Segundo dados da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR), em 2016, a capitação de água consumida total, ou seja, a quantidade por habitante por dia foi de 187 litros e Lisboa apresenta a quantidade mais elevada, com 281 litros, seguida de Bragança (244) e de Faro (243).
Ao contrário, o gasto médio por consumidor é mais baixo em Viana do Castelo, com 144 litros por dia, e Leiria, com 163 litros.
A água consumida não se resume àquela que chega às torneiras das habitações, mas inclui também os gastos no comércio, na indústria e na agricultura.
Quando a análise tem por base a capitação de água consumida no setor doméstico, é Évora que apresenta o valor mais alto, com 175 litros por habitante por dia, e Faro, com 153 litros.
Viana do Castelo, com 101 litros de água por dia, e a Guarda, com 102 litros, apresentam os consumos mais baixos.
A água captada atingiu 799 milhões de metros cúbicos em 2016, contra 794 milhões um ano antes, e a maior parte das 6.166 captações, ou seja, 5.878, é de água subterrânea.
As entidades gestoras em alta, ou seja, aquelas responsáveis por conduzir este recurso desde a captação até aos depósitos, captaram 582 dos 799 milhões de metros cúbicos anuais
As mais de 250 entidades gestoras em baixa levam até aos consumidores a água através das redes de abastecimento e serviram 9,6 milhões de habitantes, com um consumo autorizado de 611 milhões de metros cúbicos anuais, refere o último Relatório Anual dos Serviços de Águas e Resíduos em Portugal, com dados de 2016, disponível no site da ERSAR.
Mas, daqueles 611 milhões de metros cúbicos, só são faturados 576 milhões.
A redução da água não faturada, que pode ser resultante de perdas no sistema ou de não pagamento de tarifa, é um objetivo em que o ministro do Ambiente e as organizações ambientalistas têm insistido e que ganha ainda mais importância com a situação de seca vivida no país.
Trata-se de diminuir o nível de perdas económicas e físicas correspondentes à água que, apesar de ser captada, tratada, transportada, armazenada e distribuída, não chega a ser faturada aos utilizadores.
A água não faturada em baixa foi de cerca de 30% ou 240,8 milhões de metros cúbicos em 2016, mantendo-se na comparação com o ano anterior, e em alta foi de 5,2% e tem vindo a aumentar (em 2015 foi de 5%).
O relatório da ERSAR refere que a média ponderada das tarifas aplicadas em 2016 nos sistemas de água em alta foi de 0,4941 euros por metro cúbico, menos 1,5% que em 2015.
Em 2016, o investimento total acumulado no serviço de abastecimento de água foi de 6,7 mil milhões de euros, dividido em partes sensivelmente iguais entre entidades gestoras de sistemas de titularidade estatal e de titularidade municipal, segundo o documento.
O investimento por alojamento atinge em média 808 euros, sendo mais elevado nas entidades gestoras de sistemas de titularidade estatal.
Culpar famílias por grandes consumos é distorcer a mensagem
Os governos têm grandes responsabilidades na gestão da água no mundo e cabe-lhes adotar políticas corretas, diz a diretora da parceria global Saneamento e Água para todos, que considera “distorção da mensagem” apontar o dedo aos consumidores.
Diretora executiva da “Sanitation and Water for All”, ex-relatora especial da ONU para a água e saneamento, Catarina Albuquerque diz à Lusa que faz em casa o que cada consumidor deve fazer, fechar torneiras e poupar água, mas acrescenta: “só que a água que consumimos em casa é 05% da água consumida no planeta”.
Por isso não entende que haja uma tendência para se ver os consumidores domésticos como os grandes gastadores, quando o setor da agricultura consome 70 e o da indústria 20% da água do mundo. “A mensagem tem de ser mais para eles do que para nós, há uma distorção da mensagem”.
Catarina Albuquerque falava à Agência Lusa a propósito do 8.º Fórum Mundial da Água, em Brasília na próxima semana (de 18 a 23), o maior evento global sobre a tema, organizado pelo Conselho Mundial da Água e no qual as alterações climáticas serão um dos temas em destaque.
“Com as alterações climáticas temos zonas do globo que estão a ficar mais secas e outras com chuvas muito intensas. Temos cada vez mais situações extremas”, disse Catarina Albuquerque, lembrando que a agravar o “stress hídrico” há cada vez mais consumo e hábitos de grandes gastos de água (piscinas e campos de golfe, por exemplo), o que faz com que na realidade haja menos água por pessoa.
Catarina Albuquerque foi a primeira relatora especial da ONU para a defesa do direito à água potável e ao saneamento e pela sua mão as Nações Unidas reconheceram a água e o saneamento como direitos universais.
Sabe que outro problema relacionado com a água tem a ver com as desigualdades, e lamenta que se invista mais para beneficiar as classes médias do que as pessoas mais pobres, uma prática até das grandes instituições financeiras internacionais.
“Acho que tem de haver um equilíbrio entre o que é investido nas grandes cidades e o que é investido para chegar às classes marginalizadas. Não estão a ser eliminadas essas desigualdades. Há países onde o stress hídrico vai aumentar exponencialmente nos próximos anos”, avisou.
É por isso que no futuro vê a água como causa de conflitos, embora preferisse ver a água como agende de paz e cooperação. Mas lembra que as guerras estão muitas vezes ligadas à posse de recursos naturais, e que “a água, ao contrário dos diamantes, é indispensável para a vida”.
Num futuro com menos água por pessoa a responsável diz que todos devem contribuir mas que é preciso “coragem para por o dedo na ferida”. Porque há países onde a água para a agricultura é mais barata do que para consumo humano, porque é preciso que os governos obriguem o setor privado a restringir os consumos, porque é preciso que as culturas se adaptem aos novos tempos, e porque “a água que devia estar a chegar às pessoas está a chegar ao algodão”.
Para produzir um par de calças são precisos 11 mil litros de água e um café “custa” 140 litros, diz Catarina Albuquerque, salientando que tem de haver “maior sensibilização para tudo isto” e que os próprios supermercados deviam promover a educação sobre o tema, a “pegada da água”, para que os consumidores possam fazer escolhas conscientes.
E no entender da especialista o futuro passa também pela reutilização da água. E cita o ator e ativista Matt Damon (um dos fundadores do portal www.water.org )para lembrar que 700 milhões de pessoas apenas têm acesso a água de muito pior qualidade do que aquela que nos países ocidentais se despeja nos autoclismos.
É desses temas que, disse à Lusa, falará no Fórum de Brasília na próxima semana, das desigualdades, do financiamento, da aposta nas partes menos visíveis do setor, da corrupção e da importância de não deixar ninguém para trás.
Esse é na verdade o grande objetivo do Saneamento e Água para Todos, uma parceria que junta países em desenvolvimento, doadores, agências multilaterais e sociedade civil. Que ninguém fique para trás.
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