O último Eurobarómetro avisa que só 35% de todo o eleitorado europeu está seguro de ir votar, um terço provavelmente não vai, outro terço está ainda indeciso. Partidos soberanistas, portanto adversários do ideal fundador da União, serão os mais votados em Itália (a Liga de Salvini), no Reino Unido (o Brexit de Farage), e, provavelmente, em França (o Rassemblement, nova versão da Frente Nacional de Le Pen). A Península Ibérica torna-se o bastião europeu do socialismo, com as previstas vitórias socialistas em Portugal e Espanha. Vai longe aquele final do século XX em que os partidos da Internacional Socialista se impunham de Lisboa a Estocolmo e de Copenhaga a Atenas.
Há figuras que vão atrair a atenção mediática: Yannis Varoufakis, carismático ex-ministro das Finanças da Grécia, fogoso combatente contra as políticas de austeridade no tempo da troika, é o cabeça de lista de um partido transnacional que ele próprio fundou na Alemanha, barizado em inglês como Democracy in Motion (DiEM25). As sondagens dão-lhe margem confortável para a eleição como um dos 96 deputados na quota alemã. São várias as candidaturas transnacionais, como a de Varoufakis: Luciana Castellina, figura histórica do comunismo italiano, agora, aos 90 anos de idade, candidata-se pelo Syriza grego. O francês Nicolas Barnier, filho do negociador-mor do Brexit por conta da União Europeia (Michel Barnier está bem cotado na dança dos nomes para suceder a Juncker como presidente da Comissão Europeia), candidata-se pela lista Reformadora belga do primeiro-ministro Charles Michel. Encontramos outros candidatos estrangeiros em listas alemãs, belgas, espanholas, holandesas e suecas.
Um mito no desenvolvimento da União Europeia é Jacques Delors. Os grandes avanços europeus das últimas décadas têm a mão deste visionário ex-presidente da Comissão Europeia (85/95): moeda única, programa Erasmus, políticas de coesão, redes europeias de transportes, todos os grandes progressos da União Europeia, no período fulcral da queda do Muro, da reunificação alemã e da democratização do Leste da Europa, tudo teve Delors a impulsionar. Agora, Manon Aubry, neta de Delors e filha da ex-ministra socialista, ela é porta-voz da Oxfam e candidata-se pela extrema-esquerda francesa, na lista da França Insubmissa. Se for eleita será, aos 20 anos, a mais jovem eurodeputada.
Muitos olhares também estarão voltados para Rachel Johnson, irmã do célebre hiperativo pró-Brexit Boris. Rachel está no campo oposto ao do irmão, candidata-se pelo Change UK, que reclama novo referendo.
A sueca de origem ganesa Alice Bah Kunke, depois de ter sido ministra da Cultura e da Democracia no governo de Estocolmo, candidata pelos Verdes, vai certamente ser uma protagonista no combate ao CO2 e pelo cumprimento dos Acordos de Paris em defesa do clima. O grupo Verde vai ser uma força relevante no próximo Parlamento Europeu: as estimativas dão-lhe 55 dos 751 eurodeputados.
Outra mulher no centro das atenções é a liberal dinamarquesa Margaret Vestager. Faz parte, também com Carlos Moedas, do grupo de mais elogiados comissários europeus. Vestager é outra boa possibilidade para suceder a Juncker como presidente da Comissão. A necessidade, por parte das famílias políticas até aqui dominantes (conservadores e social-democratas), mas que agora têm anunciada a perda da maioria absoluta, pode levar ao compromisso com os liberais e isso envolver a boa escolha de Vestager para liderar a Europa. Ser mulher também pode ser um trunfo.
Vai ser interessante, na próxima segunda-feira, analisar as cores do novo mapa político da Europa.
A Espanha vai passar do azul do PP para o vermelho do PSOE. A última sondagem dá os socialistas (29%) com 10 pontos percentuais de vantagem sobre o PP (19%). Em deputados, 17 para o PSOE e 11 para o PP. Anuncia-se combate cerrado entre Ciudadanos e Unidos Podemos na luta pelo terceiro lugar, ambos com a promessa de uns 9 deputados. A lista do Vox vai provavelmente juntar quatro deputados à força europeia da direita radical, num parlamento que deve ficar com também quatro deputados independentistas catalães. A percentagem de votantes em Espanha deve ser reforçada pelo facto de também haver batalhas locais com eleições municipais em simultâneo com as europeias.
Em França as sondagens apontam persistente empate (a 22%) entre a République en Marche, de Macron, e o Rassemblement National, de Le Pen. A luta eleitoral vai ser muito intensa nestes últimos dias de campanha, com dramatização da conquista do primeiro lugar, resultado que terá forte repercussão na política interna. Os Républicains (herdeiros da antiga direita tradicional) ficam por modestos 12% e a France Insoumise aparece com 10% das intenções de voto. Neste campo da esquerda francesa, as divisões são múltiplas e o PSF arrisca-se a, pela primeira vez, não eleger um eurodeputado.
No Reino Unido, com voto apesar do processo de Brexit, anuncia-se um terramoto político: o partido do Brexit, criado por Nigel Farage, lidera as intenções de voto com 34% dos votos e o amplo avanço de 14 pontos percentuais sobre os trabalhistas (20%), enquanto os conservadores de Theresa May aparecem devastados com apenas 12 ou 13% das intenções de voto, ultrapassados pelos liberais-democratas (15%). Os Verdes e o Change UK, ambos com à volta de 10% das intenções de voto vão sair reforçados. Farage, com a mensagem veemente e coerente de que o referendo sobre o Brexit está a ser traído vai sair desta eleição como um vencedor, May e Corbyn sofrem nova e talvez definitiva derrota, mas é de admitir que uma maioria contra o Brexit venha mesmo a forçar novo referendo – os 34% de Farage são muito voto, mas apenas um terço do eleitorado.
A Itália está voltada para a direita soberanista e autoritária de Salvini. O governo nacionalista formado pela Liga (28% nas sondagens) e pelo Cinco Estrelas (23%) vai sair reforçado. O Partido Democratico, que levanta a bandeira da esquerda, fica à volta dos 20% e a direita tradicional, a Forza Italia, de Berlusconi, dificilmente chegará aos 12%. Esta época italiana está muito de costas para a União Europeia.
Na Alemanha, pela primeira vez em 20 anos há eleições e não se dá por Angela Merkel na campanha. A figura da CDU/CSU é a sucessora designada, Annegret Kramp-Karrenbauer, a quem cabe, nestas eleições, mostrar que tem força para liderar a Alemanha do futuro. As sondagens dão à CDU/CSU modestos 30%, por isso a coligação cristã-social e conservadora está nervosa. A grande expectativa nesta votação alemã é o resultado dos Verdes: as sondagens colocam-nos entre os 18 e os 20%, com dois a três pontos percentuais de avanço sobre o SPD, assim obrigado a repensar toda a estratégia que fez dele partido-âncora na política alemã. A extrema-direita AfD segue constante nos 12%.
Na Polónia, estas eleições europeias estão a tornar-se uma espécie de referendo, com resultado muito aberto, sobre o governo soberanista e ultraconservador do PiS, que tem ligeiríssima vantagem no empate técnico no empate à volta dos 40% com a coligação liberal KE dos partidos europeístas na oposição. Muitos comentadores admitem que a derrota possível do PiS de Kazcynski venha a ter o efeito de uma reviravolta a curto prazo no rumo político da Polónia.
A Europa confronta-se nestas eleições com a possibilidade de renascer. Mas também com o risco de definhar ainda pais.
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