“A expectativa era que, numa fase posterior, se houvesse dinheiro, avançar para as segundas habitações”, disse Jorge Fernandes, funcionário do Município de Figueiró dos Vinhos, ao coletivo de juízes do Tribunal Judicial de Leiria, em mais uma sessão do julgamento, que decorre na Batalha.
Segundo a testemunha, “houve sempre essa convicção", mas "até agora ainda não se chegou a essa fase”, porque ainda não se conseguiu resolver todas as primeiras habitações.
O Revita é o fundo de apoio às populações e à revitalização das áreas afetadas pelos incêndios de junho de 2017, agregando a recolha de donativos em dinheiro, em espécie de bens móveis ou em serviços, segundo o seu ‘site’.
A sua Comissão Técnica visa garantir a uniformidade e equidade na atribuição dos apoios, bem como a correta execução dos mesmos. Já o Conselho de Gestão gere o fundo.
De acordo com a testemunha, “ainda não foi gasto o dinheiro todo” do fundo, havendo “um milhão e pouco”.
Questionado se em algum momento foi considerada a recuperação de habitações não permanentes, Jorge Fernandes respondeu negativamente, garantindo que na Comissão Técnica do Fundo Revita não foram avaliadas segundas habitações.
A testemunha assegurou que no concelho de Figueiró dos Vinhos não foram reconstruídas segundas habitações através do fundo.
“Se não conhecêssemos, pedíamos uma declaração à junta de freguesia para atestar se era habitação permanente ou através de outras vias, para termos a máxima certeza possível”, declarou.
De acordo com o funcionário, os lesados dirigiam-se ao município ou os técnicos da autarquia iam a casa das pessoas, sendo que após uma “primeira triagem pelos técnicos da câmara”, os processos eram “submetidos à CCDRC [Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro] que verificava se estavam bem instruídos”.
“Depois, reunia a Comissão Técnica (…) e se a CCDRC dissesse que o processo estava bem instruído, ia para o Conselho de Gestão”, adiantou, salientando que “a CCDRC fazia uma inspeção ao processo”.
Segundo a testemunha, no concelho de Figueiró dos Vinhos arderam 30 primeiras habitações, tendo sido 18 apoiadas pelo Fundo Revita. A reconstrução das restantes foi assegurada por outras entidades, estando ainda uma em execução, esclareceu à Lusa.
Na sessão, e à pergunta se tem conhecimento de alguma casa de primeira habitação que não tenha sido reconstruída em Figueiró dos Vinhos, Jorge Fernandes disse que não.
Já sobre o número de casas de segunda habitação que foram excluídas, o funcionário municipal apontou que “dois ou três processos” foram recusados, mas o número de segundas habitações danificadas é superior.
À pergunta em que é que se baseava o Município de Figueiró dos Vinhos para excluir imediatamente as habitações não permanentes, o membro da Comissão Técnica do Revita alegou que “tem a ver com a definição da prioridade”.
“A indicação que nos era dada era que eram as permanentes, por isso é que excluíamos as outras”, disse.
O julgamento das alegadas irregularidades no processo de reconstrução das casas que arderam no incêndio de junho de 2017 no concelho de Pedrógão Grande e que alastrou a municípios vizinhos tem 28 arguidos.
O presidente da Câmara de Pedrógão Grande, Valdemar Alves, e o ex-vereador deste município Bruno Gomes estão entre os arguidos. Estão pronunciados por 20 crimes de prevaricação de titular de cargo político, 20 crimes de falsificação de documento e 20 crimes de burla qualificada, os mesmos do despacho de acusação.
Este incêndio provocou 66 mortos e 253 feridos, tendo destruído cerca de 500 casas, 261 das quais habitações permanentes, e 50 empresas.
Na sessão de hoje estava prevista a audição, na qualidade de testemunhas, dos presidentes das câmaras de Castanheira de Pera e Figueiró dos Vinhos, Alda Carvalho e Jorge Abreu, respetivamente, mas tal não ocorreu porque ambos estão em isolamento profilático na sequência da pandemia de covid-19.
Uma outra testemunha, Rui Alves, membro da Comissão Técnica designado pelo Município de Castanheira de Pera, também não foi hoje ouvido porque uma familiar próxima ia ser testada ao novo coronavírus.
A presidente do coletivo de juízes, Cristiana Almeida, deu ainda conta de que a Assembleia da República autorizou o depoimento do deputado João Marques, ex-presidente da Câmara de Pedrógão Grande.
O julgamento prossegue à tarde.
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