Ex-CDS, chegou a ser secretário-geral da Juventude Centrista e até adjunto do ministro dos Negócios Estrangeiros, Diogo Freitas do Amaral, em 1980, no governo da primeira AD – Aliança Democrática.
Ao longo da sua carreira diplomática, foi embaixador de Portugal na Bósnia e na Sérvia, mas também em Israel. E, hoje, recorda o ano 2000 e um tempo em que israelitas e palestinianos estiveram mais perto de um acordo. Que, diz, falhou porque os palestinianos recuam sempre.
No dia em que falou com o SAPO24, faltou a uma arruada em Beja, mas manteve a entrevista, concedida a partir do Senhora do Cais, em Lisboa. António Tânger Corrêa é 1.º vice-presidente do Chega e candidato principal do partido ao Parlamento Europeu, o mais velho dos cabeças-de- lista.
Representou o país nos Jogos Olímpicos de Barcelona, em 1992, na modalidade de Vela, e é campeão nacional em título. No campeonato das europeias, recusa-se a fazer previsões, mas sabe-se que o Chega ambiciona cinco lugares em Bruxelas.
Mudou do CDS para o Chega. O que têm os dois partidos em comum?
Sempre defendi que a atividade diplomática não é compatível com o exercício de cargos políticos. Estive no CDS há muitos anos, antes de começar a minha carreira, e só regressei à política já reformado, quando aceitei o convite de André Ventura para o Chega, que é parecido com o CDS de antigamente e também com o PPD (não com o PSD). Aliás, onde não me revejo é no CDS de hoje. Mas o Chega e o CDS verdadeiro são parecidos, ambos querem responder a desafios e são construtivos de uma nova ideia para o país. E acho isso absolutamente fundamental e interessantíssimo.
Muitos vêem a extrema-direita como uma ameaça para a União Europeia. É?
Não, de todo. O Chega é um partido europeísta de raiz, só que tem uma ideia de construção europeia diferente da dos federalistas. Queremos uma União Europeia como espaço de paz, desenvolvimento, quer humano, quer social, e económico também, de nações soberanas, não um espaço federal de imposição de normas. São coisas diferentes.
Como sabe, desde a criação da ideia europeia, estas duas vertentes estão em cima da mesa, e a federalista foi de alguma forma derrotada antes do Tratado de Lisboa, na medida em que foi chumbada a Constituição Europeia. Como substituto ou parente pobre nasceu o Tratado de Lisboa. Que invade a União Europeia de ideias federalistas e que não funcionam.
A prova que não funciona é que o Reino Unido saiu e alguns países, que não Portugal, sublinho, estão com uma linha muito esticada relativamente à União Europeia.
O Reino Unido já está desejoso de voltar, mas a verdade é que sempre teve um pé dentro e um pé fora em muitos aspetos.
Sim, nomeadamente nas cooperações reforçadas, ou seja, Schengen e Moeda Única. No resto, em termos globais, o Reino Unido foi um país construtor da União Europeia. E, devo dizer, ao contrário do que as pessoas pensam, foi um país que nos ajudou muito quando foi da adesão de Portugal.
O receio que os outros partidos e grupos parlamentares têm do Chega e da extrema-direita vem de onde?
O Chega, para já, não é extrema-direita. De extrema-direita consideram-se os neonazis e noefascistas que, no fundo, são primos direitos da extrema-esquerda. Quer o fascismo, quer o nazismo têm origens marxistas, só que de raiz nacionalista, enquanto os comunistas, trotskistas e parentes maoístas o são até mesmo na raiz internacionalista. O Chega não tem nada a ver com isso, é um partido com cinco anos que agrupou PPDs (não PSDs) e CDSs.
E também comunistas, vimos o que se passou no Alentejo, em Beja, por exemplo.
Têm medo do Chega porque têm medo de perder. Não se esqueça que o sistema vive do centrão e seus aliados. Claramente, para usar uma expressão popular, têm medo de perder os tachos.
Porquê a escolha do grupo Identidade e Democracia e não os Conservadores e Reformistas da Europa?
Acho que foi a família europeia possível na criação do Chega. Temos de situar isto no tempo: há cinco anos o Chega era um ‘Zé Ninguém’, quer em Portugal, quer na Europa. Mas precisava de uma família europeia para se desenvolver e ter contactos internacionais - estou a dizer-lhe isto, embora tenha sido antes da minha entrada no partido.
O Identidade e Democracia foi o grupo que deu a mão ao Chega na altura e foi ajudando o Chega durante estes anos todos, isto é um facto, independentemente de se dizer que são mais ou menos radicais. Portanto, sair agora, em termos práticos, seria um bocadinho deselegante, na minha opinião, relativamente ao ID.
No entanto, é evidente que após estas eleições vamos ter todo um novo universo renovado dentro do Parlamento Europeu: o AfD saiu do ID, Marine Le Pen lançou um repto a Meloni para se juntarem num grupo - presumo que num novo grupo europeu. O Chega está um pouco a assistir de bancada a todas essas movimentações. Discutir isto antes das eleições é um bocadinho a discussão do sexo dos anjos.
Há regras para constituir um novo grupo político, é necessário um número mínimo de 23 deputados e ter representação de, pelo menos, um quarto dos Estados-membros. Mas voltemos ao que é o projeto europeu do Chega…
Representei a União Europeia como enviado especial, fui presidente de grupos europeus e membro de diversos grupos, negociei o Tratado de Paz com os Balcãs ocidentais, tenho uma grande ligação à União Europeia e acredito na União Europeia como espaço de prosperidade e desenvolvimento.
O Chega é um partido que assume perfeitamente essa posição, embora seja claramente anti-federalista. Mas, tirando os aspetos federalistas, o Chega é um partido pró-europeu, somos parte desta realidade que é a Europa. Não obstante termos uma vertente atlântica fortíssima - na vertente atlântica somos centrais, enquanto na vertente europeia somos periféricos. Mas mesmo assim o Chega assume esse vetor europeu a 100%.
Quais são para si os dossiers prioritários do mandato que aí vem?
Bem, temos vários dossiers em cima da mesa. Obviamente que prioritários são aqueles que interessam a Portugal. Que é agricultura e pescas, que é corrupção, que é imigração e que é habitação. Estes são os dossiers a que nós vamos dar total atenção enquanto deputados portugueses. Depois, temos outros temas em cima da mesa, como a Agenda 2030 ou o Pacto para as Migrações e Asilo, onde não podemos mexer sozinhos, mas vamos ter de arranjar aliados para negociarmos e avançarmos para criar soluções diferenciadas daquelas que existem neste momento.
Falou há pouco na Europa como espaço de prosperidade. De acordo com o Eurobarómetro, o que mais preocupa os europeus é a economia e o emprego. Como se põe a EU a crescer?
É fundamental tornar a Europa num centro económico de desenvolvimento. Ou seja, em termos práticos, a Europa tem de ser diferenciada quer do leste, quer dos Estados Unidos - quando digo leste, quero dizer países asiáticos: Índia, China, Indonésia, Filipinas e por aí fora. Que neste momento estão muito mais prósperos do que nós e com avanços económicos muitos superiores aos nossos.
Porque, e é preciso recuar no tempo, nós passámos pela febre da deslocalização. As empresas europeias, na febre de terem taxas de produtividade mais altas, foram para países onde conseguiam arranjar mão-de-obra barata.
Custos de produção mais baixos…
Só que houve países como a China, como a Indonésia, como as Filipinas, como o Vietname que, ao terem essas indústrias no seu país, obviamente roubaram tecnologia. E hoje toda a tecnologia desses países provém da transferência dessas empresas para esses países, não sejamos naïfs. A Europa cometeu um erro fundamental.
Por outro lado - e não é incipiente, porque não podemos isolar a economia como fator, temos de lhe juntar a realidade social, a realidade geoestratégica -, neste momento estamos sob a ameaça da imigração descontrolada, que vem trazer várias consequências. Uma delas é claramente a imigração de países que não têm as mesmas matrizes culturais que nós, o que leva à criação de guetos, no mínimo, e à obrigatoriedade de nós mudarmos os nossos hábitos, como já acontece em vários países europeus.
Em termos práticos, isto quer dizer que ao desestabilizar a sociedade, está a desestabilizar a economia. Que está a ser criada em princípios de subsidiodependência, como são criadas as sociedades ocidentais - parece que agora há alguma reação, nomeadamente de Itália, onde não existe força de trabalho. Em Portugal, neste momento, se quiser trabalhadores para a área hoteleira e outras, não encontra, porque realmente sai mais caro trabalhar do que receber o subsídio. Portanto, das duas uma, ou cortamos os subsídios ou ficaremos dependentes de uma imigração que, mais tarde ou mais cedo, vai ter consequências a nível da organização nacional.
Mas acabou de dizer que não há trabalhadores para a hotelaria, ou para a agricultura, ou para outras áreas. Como seria se não fossem os imigrantes?
Existe a imigração controlada e descontrolada. Em Itália, a força de trabalho aumentou em quase 30%. Nós não somos contra a imigração, pelo contrário, mas somos a favor da imigração controlada, de uma imigração que responda às necessidades de um país. Somos contra uma imigração completamente desregulada, feita de forma desregrada e corrupta, é aí que se torna perigosa.
Porque é que diz corrupta?
Porque as pessoas que estão a entrar em Portugal estão a fazê-lo de uma maneira que não deviam. Estão a entrar através de regimes excepcionais, como o VVTL (Visto de Validade Territorial Limitada), como fez uma firma indiana, a quem o governo Costa decidiu dar o monopólio dos requerimentos e instrução dos vistos.
Qual é a empresa?
A empresa chama-se VFS.Global. É quem tem o monopólio. Enquanto estive no ativo, resisti sempre a ter essa empresa a trabalhar para nós e convenci vários colegas a não o fazerem, porque isso iria dar os resultados que temos neste momento. E, obviamente, não só está a assoberbar os nossos consulados e embaixadas com os vistos, o que não lhes permite tratar dos assuntos dos portugueses, porque não têm meios para isso, como está a assoberbar Portugal. E depois vêm 400 mil pessoas que não estão a ser rastreadas, que não existem, que estão a dormir na rua, grande parte delas, ou em habitações claramente insuficientes para as suas necessidades.
Portanto, as máfias, que eu já esperava que surgissem, cá estão a tratar de requerimentos e instrução de vistos. Nada de novo. Eu e os meus colegas éramos contra isto, simplesmente reformámo-nos e o governo António Costa aproveitou isso.
Mas, a ser assim, isso é um caso de polícia, não tem nada a ver com imigração. Que regras pretende criar?
É cumprir a lei. É cumprir os critérios de Schengen, os critérios de contrato de trabalho, quem vem para Portugal é quem tem contrato ou promessa de contrato de trabalho, quem tem garantia de alojamento digno, quem tem garantia de ter uma vida digna, não é virem seis meses à procura de trabalho, que depois não são seis meses, é um ano ou dois.
E mais, eventualmente passam ilegalmente para outros países, porque quando vêm com VVTL não podem passar para outros países e, portanto, é uma porta escancarada para gente que realmente não tem lugar. Nós não conseguimos aguentar este peso de pessoas a viver em Portugal sem condições.
Passamos para o tema do alargamento da União Europeia. É a favor ou contra?
A favor, claro que sim. A favor do alargamento, cumprindo com os critérios de Copenhaga e os outros critérios que têm sido negociados com os vários países. Agora, as pessoas falam do alargamento e não têm bem a noção do que isso significa. Nos anos 2000 negociei com os Balcãs a assinatura de vários instrumentos de adesão à União Europeia. Simplesmente, a situação continua neste momento exactamente como estava nessa altura.
Os critérios não são só económicos, são também de livre pensamento, de livre expressão, há uma data de capítulos. O estado das negociações com estes países, que são 15 ou 16, salvo erro, está muito longe de cumprir os critérios.
Neste momento são oito países, nove se incluirmos o Kosovo.
Mas aqueles que já deviam cá estar dentro, como os Balcãs ocidentais, ainda estão longe de o fazer. A adesão neste momento está focada na conversa à volta da Ucrânia, mas há muito a negociar e a decidir. Se forem cumpridos os critérios, o dia da adesão virá longe.
Também será necessário alterar tratados, reformar as instituições europeias para acomodar esses países. Que mudanças considera imprescindíveis?
Há dois tipos de reformas. Continuamos a defender que deve haver um comissário por país e não um regime de rotatividade, com um número de comissários fixo que depois vai rodando entre Estados-membros. Somos contra isso. Também vai ser preciso ajustar as regras da coesão, onde está Portugal. E os países da coesão não podem ser prejudicados pelo alargamento.
Somos defensores de uma reforma das instituições da União Europeia, nomeadamente da extinção de alguns serviços redundantes e redutores da soberania de cada Estado, como o Secretariado-Geral do Conselho, principalmente dos pequenos países. E somos a favor de dar mais força ao Parlamento Europeu, de impor e de legislar com mais propriedade, até porque os deputados são os únicos eleitos pelo povo, são os representantes do povo, devem ter competências equivalentes às dos parlamentos dos países.
Somos a favor de uma diminuição de poderes da Comissão Europeia, o principal órgão federal da União Europeia, com poder executivo, que impõe regras a mais. E somos a favor de uma muito maior vigilância e transparência da Comissão, que neste momento não existem. E somos também a favor do reforço das regras de funcionamento do Conselho, onde estão os representantes dos governos dos Estados-membros.
Que poderes tem a Comissão Europeia a mais?
Cerca de metade. Que é quase impor-nos aquilo que devemos vestir todas as manhãs. Neste momento, a Comissão Europeia pode impor normas orçamentais e dizer quase onde é que um país deve e não deve investir. Por exemplo, os apoios à agricultura ou as quotas de pesca: somos frontalmente contra o sistema atual, em que Portugal, com a sua zona económica exclusiva e uma plataforma continental imensa, é o principal prejudicado da União Europeia relativamente às pescas.
Portugal tem a terceira maior zona económica exclusiva da União Europeia. Em 2003 foi criada uma estrutura de missão para o processo de extensão da Plataforma Continental, mas aguarda-se uma decisão até hoje.
Esse é outro problema. O facto de não nos termos imposto até hoje é porque trocámos por migalhas quotas, trocámos por migalhas capacidades, senão não estávamos no estado em que estamos. E foram os nossos eurodeputados e os nossos governantes que fizeram isso, ou seja, alguns no passado preferiram ter um país cheio de betão e de estradas a desenvolver serviços primários. Nós destruímos a marinha mercante, destruímos a frota de pesca, destruímos as indústrias conserveiras, destruímos a construção e a reparação naval. Portugal também é altamente culpado disto, porque os nossos sectores primários são praticamente inexistentes. A agricultura tem falta de apoios, os agricultores não se conseguem modernizar, não conseguem comprar máquinas.
Quase 40 anos não foi tempo suficiente para redefinir uma estratégia, para reconverter o sector agrícola português?
É claro que é muito tempo, mas a culpa não é dos agricultores.
É de quem?
Repare, onde é que está executado o plano de transvases de água? Onde é que está executado o plano de aproveitamento das águas da bacia do Tejo? Onde é que está aproveitado o plano da ligação da bacia do Tejo ao Alqueva e às águas do Sul? Ninguém faz e isso seria um passo extremamente importante no desenvolvimento da agricultura portuguesa. Só que ninguém está interessado nisso, só estão interessados nas eleições, só estão interessados nas pequenas coisas.
Tudo isto são problemas em que nós não batemos o pé, em que nós não tivemos uma postura de defesa dos interesses nacionais e agora estamos a pagar a factura.
O que é preciso mudar em relação à PAC – Política Agrícola Comum?
Atenção, não somos contra a PAC. Mas bastava dar aos agricultores portugueses as mesmas facilidades que têm os franceses.
Os agricultores ainda no início do ano se manifestaram nas ruas, tal como os portugueses.
Estou a falar em termos relativos. Se for ver a agricultura portuguesa e a agricultura francesa, existe uma décalage brutal. Já com os espanhóis nem tanto, porque têm outro poder negocial e, principalmente, os espanhóis são muito duros quando toca a negociar os seus interesses. Mesmo o acordo bilateral que têm nas pescas com Portugal é uma vergonha.
Quer dizer, nós pomos navios de guerra a patrulhar navios russos e bielorussos, que, eventualmente, andam a ver os cabos submarinos, mas não mandamos os meios para deter os barcos-fábrica espanhóis e japoneses e chineses que andam nas nossas costas a pescar ilegalmente.
Bem sei que agora há seis patrulheiros a serem construídos em Viana do Castelo que vão ajudar, mas não aumentamos a frota de Orion, armas fundamentais no combate à pesca ilegal. E eventualmente mais um submarino, porque, ao contrário do que se pensa, tem uma influência decisiva em controlar as pescas, quando está um submarino na água a situação é diferente, isso sabemos porque ouvimos na rádio – como sabe sou homem do mar e quando se houve pela rádio que há submarino na água, quer o tráfico de droga, quer a pesca ilegal diminuem.
Há muito que a União europeia precisa de aumentar o seu orçamento – e neste mandato vai discutir o quadro financeiro plurianual. Com a guerra, mesmo que temporariamente, e com o alargamento ainda mais. Onde pode ir buscar receita?
É muito difícil responder a isso. Porque, efetivamente, são demasiadas despesas para a receita que existe. Agora, somos absolutamente contrários ao aumento de impostos e de taxas para os cidadãos europeus.
E aumentar a dívida? Porque já vamos ter de pagar o empréstimo contraído neste mandato em 2028.
O aumento da dívida, a prazo, é dramático. Bem, se for pelo caminho de Sócrates, em que a dívida não é para pagar, é uma coisa, agora, se for por aquilo que é o que deve ser, a dívida deve pagar-se, é mais complicado.
E em vez de termos aplicado o dinheiro do PRR em investimentos rentáveis, como nas pequenas e médias empresas, aquilo que é o nosso tecido empresarial privado, fomos investir no sector público, que obviamente é dinheiro perdido. Não vai produzir rentabilidade, não vai aumentar coisa nenhuma a não ser a nossa própria dívida.
Se aumentar a eficiência do setor já é bom.
De todo. Mas vai aumentar o quê? Temos visto aquilo que temos visto, estamos a reduzir capacidades. Se for ver a capacidade externa portuguesa foi reduzida em quase 60% e temos uma resposta absolutamente inadequada àquilo que é preciso. Mesmo internamente, onde é que tem uma resposta dos serviços públicos devidamente adequada àquilo que são as necessidades do cidadão? Onde é que está o Serviço Nacional de Saúde? Não existe. O mal disto tudo é que os privados são os criminosos, é o diabo, mas eu acho exactamente o oposto, acho que o sistema público e os amigos que estão no sistema público e a corrupção que está no sistema público, que são milhares de milhões – a corrupção custa 20 mil milhões por ano, o apoio à habitação custa mil milhões, está a ver a disparidade.
Cerca de 18 mil milhões, dizem Os Verdes, mas não é só setor público. Passando para a guerra, que papel deve ter a União Europeia na guerra na Ucrânia?
O problema é que para fornecer armamento e munições a União Europeia tem de os ir comprar. Porque as indústrias europeias de Defesa morreram. Acho extraordinário que, por exemplo, a senhora Von der Leyen, que destruiu as forças armadas alemãs quando era ministra da Defesa – refazer o exército alemão vai demorar dez a dozes anos -, venha agora falar de um exército europeu e tenha um discurso belicista, como o secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, a dizer temos de atacar, temos de fazer, temos de acontecer. É evidente que isto não é assim.
A União Europeia é um espaço de paz e de prosperidade e é isso que temos de desenvolver. Pergunta-me o que podemos fazer na Ucrânia: temos de fortalecer a Ucrânia para que a Ucrânia esteja, se não em pé de igualdade, pelo menos numa condição forte em relação à Rússia para poder negociar a paz. Porque um parceiro fraco nunca vai conseguir negociar uma paz forte.
O apoio à Ucrânia, neste momento, é fundamental, não para ganhar a guerra em termos bélicos, isso talvez a Rússia nunca deixe acontecer, porque ter forças superiores, mas porque tem de ter a capacidade bélica suficiente para negociar com a Rússia. Isso, quanto a mim, é absolutamente óbvio: a Ucrânia a Ucrânia vai ter de reforçar a capacidade bélica para poder negociar a paz. É um princípio antiquíssimo da diplomacia, o fraco não negocia paz com o forte.
É evidente que Portugal é um pequeno país, é uma pequena parte deste complexo. Aquilo que dermos, em virtude da nossa capacidade e daquilo que somos, é uma gota de água no oceano. No que é mais importante que Portugal dê, de facto, é o apoio constante, sólido e fundamentado para que as coisas tomem um rumo e não saiam do caminho.
A maior parte das pessoas acha que é tudo preto e branco. Ora, se nem nas relações internas é tudo preto e branco e isto anda aqui um pouco matizado, muito menos o é nas relações internacionais, em que o cinzento é a cor primária de qualquer relação ou acção internacional. As pessoas não compreendem isto, para elas é o bom e o mau, o preto e o branco.
E no caso do conflito entre Israel e a Palestina? Foi embaixador em Israel, é possível encontrar uma solução?
Em primeiro lugar, considero perfeitamente infantil, e não só, estes reconhecimentos do Estado Palestiniano, que não existe. É uma idiotice reconhecer um Estado em guerra, que não tem unidade territorial, que não tem sequer um governo único, que não tem capacidade de subsistência se não fosse a ajuda externa. Isto é uma infantilidade total.
Mas não é um sinal?
Não é sinal nenhum. Por exemplo, no caso espanhol é uma cortina de fumo para tirar a atenção dos assuntos internos. Obviamente. No caso norueguês, é porque estão convencidos que pode ter influência nos Acordos de Oslo, que não tem influência nenhuma.
Mas isto é de uma infantilidade extrema. Porque não se reconhece um Estado cinco vezes – cinco vezes -, tendo em cima da mesa dois Estados. E nós somos a favor da existência de dois Estados. A última vez foi com o Ehud Olmert como primeiro-ministro de Israel, mas a vez que se esteve mais próximo foi em Camp David, com Bill Clinton, Ehud Barak e Yasser Arafat. Estiveram a um milímetro de arranjar um acordo.
Sempre foram os palestinianos que recuaram no formato da existência de dois Estados. Nunca foi Israel, foram sempre os palestinianos. Isso diz alguma coisa.
O que é que diz?
Se eu lhe disser que quer a Fatah, quer o Hamas odeiam tanto os israelitas como se odeiam entre si próprios, está um pouco tudo dito.
Um acordo está condenado à partida?
Vou dar-lhe dois exemplos. A Guerra dos Balcãs, onde a destruição foi muito maior do que em Rafah e muito mais extensa, alguém se importou? Não, porque não eram judeus. Quando o rei Hussein, pai do actual rei da Jordânia, matou 20 mil palestinianos no Setembro Negro, alguém levantou o olhar, sequer? Não. E foi um massacre. Portanto, há aqui dois pesos e duas medidas na análise dos conflitos.
O que está a dizer: deixem-nos morrer, não se ligou antes, não vamos ligar agora?
Os números de mortos e feridos que estão a ser falados são do Hamas. Não são números claros. Portanto, todos nós estamos a ser sujeitos a uma propaganda sistemática de que há maus e bons. Quantas vezes nos conflitos, desde a Bósnia ao Iraque, passando pela Síria, eu não via mortos, mártires, envoltos em lençóis brancos a mexer o dedo do pé ou a coçar a barriga? Quantas vezes.
Ou seja, estamos todos a ser enganados e manipulados, isto é uma cabala, não está a acontecer nada, está tudo bem em Gaza?
Não é bem assim, agora temos é de evitar exageros, digo eu. Convém lembrar o que se passou no dia 7 de Outubro.
Mas a minha pergunta não é como é que isto começou, é como é que isto se pára, como acaba.
Há que distinguir as coisas. Ao contrário da guerra na Ucrânia, o conflito Israel-Hamas é um conflito de ódio. Existe uma radicalização de ódio que não existe no caso ucraniano. Mas, pior. Os países árabes continuam a alimentar o ódio pelos palestinianos como sempre alimentaram. Usam os palestinianos como arma de arremesso. Agora pergunto: tirando a liderança do Hamas, que vive a 100 metros da nossa embaixada em Cuba, quantos palestinianos é que há no Catar, na Arábia Saudita, no Egipto, em Marrocos ou na Argélia? Não há.
Há na Jordânia, no Líbano na Cisjordânia e na Faixa de Gaza. E quando se faz o reconhecimento – isto é muito importante que se diga – deste tal Estado Palestiniano, está-se a pôr diretamente em perigo a existência do Estado jordano, onde estão cerca de três milhões de palestinianos, que também vão querer ser parte desse Estado. As pessoas não estão bem a pensar no que é que pode acontecer. Sei porque estive lá várias vezes, conheço-os. E acho de uma desenvoltura, de uma infantilidade terrível, o que está a acontecer.
É o cabeça-de-lista mais velho, numas eleições onde pela primeira vez temos candidatos principais que nasceram não só depois do 25 de Abril, mas depois da adesão de Portugal à EU.
Quer a minha cabeça, já percebi. Mas, para sua informação, sou o único candidato campeão nacional absoluto em título. Ganhei o campeonato nacional de Vela em Agosto do ano passado. E sou o único candidato atleta olímpico.
Nada disso, é apenas uma provocação, porque a inovação e tecnologia estão entre as maiores preocupações dos cidadãos europeus. Sente-se ultrapassado por estas questões da IA e da blockchain?
Não. Sou uma pessoa evoluída mentalmente e sempre evoluí. E depois há uma coisa, o meu filho mais velho, Manuel Tânger, é um dos grandes especialistas da Inteligência Artificial em Portugal, a BTI, é membro da universidade da NASA. E vamos falando sobre estes assunto, vai-me dizendo o que se passa, e concordo com uma coisas e não concordo com outras.
Continuamos, apesar de toda a evolução tecnológica, presos às soluções do passado, seja em que área for?
Não sou funcionalmente competente em tecnologias de ponta, mas rodeio-me de pessoas que o são. Por isso, há muito ultrapassei essa fase. Há países que são bons, como a Holanda e outros, que se desenvolveram e sempre estiveram à frente no tempo, mas o resto está mais atrasado do que Portugal. Temos tecnologias de ponta que a maior parte dos países na Europa não tem.
Em que comissões parlamentares gostava de ficar?
Por acaso não pensei. Mas é evidente que há aqui duas opções, ou vou para aquilo me que sou mais competente, obviamente os assuntos internacionais, a negociação, por aí – mas não sei se serão as mais relevantes para Portugal -, ou vou para aquelas que são mais relevantes para Portugal, corrupção, transparência, agricultura e pescas, imigração, habitação, onde as minhas valências são claramente melhores, mas existem assessores e vou para onde for mais importante para Portugal.
Já falámos um pouco sobre isto, mas gostava de saber como avalia o mandato de Ursula von der Leyen à frente da Comissão – e agora candidata pelo PPE, e já veio dizer que pode fazer acordos com a extrema-direita…
Vamos ver se ela tem condições para ser candidata, porque o processo dela foi entregue aos procuradores do Luxemburgo. Vamos ver se tem condições política para ser candidata. Somos claramente contra Von der Leyen, porque ela representa toda a visão da União Europeia com a qual não concordamos, que é a visão federalista.
O ID tem um candidato, Anders Vistisen. É o candidato do Chega?
Não. Ainda é cedo, faltam os resultados das eleições, está a haver muita movimentação de bastidores, vamos ver como se vão passar. A minha convicção pessoal é que muitas alterações vão ter lugar e nós portugueses estamos um pouco na bancada a ver o que vai acontecer entre as grandes potências: Alemanha, França, Itália, Polónia, Hungria e também Espanha. Todos os que elegem um número de deputados muito superior a nós. Temos de ver qual é a melhor forma de responder àqueles que votaram em nós e que confiaram em nós, onde nos podemos enquadrar para defender melhor os interesses dos portugueses.
Não tem qualquer poder de decisão na matéria, mas em que pasta gostaria de ver um comissário português?
Olhe, o ouro sobre azul seria a Agricultura e Pescas.
Os comissários portugueses têm beneficiado Portugal através da pasta que ocupam?
Uns sim, outros não.
Quem é que não?
Vai-me desculpar, mas não posso entrar em pormenores. Mas há um que beneficiou Portugal, Cardoso e Cunha.
Quais são os objectivos do Chega para estas eleições?
Ah, aí, desculpe, mas já entramos na bola de cristal.
Nas legislativas André Ventura acertou na mouche.
Mas é que o André Ventura sabe mais de política portuguesa do que eu. Eu sou um emigrante.
Um emigrante que não gosta de imigrantes. Foi maltratado lá fora, nos países por onde passou?
Então não gosto?! Tenho o maior carinho pelos imigrantes brasileiro, ucranianos, romenos, moldavos, o meu filho mais velho é luso-brasileiro, então não gosto? Gosto imenso. O que não tenho é confiança naqueles que têm uma matriz cultural completamente diferente da nossa.
Comentários