Todos os programas propostos pelos partidos para os médicos e para o próprio Serviço Nacional de Saúde (SNS) foram analisados pelos clínicos, nomeadamente pela Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública. Em conversa com o SAPO24, sobre este tema, a Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública (ANMSP) valorizou algumas ideias, mas diz que, resumidamente, vão "pouco além do que têm sido as propostas realizadas ao longo das várias eleições legislativas".

A associação pede, por isso mesmo, mais a todos os partidos e pede também que as forças políticas vão aos detalhes neste tipo de matéria.

"Tivemos o cuidado de apreciar os programas eleitorais dos partidos atualmente com assento parlamentar, tendo feito questão de partilhar as suas prioridades com estes mesmos partidos." E não há dúvidas quanto à conclusão,  "observa-se uma intenção transversal aos vários partidos políticos de priorizar atividades de promoção da saúde e prevenção da doença e valorização da Saúde Pública. No entanto, há uma variabilidade entre os partidos na forma como estas propostas são concretizadas, sendo que na maioria carece de detalhe, indo pouco além do que têm sido as propostas realizadas ao longo das várias eleições legislativas", começou por dizer João Paulo Magalhães, Vice-Presidente da ANMSP, destacando, ainda assim alguns "pontos positivos".

As propostas dos partidos para as Legislativas

Alternativa Democrática (AD)

  • Atualização salarial até 2027, em média, de cerca de 10,8%, dos quais 6.6% são por força do aumento previsto para a Administração Pública e apenas 4,2% por concessão específica aos médicos, ou seja, um aumento médio de 1.4% por ano.
  • Abertura de 350 vagas anuais para assistente graduado sénior para um universo de mais de 6 mil assistentes graduados.
  • Alargamento do regime de dedicação plena, sem revisão do retrocesso laborais, aos médicos da emergência pré-hospitalar, civis do hospital das Forças Armadas, estabelecimentos prisionais e cuidados paliativos.
  • Contratar médicos aposentados para os CSP.
  • Aumentar as USF modelo C, recuperação e alargamento das parcerias público-privadas (PPP) e entrega da gestão de hospitais públicos a misericórdias.
  • Integração e reforço da rede de Cuidados Continuados e Paliativos.
  • Investimento em transformação digital e transformação do modelo de financiamento para “Saúde Baseada em Valor”.

Bloco de Esquerda (BE)

  • Aumento de remuneração-base, com majoração salarial em 20%.
  • Criação de um regime de exclusividade com majoração salarial de 40% e de pontos para progressão.
  • Redução para 12 horas do horário semanal de urgência exigido aos médicos.
  • Aumento do orçamento do SNS em percentagem do PIB.
  • Garantir uma equipa de saúde familiar para todas as pessoas.
  • Medicamentos gratuitos para pessoas com rendimento inferior ao salário mínimo nacional.
  • Equipas de saúde familiar com estabelecimento de um enfermeiro e técnicos auxiliares nas equipas de saúde.
  • Reversão das PPP, com revogação da legislação que permite novas parcerias público-privadas no SNS.

Coligação Democrática Unitária (CDU)

  • Instituir a opção de dedicação exclusiva dos médicos e enfermeiros, com majoração de 50% da remuneração base e acréscimo de 25% na contagem do tempo de serviço para progressão na carreira.
  • Apoio às despesas com habitação para profissionais em zonas carenciadas.
  • Reforço da despesa pública em saúde a reverter para o SNS o financiamento que vai para os grupos privados.
  • Garantia de médico e enfermeiro de família para todos os cidadãos.
  • Gratuidade de medicamentos para >65 anos, doentes crónicos ou em situações de insuficiência económica.
  • Revogar os processos de criação de novas parcerias público privadas, de USF modelo C e outras medidas de privatização dos cuidados primários de saúde.
  • Investimento na saúde materna e infantil, na saúde mental e na remoção dos obstáculos à concretização do direito à Interrupção Voluntária da Gravidez, a pedido das mulheres.

"A referência clara à criação de linhas de financiamento concretas pela AD e a atribuição de verbas em percentagem do Orçamento de Estado pelo PS. Adicionalmente, o Livre propõe o alinhamento com as prioridades do Plano Nacional de Saúde 2030, o que vai de encontro à proposta da Direção da ANMSP", salienta, pedindo uma maior "valorização do papel da Saúde Pública nas ULS".

"Observa-se uma intenção transversal aos vários partidos políticos de priorizar atividades de promoção da saúde e prevenção da doença e valorização da Saúde Pública."João Paulo Magalhães, Vice-Presidente da ANMSP

Depois de ler os programas partidários, a Direção da ANMSP encontrou "referências são genéricas". João Paulo Magalhães defende um caminho mais direcionado na defesa da "organização dos serviços de Saúde Pública, serviços esses em que se revela urgente a necessidade de melhores instrumentos de gestão e tecnologia, nomeadamente a criação de um Sistema de Informação e de um modelo de contratualização que leve em conta as evoluções organizativas das Unidades Locais de Saúde (ULS)". Até porque, identifica, "as aprendizagens da resposta à pandemia de COVID-19 e os desafios emergentes que podem ameaçar a saúde dos Portugueses. Impõe-se, ainda, melhorar o modelo de governação da Saúde Pública, através da clarificação das funções dos seus interlocutores, incluindo o papel das Autoridades de Saúde, e na sua relação comunitária, em particular com os municípios"

Manifestação de médicos em Lisboa
Manifestação de médicos em Lisboa créditos: Lusa

No que às especificidades diz respeito, não tem dúvidas, "há uma ausência de propostas concretas sobre políticas de saúde dirigidas à prevenção e mitigação dos consumos de tabaco, álcool e alimentos ultraprocessados", refere.

O aumento de médicos de família é um tema específico na área da saúde que há muito é debatido, mas que não tem tido solução prática. Os médicos têm algumas propostas que partilham com os partidos.

"Os incentivos monetários e não monetários concretos e alinhados com as expectativas dos profissionais de saúde, em particular com os Médicos de Família e os Médicos de Saúde Pública, são a pedra angular para conseguir reter e fixar no Serviço Nacional de Saúde. Adicionalmente, reforçar estes incentivos nas áreas mais carenciadas e apostar em medidas ajustadas por tipo de especialidade médica de acordo com a dimensão das listas de espera são propostas a considerar", diz o Vice-Presidente da ANMSP.

"Há uma ausência de propostas concretas sobre políticas de saúde dirigidas à prevenção e mitigação dos consumos de tabaco, álcool e alimentos ultraprocessados"

No que diz respeito aos tempos de espera, têm sido várias as promessas feitas pelos partidos no poder e também por aqueles que fazem a oposição. Os médicos, esses, têm algumas propostas, que também elas poderão passar por um maior investimento, nomeadamente incentivos para com os clínicos portugueses.

"Todas as medidas de resolução dos Tempos Mínimos de Reposta Garantida que têm por base uma cooperação com o setor privado e social parecem não estar a ter o resultado esperado, pelo que deve ser equacionado o modelo de incentivos, por exemplo, tendo em conta fatores geográficos, padrões de procura de serviços, e modelos de financiamento, e o refinamento dos mecanismos destas propostas de forma a atingir os objetivos esperados", refere.

Propostas dos partidos para a Saúde
Propostas dos partidos para a Saúde
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As condições financeiras dos médicos são também referidas como necessárias para segurar a fixação de clínicos que partem para o estrangeiro à procura de melhores condições de vida.

Médicos fixam-se em Vila Real e ganham tempo para a família
Médicos fixam-se em Vila Real e ganham tempo para a família créditos: Lusa

Partido Socialista (PS)

  • Incentivar a exclusividade ao SNS, assegurando a devida valorização das carreiras e a especialização clínica funcional.
  • Integração do internato na carreira médica.
  • Atribuição de incentivos especiais a quem trabalhe em territórios menos atrativos, com apoios ao alojamento e às famílias.
  • Abertura anual obrigatória de vagas para os concursos médicos para consultor e assistente graduado sénior, com simplificação do processo, com conclusão obrigatória em 6 meses.
  • Reforçar a autonomia dos Conselhos de Administração hospitalares e das unidades de proximidade, promovendo maior articulação entre os diferentes níveis de cuidados.
  • Promoção das USF B sem exclusão de protocolos com outros, e diversificação da oferta saúde oral, visual, pediatria, terapia da fala, psicologia clínica, saúde mental e nutrição.
  • Construção ou modernização de 100 unidades de cuidados de saúde primários até 2026 e construção de novas unidades hospitalares em várias regiões do país.
  • Implementação de uma lei de emergência em saúde pública, promoção do princípio da “Saúde em Todas as Políticas” e reforço da articulação entre setores relevantes.

Pessoas, Animais e Natureza (PAN)

  • Atribuição da profissão de risco e de desgaste rápido, aposentação aos 36 anos de serviço ou aos 62 anos de idade.
  • Aumento faseado de 30% nos salários, e criação de incentivos para fixação de médicos e enfermeiros em áreas carenciadas.
  • Investimento no digital e nas teleconsultas, integração dos sistemas informáticos dos cuidados de saúde primários e hospitalares com os das farmácias comunitárias, e contratação de profissionais da nutrição.
  • Impulsionar a literacia em saúde preventiva nos canais de comunicação institucionais de todas as salas de atendimento, reforçar a capacitação de todos os profissionais em saúde preventiva, e priorizar um modelo médico assente na prestação de serviços e respostas adaptadas a cada pessoa.
  • Criar um fundo de investimento para startups que trabalhem na área da saúde, promover a investigação e desenvolvimento na área da inteligência artificial e da ciência de dados e reforçar as competências de acompanhamento nos hospitais.

"A atração e fixação requer um investimento nos Médicos de Saúde Pública, em particular na melhoria das suas condições de trabalho, não só através da qualidade dos serviços, mas também das suas condições remuneratórias e de progressão na carreira. Estas melhorias incluem, também, a revisão do atual modelo de avaliação de desempenho que se encontra desatualizado à realizada da prática destes médicos. Revela-se, também, necessário clarificar o enquadramento estatutário da sua carreira, para que possam exercer as suas funções em qualquer nível do sistema de saúde. Ainda que alguns partidos façam referência a estas necessidades nos seus programas eleitorais, carecem de medidas específicas", conclui.

As próximas eleições para a Assembleia da República 2025 realizam-se no próximo domingo, a 18 de maio. A campanha eleitoral teve início no dia 4 de maio, e decorre até 16 de maio.