Pouco mais de um mês depois de completar seis décadas, em 30 de outubro, Maradona morreu hoje na sua residência, na Argentina, anunciou o seu advogado e amigo, Matías Morla, segundo a agência espanhola EFE.
De acordo com a imprensa argentina, Maradona, que treinava os argentinos do Gimnasia de la Plata, sofreu uma paragem cardíaca na sua vivenda na província de Buenos Aires.
No início deste mês, o antigo futebolista deu entrada num hospital de Buenos Aires, anémico, desidratado e deprimido, e acabou por ser operado, com sucesso, a um hematoma subdural, que tinha sido detetado durante um 'check-up'.
A vida desportiva daquele a quem “os argentinos tudo perdoam”, nascido a 30 de outubro de 1960 num bairro pobre dos subúrbios de Buenos Aires chamado Villa Fiorito, iniciou-se aos nove anos, no Cebollitas, e prosseguiu aos 15 no Argentino Juniores.
Quatro anos passados, e já como campeão mundial de sub-20, título que conquistou no Japão, onde foi eleito o melhor da competição, Maradona juntou-se ao Boca Juniores, clube com o qual conquistou o seu primeiro cetro de campeão, em 1981.
Um ano depois, e após participação na primeira de quatro fases finais de um Mundial (Espanha1982), o jogador transferiu-se para o FC Barcelona, clube onde apenas venceu uma Taça do Rei, frente ao eterno rival, o Real Madrid.
Espanha marcou também a lesão mais grave na carreira do argentino. Uma fratura do tornozelo esquerdo, provocada pelo defesa Andoni Goikoetxea, do Atlético de Bilbau. Corria o ano de 1983 e a lesão afastou-o dos relvados durante mais de três meses.
Esta primeira etapa espanhola ficou também assinalada por uma hepatite, logo no ano da chegada à Catalunha, doença que o impediu de jogar por três meses.
Se a isso se juntar a expulsão no Brasil-Argentina, no Mundial82, a passagem pelos estádios espanhóis ficou aquém daquilo que se esperava da ‘estrela' argentina, que, em 1984, começou a ‘palmilhar' a ascensão ao topo do futebol mundial, ao assinar pelo Nápoles, clube que nunca tinha sido campeão em Itália. A sua apresentação no San Paolo é lendária.
A chegada de ‘El Pibe' catapultou os napolitanos para patamares nunca vistos e, depois de nas duas primeiras temporadas terem ficado em ‘branco', finalmente arrecadaram o ‘scudetto', em 1987, interrompendo o domínio dos clubes do norte de Itália.
Maradona voltaria a erguer o título de campeão transalpino em 1990, sendo que, pelo meio, arrecadou ainda uma Taça UEFA (1989), uma Taça de Itália (1987) e uma Supertaça italiana (1991), emergindo como um verdadeiro herói para o povo napolitano, que ainda hoje o venera acima de qualquer outro.
Antes da glória napolitana, já Maradona conseguira a maior proeza da carreira, ao carregar a seleção argentina até ao segundo título mundial (depois do Argentina1978), selado com um triunfo por 3-2 sobre a RFA na final do México1986.
A imagem de Maradona em ombros, com a taça de campeão do Mundo na mão, num relvado do Estádio Azteca invadido pelos adeptos, é das mais reconhecidas da história do futebol, num Mundial em que o ‘10’ viveu os melhores dias como futebolista.
Mais até do que o troféu conquistado, fica na memória de todos os amantes do futebol aquele que é considerado o melhor golo da história dos Mundiais, com Maradona a partir do seu meio-campo, com a bola ‘agarrada’ ao pé esquerdo, e a fintar todos os ingleses que lhe apareceram pela frente, até bater Peter Shilton.
Foi nos quartos de final, no triunfo por 2-1 sobre a Inglaterra, e aconteceu minutos depois do célebre episódio da ‘mão de Deus', lance assim definido pelo próprio ‘Pelusa', para justificar o golo marcado com a mão.
Nesse Mundial, ainda brilharia intensamente nas meias-finais, com dois golos ao guarda-redes belga Jean-Marie Pfaff, que o havia desafiado, para, na final, ser ‘anulado’ quase até ao final por uma marcação impiedosa: deram-lhe um espacinho, perto do final, e fez um maravilhoso passe para o 3-2 final de Burruchaga.
Quatro anos depois, de novo liderada por Maradona, a Argentina repetiu a final do Mundial (Itália1990), numa fase final marcada pelo embate das meias-finais, em que os sul-americanos defrontaram a superaram a seleção anfitriã no desempate por penáltis (4-3, depois de 1-1 nos 120 minutos).
O jogo foi em Nápoles, onde Maradona era um ‘Deus’, e, como tal, nas bancadas, o público dividiu-se, com os napolitanos incapazes de assobiar aquele que lhes dera tudo, em forma de dois títulos italianos que o clube jamais repetiu.
Os italianos acabaram, porém, por vingar-se de Maradona, quando este foi, com uma Argentina dizimada pelas ausências, tentar o ‘bis’ na final de Roma. Os alemães acabaram por desforrar-se, com a ajuda de um penálti de um penálti mais do que controverso assinalado pelo mexicano Edgardo Codesal.
Apesar da fase italiana ser a mais vitoriosa na sua carreira, foi também, para muitos, o período em se deixou enredar pelo consumo de droga (cocaína). Foi expulso do Nápoles, em 1991.
A saída de Itália levou-o de novo a Espanha, para uma época sem história no Sevilha (1992/93). Daí rumou à Argentina para jogar pelo Newell's Old Boys (1993/94), regressando ao Boca Juniores (1995/97), onde terminou a carreira, com 37 anos.
Pelo meio, ficou uma passagem efémera pelo Mundial1994, no Estados Unidos, onde Maradona, depois de brilhar intensamente num 4-0 à Grécia, teve um controlo antidoping positivo (efedrina). Isso valeu-lhe a expulsão da prova e posterior castigo de um ano, aplicado pela FIFA.
Ao longo da vida submeteu-se a vários tratamentos de desintoxicação de droga, o mais famoso dos quais, em 2000, quando passou uma temporada em Cuba, onde surgiu publicamente ao lado de Fidel Castro.
Maradona regressou aos palcos mediáticos ao assumir o comando técnico da seleção argentina (manteve uma permanente tensão com a imprensa), levando a equipa até aos quartos de final no Mundial2010, na África do Sul, eliminada pela Alemanha (4-0).
Após este desaire, e apesar do apoio dos adeptos argentinos, Dieguito, El Pibe de Oro, El Diez ou Pelusa - nomes pelos quais é carinhosamente tratado na Argentina - abandonou a seleção das Pampas.
Entre 2010 e 2012, e 2016 e 2018, o antigo internacional argentino treinou nos Emirados Árabes Unidos, primeiro o Al Wasl e, depois, o Al-Fujairah, antes de rumar ao México, para orientar o Dorados, em 2018/19, mas nunca alcançou nos bancos o brilhantismo que explanou durante duas décadas nos relvados.
Em 2019, voltou à Argentina, para assumir o comando do Gimnasia de la Plata, o último clube ao qual esteve ligado durante uma vida de glórias e excessos, e que hoje se ‘apagou', deixando para a eternidade a personalidade vincada, o ‘génio' futebolístico e o pé esquerdo mais decisivo de que há memória.
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