Lusco-fusco. Muitas críticas continuam a ouvir-se por o país ter ficado às escuras, sempre por causa de um "quase que" ou de um "e se", porque somos todos óptimos a fazer cenários para o que não aconteceu, mas péssimos a prever o que pode vir a acontecer. São os prognósticos no fim do jogo.

Não estou de acordo com as críticas. O meu telefone morreu pouco depois do meio-dia por falta de bateria. Foi quando os miúdos deixaram de ir e vir com "notícias" sobre as causas do incidente, cada uma mais sensacionalista do que a outra, que fiquei a saber que não havia comunicações. À cautela, pedi para desligarem em casa as fichas das tomadas, para encherem as sua garrafas com água da torneira e para porem a funcionar o rádio a pilhas que era do avô. Continuava a haver luz do dia, mas, se necessário, também havia velas numa gaveta.

Os apagões não são inéditos. Uma pesquisa superficial mostra que nos Estados Unidos, em Fevereiro de 2021, 4,5 milhões de pessoas ficaram sem electricidade no Texas durante vários dias devido a uma onda de frio (morreram entre 250 e 700 pessoas directa ou indirectamente por causa desta falha); em Agosto de 2020, quase dois milhões ficaram sem energia eléctrica no Iowa e no Illinois; em Março de 2023, milhares de pessoas foram afectadas pela falta de energia eléctrica no Reino Unido, sobretudo Londres e arredores, devido a uma tempestade.

Portugal não esteve mal. Claro que houve sustos e inconvenientes, mas, de maneira geral — e algumas vezes amadora, até, vamos agora sabendo pelas histórias que são contadas —, as autoridades estiveram bem e não houve danos maiores a lamentar. Mesmo sem comunicações, o que, para mim, foi a falha mais grave — só tarde e a más horas, depois das 17:00, com as comunicações móveis cortadas, é que a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) enviou a seis milhões de utilizadores um SMS a avisar que a reposição de energia seria gradual e a pedir serenidade.

Resta saber o que aprendemos todos com este apagão. As pessoas em geral — com comportamentos inadmissíveis, não quero imaginar se fosse um ataque a sério —, e o governo em particular, que terá de encontrar respostas para evitar outra situação do género e fazer muitas contas, nomeadamente entre os custos de voltar a ficar sem electricidade e ter mais centrais black start (capazes de reiniciar quando a rede externa está desligada). De uma coisa tenho a certeza, quando chegar a factura, todos vão querer pagar a conta mais baixa.

Apagados. Já não falo em rasgos de inteligência, não peço tanto, mas algum discernimento e bom senso, alguma elevação no debate e, sobretudo, ideias que mostrem para onde querem levar o país e onde querem Portugal daqui a cinco ou dez anos dava jeito.

Infelizmente para os portugueses, nem uma coisa nem outra. Quatro eleições legislativas em cinco anos e meio, estamos todos fartos, e nenhuma visão. É isto que os nossos políticos têm para nos oferecer. Como dizia alguém, só que não estorvem, já ajuda. Não estraguem mais.

O mundo enfrenta desafios tremendos, tem diversas guerras à porta, militares, comerciais e socioculturais. Mas sobre isto, nem uma palavra. São tricas atrás de tricas, zangas de comadres, birras de miúdos, amuos de gente sem noção do papel que ocupa. Atravessamos um apagão na política e aqui não há black start que nos salve e a ligação à rede Europeia está cheia de falhas.

Obscuro. As greves da CP são já inadmissíveis. Em 2022, os comboios pararam de 1 a 31 de Agosto, em 2023, a companhia paralisou 98 dias só até Julho, em 2024, foi como se não existisse entre 27 de Junho e 14 de Julho, em 2025 é o que se vê, ou por outra, o que não se vê: não houve comboios para ninguém nos dias 7 e 8 de Maio e até dia 14 sabe Deus.

Isto acontece numa empresa pública, com aumentos salariais em 2018, 2020 e 2022, o que contraria a ideia de que os salários estão congelados há mais de uma década. Em 2022, foi aplicado um aumento de 0,9% retroactivo a Janeiro, alinhado com a função pública. Em Julho de 2024, foi acordado um aumento de 1,5% a partir de Agosto e um aumento do subsídio de refeição para 9,20 euros. O acordo prevê ainda a revisão das grelhas salariais e a unificação de prémios anuais de produtividade. Estes compromissos foram aceites por 11 sindicatos (onze sindicatos, caramba!).

Os salários dos maquinistas e revisores da CP variam consoante a função específica, a experiência e os acordos colectivos em vigor. Mas, grosso modo, um maquinista ganha, brutos, entre 1.200€ e 1.400€. A este valores acrescem subsídios e complementos (como prémios por quilometragem, trabalho nocturno ou horas extraordinárias), que sobem o valor final para uma média de 1. 770€. Mas que pode atingir 2.500€ brutos mensais no topo da carreira. No caso dos revisores, o salário varia entre os 1. 000€ e os 1.100€, valores arredondados.

Além disso, os trabalhadores da CP beneficiam de um conjunto de vantagens sociais, laborais e financeiras, como viagens gratuitas (extensivas a cônjuges, filhos em idade escolar e reformados). Em 2024, a CP teve lucros 1,8 milhões de euros, metade de 2023, num ano marcado pela entrada em vigor do passe ferroviário de 20 euros (pelo qual recebeu uma compensação de cerca 89 milhões de euros) e por um aumento de 15 milhões dos custos com pessoal.

Estas greves são desproporcionais e excessivas, sobretudo face aos custos que acarretam para os passageiros, e já levaram governo e oposição a falar na necessidade de rever a lei (sem retirar direitos). E bem, porque não pode valer tudo.

Lúgubre. Morreu o embaixador Luís Soares de Oliveira, aos 97 anos, um homem extraordinário e de grande cultura, que não teve do Estado as honras que merecia.

Foi aluno do Colégio Militar e, embora licenciado em Economia e Finanças, optou pela carreira diplomática – Marcello Caetano fez parte do júri do último concurso a que se submeteu no Ministério dos Negócios Estrangeiros. Passou pelas Nações Unidas, pela Embaixada de Washington, Seul, São Paulo e Londres, altura em que José Manuel de Mello lhe propôs liderar a diversificação do grupo no Brasil.

O tetravô fundou a Fábrica dos Pastéis de Belém e deserdou a filha, que preferiu o tesoureiro do Banco de Portugal a casar com um comerciante rico. Era a bisavó Violante, a quem sempre ouviu dizer: "A energia vem-nos do amor, não do dinheiro (ou dos pastéis de nata)". E energia e sentido de humor nunca faltaram a Luís Soares de Oliveira, que sabia fazer sobressair o que de melhor havia em cada um dos que o rodeavam. Vai fazer imensa falta.

Luz. Foi ontem eleito o Papa Leão XIV e com ele renasce a esperança — penso que não só dos católicos, porque como dizia um professor da Faculdade de Teologia da Universidade Católica: "Os alunos questionam, mas em altura de exames a capela enche".

Sou católica, pouco praticante nos dias que correm, cada vez mais cheia de dúvidas, sempre devota de Nossa Senhora, a de Fátima, a do Ó, a Virgem de Macarena (Sevilha). Robert Francis Prevost conquistou-me com aquela Avé Maria.

Mas já me tinha rendido aos primeiros sinais, a sua emoção contida logo que encarou, da sacada central da basílica, toda aquela gente na Praça de S. Pedro. Saber que nasceu em Chicago, nos EUA, que tem origem francesa e italiana da parte do pai e espanhola da parte da mãe, que era bispo no Peru, que gosta de conversar é tudo um bónus (e, como disse o jornalista mais desportivo aqui da casa, a escolha do nome pode ser um indício para o jogo de sábado).

Falou na "paz desarmada e desarmante", pediu ajuda para "construir pontes". Vai ter uma trabalheira tremenda, Deus o ajude.