Oito associações foram ouvidas hoje na subcomissão para a Igualdade e Não Discriminação sobre a proposta de lei do Governo que "Estabelece o direito à autodeterminação da identidade de género e a expressão de género e o direito à proteção das características sexuais de cada pessoa" e dois projetos de lei do BE e do PAN que também consagram o direito à autodeterminação de género.
A proposta de lei elimina a necessidade de um relatório médico para a mudança de sexo no registo civil, sendo ainda alargada a possibilidade do pedido a pessoas a partir dos 16 anos.
O Bloco de Esquerda vai mais longe e propõe que os menores, a partir dos 16 anos, possam processar os seus representantes legais caso estes não lhes deem permissão para mudar de sexo.
Para a presidente da Associação de Mães e Pais pela Liberdade de Orientação Sexual (AMPLOS), Margarida Faria, “não deve haver limite de idade para alteração dos documentos civis” das pessoas transexuais.
“Temos conhecimento de situações de crianças que aos quatro anos “estão perfeitamente definidas” e que precisam de “muita coragem” para se afirmar perante a família, disse Margarida Faria.
Estas crianças “não vão poder esperar até aos 16 anos para terem documentos que validem o que são”, defendeu.
Esta posição é partilhada pelo presidente da Rede ex aequo - Associação de jovens lésbicas, gays, bissexuais, trans, intersexo, Vítor Silva: “Estas crianças são forçadas a viver anos com um nome que já não é o seu”.
Também Ana Teles, do Centro GIS - Centro de Respostas às Populações LGBT, considera que os 16 anos podem ser “uma idade tardia”.
Todas as associações saudaram os projetos e a proposta de lei que foi apresentada em plenário pela então secretária de Estado da Igualdade Catarina Marcelino, que esteve hoje presente na audição.
Para o presidente da Rede ex aequo, a nova legislação é uma “oportunidade histórica” para mudar o modo como são tratadas estas pessoas e “mudar o futuro” para que estes jovens tenham “oportunidades melhores”.
Para Margarida Faria, os avanços “mais importantes” são a autodeterminação das pessoas trans, nomeadamente “o reconhecimento de ser uma questão íntima”, que “não pode ser alvo de qualquer avaliação médica”.
“Separar as questões legais dos aspetos médicos parece-me do mais elementar reconhecimento de um direito universal, que é o direito à identidade”, defendeu.
Para Daniela Bento, da associação ILGA Portugal, é fundamental o reconhecimento da autodeterminação dos transexuais.
“Durante muitos anos esta questão esteve no silêncio, esteve relegada aos serviços médicos”, mas “as pessoas sabem quem são e isso é o mais importante”.
Por isso, “não faz qualquer sentido termos um atestado clínico para dizer o que somos”, defendeu, lamentando que o Estado continue “a ser o último a reconhecer as pessoas transexuais perante a lei”.
Para Alice Cunha, da associação Panteras Rosa, a legislação tem algumas limitações.
“Infelizmente esta lei cinge-se quase exclusivamente à questão da alteração legal do nome, não garantido o acesso e o direito à saúde das pessoas trans”, lamentou.
Isto porque “a forma como se faz o processo de transição do corpo” continuará “sob a égide de entidades médicas”, disse Alice Cunha.
Para Júlia Mendes, da API - Associação Ação Pela Identidade, “é necessário e urgente” que Portugal reconheça também os direitos das pessoas trans imigrantes, para que casos como o de Gisberta não voltem a acontecer.
Para Sancha Margauto, da TransMissão - Associação Trans e Não-Binária, a nova legislação é um “enorme passo”: “Uma lei assim vai mudar a nossa vida”.
Depois de ouvir as associações, a deputada do PS Isabel Moreira disse que a situação da idade para mudar de nome é “uma questão a discutir”, lembrando que há muitas pessoas preparadas antes dos 16 anos para tomar essa decisão, mas outras não.
Para Sandra Cunha, do BE, a legislação irá ajudar a minimizar o sofrimento dos transexuais causado pelo facto de não serem compreendidas pelos seus pares, professores, pela sociedade,
“O sofrimento que daí decorre, não vai terminar, mas será minimizado”, disse Sandra Cunha.
Para Rita Rato, do PCP, o Estado tem de acompanhar estas pessoas e os seus familiares, através dos serviços públicos, fazer campanhas de sensibilização, e dando formação de profissionais de saúde.
Já a deputada do CDS-PP Vânia Dias da Silva levantou dúvidas sobre a questão da idade, por não se saber concretamente quando está formada a personalidade.
“Nós não somos alheios ao sofrimento”, mas “há uma questão jurídica que é preciso acautelar”, vincou, defendendo a realização de campanha de sensibilização e, sobretudo nas escolas, haver um programa especifico dedicado a esta matéria.
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