Há uma explicação principal para que o regime de Maduro tenha resistido todo este tempo, apesar das pavorosas condições de vida que está a implicar para o povo: ofereceu a economia da Venezuela a um trio composto pelo exército, pela Rússia e pela China. Meses e até anos de relativa indiferença da opinião pública internacional perante a desgraça do populismo e da corrupção que caiu sobre o povo da Venezuela também contribuíram para a tragédia deste país.
Um dado que tem de ser ponderado quando se pensa na Venezuela: o subsolo venezuelano tem lá dentro as mais vastas reservas de petróleo no mundo, mais do que as reservas somadas da Rússia, dos Estados Unidos, do Kuwait, do Qatar e do México.
Apesar desta extraordinária riqueza em petróleo, a realidade atual da Venezuela é a de um país reduzido à fome, com o povo submetido a inflação galopante, como nunca antes se viu no mundo. E tudo aconteceu à vista de nós todos: a moeda venezuelana, o bolívar, desde 1990, caiu inacreditáveis 99,999997%! A inflação superou 1.300.000% e o FMI prevê que neste 2019 chegue aos 10.000.000%. O grau de pobreza extrema supera 60% da população, a que se juntam 26% de pobreza sistémica. Isto significa que oito em cada dez venezuelanos não recebe o necessário para consumir as básicas 2000 calorias por dia. Faltam alimentos, medicamentos, eletricidade e, às vezes, água potável. É uma calamidade.
Com o preço dos bens de consumo a duplicar em cada 20 dias, a ONU estima que, desde 2015, 3,5 milhões de venezuelanos deixaram o país.
A agonia venezuelana parecia condenada a perdurar. A oposição ao regime ia protestando, mas sem convencer. Subitamente, apareceu um nome e um rosto com audácia para lançar o desafio total a Maduro: Juan Guaidó, 35 anos, engenheiro civil, com a legitimidade de líder do parlamento eleito com ampla participação popular, começou por montar a organização de assembleias de moradores onde se discutiam saídas para a crise. Essas assembleias desaguaram numa enorme manifestação, na quarta-feira. Diante da multidão, Guaidó autoproclamou-se presidente em exercício, até à realização de eleições.
O medo, na Venezuela, passou a estar do lado de Maduro. Grande parte dos vizinhos latino-americanos e Donald Trump reconheceram, no mesmo dia, Guaidó como o interlocutor presidencial na Venezuela. Muito povo venezuelano, na rua, passou a ter esperança de saída do terrível impasse.
Surgiram, sobretudo na Europa, dúvidas sobre a solidez democrática da solução Gaidó. Mas a realidade mostra que a Venezuela tem um problema que se chama Maduro e Guaidó aparece do lado da procura de solução para proteger a dignidade de um povo que está em tremendo sofrimento.
Neste momento, na Venezuela, pela primeira vez, a oposição marca pontos e soma apoios contra o regime, mas este continua a ter o apoio do exército e Moscovo já sentenciou que não aceita qualquer manobra contra Maduro, por violar a legalidade internacional.
A crise venezuelana esboça uma espécie de regresso ao cenário da Guerra Fria. Desta vez, não se trata de democracias ocidentais frente aos regimes comunistas, mas de uma outra clivagem: democracias liberais de um lado, regimes autoritários do outro. Putin pode tentar na Venezuela o que tem feito com Bashar al-Assad na Síria, e assim prolongar a desgraça do povo venezuelano.
A Venezuela, neste momento, tem um presidente a mais. Maduro, pelo perfil de ditador, está a mais. Declarou-se vencedor de eleições, mas a legitimidade destas é contestada. Guaidó talvez seja uma solução, está a conseguir mobilizar muito povo, mas está por provar nas urnas.
A União Europeia, que tem estado tão em plano secundário em diferentes crises internacionais, desta vez apostou na intervenção diplomática que parece certeira: dá a Maduro um tempo, curtíssimo, até final desta semana, para convocar eleições com legalidade assegurada.
É uma esperança de resolução democrática da tragédia venezuelana. Mas, frente a essa esperança há muitos e inquietantes obstáculos, a começar por Putin.
A TER EM CONTA
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No parlamento britânico, esta terça-feira, têm lugar votações que tendem a tornar-se decisivas para definir o futuro da relação entre o Reino Unido e a União Europeia: Divórcio? Separação negociada? Algum tempo ainda para tentar ajeitar as coisas?
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