CDS-PP e Iniciativa Liberal, tendo merecido votos favoráveis dos restantes grupos parlamentares.
Com esta proposta de lei, que partiu do Ministério das Finanças, pretende-se concentrar num único diploma diferentes alterações em matéria de justiça tributária, "assegurando-se a estabilidade da legislação fiscal na aceção da sua previsibilidade".
Ao nível da Lei Geral Tributária, o executivo diz ter procurado uma "densificação dos critérios de revisão das orientações genéricas pela administração tributária" e "a introdução da possibilidade de os contribuintes requererem a sua audição prévia aquando do pedido de informação vinculativa".
Em matéria de Código de Procedimento e de Processo Tributário, prevê-se na proposta de lei a suspensão da execução de dívidas até cinco mil euros no caso de pessoas singulares, e até dez mil euros no caso de pessoas coletivas, "até ao termo do prazo de apresentação de meio de defesa gracioso ou judicial".
"É ainda alterado o regime da penhora de dinheiro ou de valores depositados, tendo em vista um maior respeito pela proporcionalidade e adequação da penhora, bem como possibilitar a sua rápida cessação logo que obtidos os montantes em dívida", salienta-se na exposição de motivos deste diploma.
No Regime Geral das Infrações Tributárias, a proposta do Governo procede "à reformulação e simplificação do regime de dispensa, redução e atenuação das coimas".
Assim, prevê-se a dispensa de coima "nos casos de infrações simples em que ocorra a regularização da situação tributária no prazo de três dias", ou situações de redução de coima "em momento prévio à instauração de processo de contraordenação".
Nestas últimas situações, fica estabelecido "a redução do valor da coima para 12,5 % ou 50 % do montante mínimo legal consoante, respetivamente, se trate, por um lado, de pedido de pagamento apresentado até ao levantamento de auto de notícia, receção de participação ou denúncia ou início de procedimento de inspeção ou, por outro lado, se trate de pedido apresentado até ao termo do prazo de audição prévia em procedimento de inspeção tributária".
Em sede de inspeção tributária, esta proposta de lei do Governo cria "um novo momento procedimental para regularização voluntária por parte dos contribuintes".
"A regularização voluntária em sede de procedimento de inspeção fica, assim, devidamente regulada, definindo-se como momento próprio para o fazer, o final do procedimento de inspeção", assinala-se na exposição de motivos do diploma.
O ato de regularização, de acordo com o Governo, que pode ser total ou parcial, poderá ser desencadeado pelos contribuintes "no prazo concedido para audição prévia, através da identificação das correções relativamente às quais se está de acordo e em relação às quais se pretende a regularização".
Na sequência deste passo processual, segundo o Governo, é então depois "agendada uma reunião entre o contribuinte e a Autoridade Tributária e Aduaneira, a qual tem em vista a assinatura de um documento conjunto pela entidade inspecionada e o competente dirigente da administração tributária".
Em seguida, pode avançar-se para uma "redução da coima para estas situações de regularização voluntária assente", as quais, no entanto, "deixam de ser impugnáveis a partir daquele momento".
No âmbito do processo de apreciação deste diploma na especialidade, o PS reivindica ter introduzido um conjunto de alterações, designadamente em matéria de Lei Geral Tributária, com o "reconhecimento dos contabilistas como técnicos oficiais de contas, clarificando as suas competências e garantindo desta forma um regime mais justo em matéria de responsabilidade para os contabilistas certificados".
Neste capítulo, segundo a bancada socialista, "assegura-se ainda uma redução de 50% no custo das informações vinculativas apresentadas junto da Autoridade Tributária por micro e pequenas empresas, assim como pessoas singulares".
"Cumulativamente, clarifica-se que os requisitos previstos na lei para que a administração tributária deva rever as orientações genéricas não são cumulativos, assegurando-se deste modo a clarificação das situações e condições em que a Autoridade Tributária está vinculada a seguir as decisões jurisdicionais", sustenta-se numa nota divulgada pela bancada socialista.
Por outro lado, salienta também o PS, "atendendo à situação excecional verificada no mês de agosto, por causa do período de redução de atividade, ficou acautelada a suspensão de contagem de prazos em agosto, respondendo assim a uma aspiração dos contabilistas certificados sem colocar em causa o cumprimento e calendário fiscal".
O PS diz ainda ter introduzido "alterações ao Regime Geral das Infrações Tributárias, clarificando-se e reorganizando-se os institutos da dispensa e de redução de coimas, em linha com as decisões dos tribunais superiores, e alargando-se a possibilidade de dispensa de coima a pessoas coletivas que não tenham sido condenadas em processo de contraordenação ou crime por infração tributária, instituindo-se o regime da admoestação".
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