Foi com júbilo e gáudio, talvez até de lágrimas nos olhos, que li a sua última crónica no Observador, no qual é colega da já consagrada Joana Bento Rodrigues, nisto de escrever só com uma mão, deixando a outra livre para petiscarem hóstias ou se benzerem de cada vez que escrevem "igualdade de género" ou "direitos LGBTI".
A crónica chama-se "A confusão dos géneros" e começa com a preocupação do Gonçalo relativamente à sigla LGBT ser agora LGBTQIA+, relegando para o "+" as pessoas pansexuais, as poliamorosas e as zoófilas. Curioso o Gonçalo colocar a zoofilia ao nível das outras categorias. Talvez seja compreensível vindo de alguém que acredita na fábula da Arca de Noé, mas está na altura de as pessoas que pensam "ah, mas são tão liberais em relação ao sexo, tudo é tão normal, porque é que não pode ser com animais?" perceberem a diferença. Há uma palavra ligeiramente importante nas relações sexuais que as tornam automaticamente certas ou erradas: consentimento. Mas o consentimento sexual de seres indefesos também não é uma coisa que esteja no topo das preocupações da Igreja Católica.
O Gonçalo prossegue dizendo que "cada vez mais se ouve falar em direitos LGBT" e, portanto, "não podemos deixar de referir aqueles que estão na origem de tão nefasta ideologia". Isto é o equivalente de se dizer ali por volta de 1800, "cada vez mais se ouve falar que os pretos são seres humanos iguais aos brancos" e, portanto, "não podemos deixar de referir aqueles que estão por trás do nefasto abolicionismo".
Avança para uma das frases mais brilhantes que já li sobre o assunto: "Dentro do mundo LGBT, a atracção pelo mesmo sexo tem um lugar de destaque, dada a frequência com que ocorre". O Gonçalo está tão familiarizado com o conceito de LGBT que acha que na comunidade a atracção pelo mesmo sexo é só frequente. É como achar que o veganismo é comer sempre legumes, mesmo que o acompanhamento seja um naco da vazia ou um cardume de cavalas. Se calhar o Gonçalo acha que LGBT que dizer: Lésbicas, Gays e Bissexuais? Talvez.
No cerne da crónica, Gonçalo - que Deus Nosso Senhor tenha o seu cérebro - discorre sobre sobre o facto da homossexualidade ser uma desorientação sexual "que ocorre porque algo no desenvolvimento psico-afectivo falhou. Culpar o próprio de tal falha é talvez uma das maiores injustiças desde sempre cometidas contra estas pessoas, mas tal não nos pode levar a enaltecer uma falha como se de uma simples variante da sexualidade se tratasse". No fundo, o Gonçalo reaviva o conceito da homossexualidade ser uma doença, que eu pensava estar extinto ainda Jesus estava na puberdade a mudar de voz e a começar a descobrir o próprio corpo (só uns séculos mais tarde é que um Papa qualquer se deve ter lembrado que a masturbação também havia de ser pecado).
Gonçalo, eu entendo que não tenha capacidade para deixar de ver o mundo a preto e branco (vê-se noutra frase em que diz que a sexualidade é binária), mas não me parece bonito chamar "doença" à homossexualidade. Boa parte das crenças religiosas são bem mais estranhas e absurdas que a homossexualidade, e não é por isso que os ateus os tratam como doentes.
Vagueando por mais frases bizarras - muito ao estilo Pedro Arroja (a calhar, frequentam as mesmas missas) - chegamos à conclusão da crónica, que alerta para os perigos abjetos da "ideologia de género" que tem coisas tão aberrantes como "a dita acção para promover a igualdade de géneros e a sensibilização para as diferentes orientações sexuais, realizada recentemente numa escola".
Eu acredito realmente que uma pessoa, quanto mais homofóbica, mais homossexual reprimida é. Portanto, a todos os que assim se eventualmente enquadrem nisto, quando for o caso lá estarei no Trumps, um dia, para vos apoiar. Assim como continuarei sempre a advogar os direitos LGBTQRYSISB e de todas as letras que mais houver. Não é preciso pertencer activamente à comunidade para se defender uma coisa tão básica quanto os direitos humanos iguais para todos e liberdade sexual individual.
Um abraço,
Diogo Faro
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