A transição de Gavin para Laurel, que durou 6 anos, permitiu que a atleta, aos 39 anos, fosse um dos 12 membros da equipa de halterofilia da Nova Zelândia. Com a luz verde do Comité Olímpico Internacional e da Federação Zelandesa de Halterofilismo, Laurel vai representar o seu país na categoria +90 quilos na competição que se realizará na Austrália, na Gold Coast, em mais uma edição dos jogos Commonwealth.
Esta não é a primeira vitória da atleta. Enquanto Gavin, isto é, enquanto homem, chegou a deter recorde nacional júnior do país, na categoria de + 105kg: ao ter levantado 300 kg. Porém, terminou em último quando participou na primeira e única prova masculina, com 20 anos.
Já em março deste ano tinha sido a primeira mulher transexual a ganhar uma competição feminina, conquistando a vitória no Torneio Aberto Internacional da Austrália ao levantar 268 quilos.
Um pai contra o casamento homossexual e uma comunidade desportiva dividida
Dick Hubbard, presidente da cidade de Auckland e pai de Laurel, assinou, com a sua esposa e outras pessoas influentes em termos locais, uma carta polémica onde se manifestava contra o casamento e adoção homossexual. 13 anos depois, viu a sua filha transexual a fazer história no desporto e no percurso LGBT.
Ainda assim, as intervenções familiares não são ímpares; Laurel tem recebido comentários céticos de toda a comunidade desportiva, mesmo que os seus níveis de testosterona tenham passado por todos os controlos da federação - as mulheres transexuais têm de ter níveis de testosterona abaixo de 10 nanômoles por litro para participar em competições desportivas.
O presidente da Federação Australiana de Halterofilismo, Michael Keelan, tem sido pouco coerente nas opiniões que partilhou acerca da atleta. Na sequência da vitória no Torneio Aberto, disse, citado pelo El Español: “Será interessante ver quanto apoio a Laurel tem da comunidade, mas acho que está em condições de fazer muita história. Poderá ser um excelente modelo para outros”. Contudo, após o mais recente apuramento, contradiz-se: “Se foi um homem, se levantou certos pesos e se de repente se converte numa mulher, psicologicamente sabe que já levantou esses pesos antes. Não acredito que a competição esteja nivelada e acho que esta é uma ideia partilhada por muita gente no desporto”.
A atleta Deborah Aason, natural da Austrália, que concorre na categoria de 75kg, acrescenta: “Se eu tivesse nessa categoria, não sentiria que fosse concorrer em condições iguais”.
Iuniarra Sipaia, que ficou em segundo lugar atrás de Laurel no Torneiro Aberto, também teceu comentários sobre a atleta: “Eu acho que foi injusto [perder] porque, no final de contas, ela ainda é um homem, embora já tenha tido uma cirurgia para mudar de sexo. Ela só mudou o seu aspeto físico: as suas emoções e a sua força continuam a ser de um homem. Todos sabemos que a força de uma mulher não é, de longe, a de um homem.”
"Se a atleta passa nos testes da federação, é porque deve participar na competição feminina", diz GRIT
Daniela Bento, responsável pelo Grupo de Reflexão e Intervenção Trans (GRIT) desde 2015, diz ao SAPO24 que os critérios das federações para aprovar um ou uma atleta transexual são ambíguos: “Ao longo dos anos, vimos os critérios olímpicos a serem atualizados. Neste caso, uma atleta trans quando toma bloqueadores de testosterona ou estrogénio perde massa muscular e por isso deixa de ser justo estar a competir na categoria em que estava. Se a atleta passa nos testes da federação, é porque deve participar na competição feminina. Ainda assim, os critérios não são rigorosos: por exemplo, uma mulher que tome testosterona para ganhar mais força e não para mudar de género deve continuar na categoria feminina? Os critérios não têm em atenção algumas especificidades, e perdem por isso”, observa a ativista.
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