Perante o quase insignificante progresso na Conferência da ONU sobre o Clima (COP25), depois de Trump ter posto os EUA no mau lado de fora do compromisso, e com a China, após em 2015 ter mostrado boas intenções, agora a levantar o pé do pedal do empenho, tudo o que de bom fica destes dias em cimeiras para tratar a crise climática é o plano European Green Deal aprovado pela Comissão Europeia e que estimula confiança dos cidadãos na liderança de Ursula von der Leyen. Também há que contar com a força do despertar da opinião pública.
O mundo representado na COP25 gastou tanto tempo para quase nada. A conferência chegou ao fim com 42 horas de atraso, para inútil maratona de tentativas que incluíram 15 adiamentos. Os países mostraram-se na COP25 com muitas divergências entre eles, até sobre assuntos que já pareciam resolvidos. São discordâncias de pormenor técnico, com consequências políticas e sobretudo, malignas, direta ou indiretamente, para a vida de todos nós no planeta. De modo imediatamente mais inquietante para quem vive nas zonas mais vulneráveis, a UNICEF estima que 503 milhões de crianças vivem em zonas de alto risco de inundações por eventos meteorológicos extremos. Juntam-se 160 milhões em zonas críticas de seca.
As pífias conclusões da COP25 ficam a léguas dos constantes apelos dos jovens impulsionados por Greta, dos alertas reforçados dos cientistas e até do discurso dos diferentes governos que reconheceram a urgência climática.
Participaram nas discussões da COP25 governos de quase 200 países. Era uma oportunidade para fazer funcionar o multilateralismo. Faltou ambição e grandeza para o conseguir. Quem tem a responsabilidade por esta frustração são os grandes poluidores, todos com vistas curtas: Estados Unidos, China e Brasil, com o lóbi da energia fóssil.
O retrocesso chinês é um caso. Xi Jinping tinha sido aplaudido quando em 2015 se uniu a Barack Obama para tornar possível o acordo de Paris sobre o Clima. As palavras traduziram-se em ações: a China lançou o Green New Deal e aplicou-o desenvolvendo um colossal projeto de energia renovável. A China tornou-se primeira potência mundial em energia solar. Porém, a economia chinesa está em desaceleração e Pequim recuou nos apoios às energias renováveis e retomou a economia carbónica. Talvez com receio de, com a crise económica, os protestos de Hong Kong se propaguem às gigantescas cidades chinesas. Foi assim que a China se tornou uma força de frustração na conferência em Madrid.
Esta COP25 ficou-se pelas palavras. Fica o reconhecimento de que é necessária maior ambição para que seja concretizada a negociação no mercado de carbono, ou seja, os sistemas através dos quais são negociados entre países e empresas direitos de emissão de CO2, sem furar os limites. Falhou o consenso técnico e o político. Mas a ambição que deveria ter efeitos práticos em Madrid transita para a conferência do ano que vem.
A COP25 escapou ao desastre total porque se manteve e até fortaleceu a aliança entre os pequenos países insulares, os africanos, os latino-americanos e os europeus. A esperança agora, volta-se, uma vez mais, “para a conferência do ano que vem”, a COP26, marcada para Glasgow.
Há alguns motivos para alimentar essa esperança: a União Europeia está a cumprir as promessas climáticas e a reforçar a posição de locomotiva na ação; ao mesmo tempo, há o levantamento da opinião pública.
É o grande mérito de Greta Thunberg. Transformou o combate que iniciou quase solitária numa luta que está a mobilizar milhões de jovens por todo o mundo. A obsessão de Greta, de salvar a humanidade da crise climática, tornou-se o combate de milhões de jovens que vão necessariamente influenciar as escolhas dos políticos.
Fica para ser estudado o que é que tornou possível a uma adolescente com 16 anos conseguir a mobilização da sociedade que nem cientistas nem políticos tinham conseguido nas últimas décadas.
O otimismo, apesar dos débeis resultados da COP25, vem da força dos jovens que decidiram, de modo maciço, passar à ação.
A TER EM CONTA:
Chile: a grande fratura social.
Dez mudanças na cultura da última década.
Imagens de 2019. A escolha do The New York Times. E a escolha da The New Yorker.
(Artigo atualizado às 15h52 com as sugestões de imagens de 2019 do The New York Times também)
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