Dou-vos exemplos próprios. Já dei por mim sentado na sanita, depois de fazer o que tinha a fazer, e reparei que o meu colega de casa não tinha trocado o papel higiénico. Pensei “isto com Salazar não acontecia”. Outra vez, ao ouvir uma amiga minha dizer que é uma vergonha a disparidade salarial entre homens e mulheres, e que tem ambições de tirar um MBA e ser CEO de uma grande empresa, pensei “que saudades do patriarcado a sério onde o mulherio ficava em casa, isto faz falta é um novo Salazar”. Já para não falar da apologia da “normalidade” das pessoas que sofrem da doença de homossexualismo ou das de pigmentação escura (suja?) da pele e, pior que tudo, a esquerdalha nojenta sempre com as balelas defensoras da liberdade individual. É por causa disto tudo que o país está como está, uma taxa de desemprego de 95% e níveis de pobreza piores do que na Etiópia. Vi estes dados na internet, no site factosfachos.pt.
A TVI achou, de forma consciente e ponderada, e nada por desespero de ter perdido a Cristina Ferreira e de o seu programa na SIC estrear já esta semana e estar a morrer de medo de perder muito nas audiências, que era saudável e democrático convidar o "repórter" Bruno Caetano, banhista que quando vai à praia na Costa de Caparica atravessa a Ponte de Salazar, e o ex-líder de extrema-direita, Mário Machado – condenado e preso por crimes de ódio e envolvimento em homicídio, entre outros – para falar sobre aquilo em que toda a gente pensa “quantos Salazares é que são precisos para pôr toda esta libertinagem na ordem?”.
Agora, acho que se pode ir mais longe, e até deixo a ideia. Mário Machado a fazer dupla de apresentação com o Goucha, e com rubricas protagonizadas pela Maria Vieira. Aí sim, era um grande programa que até se podia passar a chamar Você, na TV Salazar, ou simplesmente Salazar na TV. E todos os dias se podia abrir discussões democráticas e relevantes como “quantos lugares na parte de trás dos autocarros é que os pretos merecem?”, “qual a melhor estratégia para recuperar as nossas colónias?”, “até que ponto é assim tão errada a tortura do sono ou a existência do Tarrafal?”, “será que as mulheres deviam apresentar programas de televisão, principalmente em canais da concorrência?”, “por que não fazer um remake do América Proibida com o Mário Machado no lugar do Edward Norton mas em que ganham os nazis?”, ou até “não era melhor para o país se se criminalizasse o homossexualismo?”, embora esta fosse mais chata para o Goucha defender em nome das audiências.
Enfim, novo ano, novo canal de propaganda e novos caminhos para o regresso da ditadura em nome da Pátria e da supremacia branca, patriarcal e heternormativa. Uma maravilha.
Sugestões mais ou menos culturais que, no caso de não valerem a pena, vos permitem vir insultar-me e cobrar-me uma jola:
- Black Mirror: o filme. Ainda não vi, mas já estou doido.
- Livros que estou a ler e a gostar: O Ano da Morte de Ricardo Reis – José Saramago. As Portas da Percepção – Aldous Huxley.
- Lugar Estranho: entretanto os bilhetes para o meu solo de stand-up para Lisboa e Porto continuam aí a saltar. Anuncio em breve as datas da tour pelo país.
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