A história remonta a 2007 quando James Bowen passava um dos piores momentos da sua vida. Ou, como agora retrata, estava “na sua sétima vida”. Toxicodependente durante mais de dez anos, era à época um dos muitos sem-abrigo de Londres com uma história igual à de tantos outros. Doze anos depois, a sua história mais parece um conto de Natal.
James Bowen resolveu agora contar num novo livro o que aprendeu com o seu gato ao longo destes anos. “O que aprendi com Bob - lições de vida de um gato de rua” é um somatório de “pequenas lições de todos os dias” que poderiam quase ser uma espécie de mindfulness ministrado por um gato - aliás, é esse o título de um dos capítulos (“bobfulness”).
“Achei espantoso aquilo que as pessoas retiraram do livro e do filme que foi feito sobre mim e Bob. O Bob mudou completamente a minha vida e tê-lo por perto ensinou-me várias lições de vida. Se outros puderem beneficiar disso, gostava de o partilhar” - é assim que James Bowen, o dono, explica a razão de ter escrito este livro. Um livro que veio apresentar a Lisboa no final de novembro, numa das muitas viagens que tem preenchido a sua vida -e a de Bob - desde que a história de ambos se tornou pública.
Este livro de lições de vida por gato que se lê numa noite junta ideias que, na sua maioria, já ouvimos ou já pensámos. São senso comum polvilhado com o açúcar que a inspiração felina pode trazer, sobretudo às pessoas que partilham com James o carinho por gatos - e que não sou poucas. Mas entre o senso comum e o marketing a uma história verdadeira, qual a distância que vai? “Para mim não é sobre as lições em si mesmas, mas sobre como em cada momento da minha vida eu percebi o valor de cada uma. Algumas podem parecer senso comum, mas essa característica não é assim tão comum e muitas vezes não nos apercebemos quão importante é um determinado conselho até ao momento em que precisamos dele”.
Uma das ideias que trespassa o livro é a confiança que os animais nos merecem por contraponto à desilusão que algumas relações humanas nos oferecem. Confrontado com a ideia, James diz que não se trata de confiança mas de outra coisa. “É fácil amar animais incondicionalmente e se os tratarmos bem eles serão os nossos melhores amigos para a vida. As pessoas são mais complicadas que isso. Mas penso que a forma como tratam os animais pode ser uma boa pista de como tratarão outras pessoas. E penso que poderíamos aprender imenso sobre como nos devemos tratar uns aos outros prestando atenção à forma como cuidamos dos nossos animais”.
Das muitas lições partilhadas no livro, escolhemos duas para serem comentadas pelo dono de Bob. Uma é a conclusão que “todos precisamos de ser vistos”. “Dar um pouco de atenção a alguém pode fazer realmente a diferença na vida das pessoas. Quando vivemos na rua, as pessoas passam por nós todos os dias e não querem saber se estamos com frio, se temos fome, se estamos a sofrer. Um gesto por mínimo que seja - às vezes só estabelecer contacto visual , dizer olá - pode melhorar o dia só por nos lembrar que não somos invisíveis”.
E depois a nossa preferida: “a curiosidade não matou o gato”, ao contrário do que por vezes se diz (e que Bob e o seu dono contrariam). “Não gosto mesmo dessa frase. A frase original é outra, na realidade: a curiosidade matou o gato, mas a satisfação trouxe-o de volta. É suposto encorajar as pessoas a explorar, a embarcar em aventuras, a aprender sobre o mundo e sobre tudo o que tem para oferecer. É suposto dizer-nos que seremos recompensados por irmos atrás dos nossos sonhos. Sem a segunda parte, que geralmente é omitida, é usada para alertar as pessoas para não fazerem tudo aquilo que faz a vida valer a pena. Defendo que devemos voltar a abraçar a ideia da curiosidade - é a forma motora para fazermos coisas incríveis”
James Bowen é atualmente embaixador de várias causas sociais que apoiam pessoas e animais em situações difíceis na vida. Escreve, contribui em vários projetos criativos e lançou duas músicas. Passaram-se mais de dez anos desde que vive numa casa com Bob - não se casou, não teve filhos, mas, dono e gato, adotaram um novo membro na família. Agora os gatos estão em vantagem - passaram a dois desde que Jynxie se juntou à família. E é bem provável que no próximo livro já tenha alguma coisa a dizer.
E não podia este livro simplesmente chamar-se “Bobfullness”? Não fomos apenas nós a lembrarmo-nos disso. James conta que várias pessoas gostaram da ideia e criaram uma página de Facebook onde partilham as suas lições favoritas de Bob. Uma outra forma de encontrar sentido para a vida pode ser esta, perguntar ao nosso gato.
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