“O país deve e tem condições para produzir mais e produzir em função das nossas necessidades e não a partir de uma agenda de alguém no plano internacional que decide o que produzimos com a nossa terra e com os nossos meios”, afirmou.
Paulo Raimundo propôs uma política agrícola que “enfrente a situação que está à vista de todos, mas parece que alguns querem esconder ou adornar”, referindo-se à “grave situação de emergência nacional de brutal dependência alimentar”.
O dirigente do PCP discursava no encerramento de uma sessão pública organizada pelo partido sobre os 50 anos da Reforma Agrária, no Teatro Garcia de Resende, em Évora, a qual contou com intervenções de figuras que participaram naquele processo.
Considerando que, naquele tempo, a Reforma Agrária deu resposta aos problemas da produção e emprego, o secretário-geral do PCP assinalou que, tal como naquele tempo, nos dias de hoje “é urgente e possível uma outra política agrícola”.
“No programa do nosso partido, consta a necessidade de realizar uma reforma agrária”, frisou, explicando que a política agrícola que o PCP propõe “admite espaço para a agricultura familiar, a pequena e média agricultura e até a de grande dimensão”.
Segundo Paulo Raimundo, a proposta dos comunistas “inclui os agricultores individuais, sociedades agrícolas, cooperativismo e o associativismo agrícola”, assim como “a propriedade privada, a propriedade coletiva e comunitária, e a propriedade pública”.
“Mas não deixamos de defender, firmemente, uma intervenção coletiva, a partir da participação popular ou do poder do Estado, que afirme a consignação da terra a quem a trabalha e que assegure um adequado planeamento”, avisou.
O líder comunista disse querer uma política agrícola que fixe populações, assegure a gestão pública da água para o setor e o crédito necessário aos investimentos, e intervenha nos mercados para garantir escoamento de produções e preços justos.
Observando que a situação de agora é diferente da que existia em 1974, Paulo Raimundo aludiu à albufeira de Alqueva, no Alentejo, que “introduziu novos elementos e a disponibilidade desse outro elemento essencial à produção, a água”.
“O capitalismo agrário tem um crescimento exponencial a partir de apoios milionários que são entregues ao grande agronegócio, a produção acelera a partir do recurso a mão-de-obra em regime de quase escravatura e aumenta a produtividade e os lucros com a sobreexploração da terra e a utilização sistemática de pesticidas”, criticou.
Raimundo notou que são “caminhos que servem uns poucos” e que estão “assentes no aumento da exploração e de opções erradas que esgotam solos, condicionam produções e impedem o rumo soberano do país”.
Num discurso de cerca de 25 minutos, o dirigente do PCP abordou ainda o surgimento da Reforma Agrária, as melhorias que considera terem existido no país naquele tempo e o processo que levou ao seu fim.
“A Reforma Agrária não falhou. A Reforma Agrária foi destruída, pela ação direta da contrarrevolução para reconstituir o latifúndio e abrir portas ao capitalismo agrário”, vincou, apontando culpas ao PS, PSD, CDS e outras forças.
Paulo Raimundo escusou-se a prestar declarações aos jornalistas no final da sessão.
O que aconteceu na Reforma Agrária?
O movimento de ocupação de propriedades agrícolas nos campos do sul de Portugal, depois do 25 de Abril, proporcionou uma rotura em torno da propriedade da terra. Os trabalhadores rurais organizados em cooperativas ou "Unidades Colectivas de Produção (UCP)" tomaram a seu cargo o poder de largos hectares que utilizaram para produção agrícola. Esta foi uma das profundas mudanças que Portugal viveu a partir de 1974 e que se prolongaria por alguns anos.
Entre março e novembro de 1975, mais de um milhão de hectares foram ocupados e constituíram-se cerca de 500 propriedades coletivas dirigidas por trabalhadores rurais.
Com apoios estatais, de sindicatos e partidos políticos, principalmente do PCP, este movimento de Reforma Agrária avançou apoiando-se basicamente nos trabalhadores rurais eventuais.
A "revolução" nos campos começa a mudar em 1977, quando o parlamento aprova a "Lei Barreto", de António Barreto, então ministro da Agricultura do I Governo Constitucional, liderado por Mário Soares (PS)
O diploma impôs limites à Reforma Agrária, abriu portas ao fim das UCP e a um longo processo de desocupações e devoluções de terras e indemnizações, que ganhou fôlego, posteriormente, com os governos da Aliança Democrática (AD).
O processo de regularização do uso da terra expropriada ou nacionalizada no âmbito da Reforma Agrária só foi concluído em 2000, pelo então ministro da Agricultura Capoulas Santos (PS).
*Com Lusa
Comentários