“Esta é uma forma de estar, não são um ou dois casos isolados. Por ser precisamente uma postura recorrente e altamente censurável, que eu entendo não poder persistir, estou certo de que a FIFA já começou ou começará a curto e médio prazo a impor sanções disciplinares por forma a colocar termo a esta situação”, admitiu à agência Lusa Gonçalo Almeida, advogado e juiz da Câmara de Agentes do Tribunal de Futebol do organismo regulador mundial da modalidade.
De acordo com a última atualização da lista de clubes sujeitos a proibições de registo de novos jogadores, deu entrada na FIFA um recorde mundial de 30 processos contra os ‘axadrezados’ entre outubro de 2022 e julho de 2024, dos quais 19 vigoram por três períodos de inscrição e 11 têm duração ilimitada.
“É sempre concedido um prazo de 45 dias para que um clube proceda de forma voluntária ao cumprimento das suas obrigações para com outros emblemas, atletas ou treinadores, decorrentes de decisões emanadas pelo tribunal da FIFA. Se não o fizer, um impedimento de registos é aplicado findo esse prazo e decretado por três janelas de transferências. Caso o incumprimento continue a subsistir, cabe ao credor requerer a intervenção do Comité Disciplinar da FIFA, que poderá aplicar sanções mais graves”, enquadrou.
Gonçalo Almeida lembra o artigo 21.º do Código Disciplinar da FIFA, a partir do qual pode ser ordenada, no caso da SAD do Boavista, “uma dedução de pontos ou mesmo a despromoção de divisão”, além de “tornar o impedimento permanente até que a dívida seja liquidada”.
“Pese embora reconheça a inaplicabilidade ao caso concreto, há situações de gravidade tal que podem culminar na expulsão de clubes de competições em curso ou futuras, nos termos do artigo 6.º do Código Disciplinar da FIFA”, acrescentou.
Em 29 de agosto, o presidente da Boavista SAD, o senegalês Fary Faye, tinha confirmado a impossibilidade de serem desbloqueadas as restrições até ao final do mercado de verão, que encerrou na segunda-feira para os clubes portugueses, devido a uma penhora excecional validada no período de férias judiciais.
“É uma situação absolutamente inadmissível. Percebe-se facilmente que isto é um comportamento reiterado e um ‘modus operandi’ da SAD no que toca aos seus compromissos contratuais. Sem sombra de dúvidas, essa reincidência atua como uma agravante que, em termos das sanções que venham a ser implementadas à posteriori pelo Comité Disciplinar da FIFA, adivinha uma maior gravidade das mesmas”, advertiu Gonçalo Almeida.
No início de julho, “assente na forte convicção de que ia resolver” as restrições em tempo útil, o Boavista tinha oficializado as chegadas do médio internacional nigeriano Ibrahim Alhassan, proveniente em final de contrato dos belgas do Beerschot, e do dianteiro brasileiro Bruninho, emprestado pelo Atlético Mineiro.
Os dois reforços foram utilizados em vários jogos de pré-época, mas nunca puderam competir oficialmente e desvincularam-se no domingo, face à impossibilidade de inscrição de novos futebolistas até, no mínimo, janeiro de 2025 por parte do 11.º classificado da I Liga, com quatro pontos, em outras tantas jornadas.
Bruninho rumou aos ucranianos do Karpaty por cedência do Atlético Mineiro, enquanto Ibrahim Alhassan juntou-se ao Leixões, quarto do escalão secundário, deixando o plantel orientado pelo italiano Cristiano Bacci limitado a 23 jogadores, dos quais 12 têm idade igual ou inferior a 21 anos.
“O principal obstáculo para a resolução desta situação é que, à medida que se vão avolumando os credores, mais difícil se torna chegar a um acordo de pagamento faseado com todos, pois basta um credor não aceitar para que o impedimento se mantenha. É com algum pessimismo que analiso esta situação, salvo se houver um investimento na SAD para liquidar estas dívidas específicas”, avaliou Gonçalo Almeida.
Dos 30 impedimentos em vigor, 25 foram desencadeados no duplo mandato de Vítor Murta, que atualmente lidera o clube, mas esteve à frente da SAD entre 2020 e maio, fase na qual o controlo maioritário da SAD passou a ser assumido pelo investidor hispano-luxemburguês Gérard Lopez, recentemente visado pela despromoção administrativa do segundo ao quarto escalão e consequente risco de insolvência do Bordéus, seis vezes campeão francês, do qual é proprietário desde 2021.
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