O trágico episódio de 18 de maio de 1996, no Estádio Nacional, em Oeiras, deixou o então Presidente da República, Jorge Sampaio, “incomodadíssimo”, conta em declarações à agência Lusa Pedro Reis, então responsável pela preparação das deslocações do Chefe de Estado, essa incluída.

Rui Mendes, adepto do Sporting, foi atingido por um very light disparado pelo apoiante do Benfica Hugo Inácio, da bancada sul para a norte, ou seja, de um lado ao outro do recinto, “da direita para a esquerda, para quem, como eu, estava na Tribuna”, lembrou.

A tradicional deslocação de um Presidente da República à final da prova ‘rainha’ do futebol nacional conferiu, no encontro decisivo da 56.ª edição, um papel de decisor em vez do habitual protagonismo da entrega da taça ao vencedor e do reconhecimento aos vencidos.

Pedro Reis diz ter sido avisado pelo ajudante de campo da Presidência da República, um militar do exército, que terá visto passar um “foguete”.

Esse momento ocorreu pouco depois de o argentino Mauro Airez ter dado vantagem ao Benfica, logo aos nove minutos do encontro que o Benfica iria vencer por 3-1.

O “foguete” era, na verdade, um very light, uma arma, semelhante a uma pistola, que dispara um projétil de sinalização, que acabaria por vitimar Rui Mendes, aos 36 anos.

Apesar de o incidente ter aberto uma ‘clareira’ na repleta bancada ‘verde e branca’, a notícia da morte do adepto ‘leonino’ chegou primeiro à Tribuna Presidencial, onde o então primeiro-ministro, António Guterres, expressou imediatamente a vontade de sair e se deslocar ao Hospital São Francisco Xavier, em Lisboa, para onde tinha sido transportado Rui Mendes.

Aos 36 minutos do encontro, a RTP, que transmitia o encontro, dava conta da morte, enquanto os adeptos do Sporting gritavam: “assassinos, assassinos”.

Foi durante o intervalo do jogo, quando o Benfica já vencia por 2-0, que ocorreu uma reunião de emergência sobre o desfecho do encontro, com os comandantes da polícia, o primeiro-ministro, o presidente da Federação Portuguesa de Futebol, Gilberto Madail, e os presidentes dos clubes, José Roquette e Manuel Damásio.

“Discutiu-se se o jogo continuaria ou terminaria ali, com uma punição ao Benfica e a vitória do Sporting, que era a hipótese mais defendida. O Presidente Jorge Sampaio estava incomodadíssimo e admitimos que qualquer decisão podia ser tomada, mas que devíamos ter em conta a posição da polícia. E entendeu-se que seria mais seguro concluir o jogo, não entregar o troféu, retirar imediatamente os adeptos do Benfica e atrasar, em meia hora ou 40 minutos, a saída dos adeptos do Sporting, para nem terem hipótese de se cruzarem”, descreveu.

O assessor admite “ter sido mais ponderado deixar o jogo chegar ao fim”, para transtorno do então Presidente da República.

Ainda no recinto, durante a segunda parte, Jorge Sampaio falou aos jornalistas, num “momento de consternação e de luto”, justificando a decisão e apelando à calma dos espetadores.

“Pedimos a todos os espetadores, qualquer que seja a sua filiação clubística, para que o evento termine de uma forma digna, de uma forma calma, e que as pessoas possam sair daqui em segurança. A taça vai ser entregue numa cerimónia posterior e nós ficamos até ao fim porque pensamos que devemos ser o penhor do rigor, da calma e da segurança”, referiu, então, Jorge Sampaio.

Já nesta declaração, notoriamente emocionado, o Chefe de Estado clamava por justiça.

“As investigações vão encetar-se, para apurar as causas do falecimento da pessoa em causa, e esperamos que a serenidade volte aos campos de futebol. O futebol é um momento de alegria e não pode ser um momento de tristeza. É preciso que os portugueses hoje assumam o recolhimento necessário e se partilhe a vitória com a derrota, com a serenidade e a paz que o país exige numa manifestação desportiva”, vincou o então Presidente da República.

Quase 29 anos depois, Pedro Reis confirmou o estado de espírito de Jorge Sampaio, em contraste com que tinha visto antes de se deslocar para o recinto.

“O Presidente repetia que era a festa do futebol, que tinha visto todos os adeptos a festejarem durante a manhã e que se perdia assim uma vida, nestas circunstâncias, com um ato criminoso. Estava mesmo muito incomodado. Saímos do estádio e fomos para o hospital, onde o primeiro-ministro, que também levou algumas pessoas, contactou a viúva, combinando que, depois, passaria o telefone ao Presidente, que só me perguntava o que se diria, num momento destes: ‘Um jovem vem para Lisboa, para uma festa e morre assim’, lamentava”, recordou o assessor.

A revolta de Jorge Sampaio, um apaixonado pelo golfe e pelo futebol, e também pelo “seu” Sporting, era percetível e, depois do telefonema, insistia: “isto não pode ficar assim, o futebol não é isto e este tipo de pessoas não podem continuar a ir ao futebol”.

O Benfica conquistou essa Taça de Portugal, ao vencer o rival Sporting por 3-1, com um golo de Mauro Airez e dois de João Vieira Pinto, antes de Carlos Xavier reduzir para os ‘leões’, aos 83 minutos, quando já muitos adeptos ‘verde e brancos’ abandonavam as bancadas.

O troféu seria entregue uma semana mais tarde, num particular frente ao Vitória de Guimarães (1-0), no antigo Estádio da Luz, sem as habituais honras presidenciais.

Final do very light devia ter parado

“As recordações são as piores e, por mais que queiramos apagar do pensamento, nunca vamos esquecê-las. O que foi inadmissível nesse dia é que o jogo continuou. Tínhamos acabado de assistir a uma morte no estádio. Independentemente do clube do adepto em causa, a final tinha de acabar ali, mas isso não aconteceu”, criticou à agência Lusa o ex-médio, de 63 anos, que alinhou pelos ‘leões’ em dois períodos (1980-1991 e 1994-1996).

Em 18 de maio de 1996, sob arbitragem de Vítor Pereira, o Benfica ganhou por 3-1, com golos do argentino Mauro Airez (nove minutos) e do capitão João Vieira Pinto (39 e 67), sendo que o suplente Carlos Xavier reduziu de penálti (83), num lance em que o defesa central brasileiro Ricardo Gomes foi expulso com duplo cartão amarelo nos ‘encarnados’.

“O Benfica começou melhor e nós entrámos taticamente mal. Demorámos a fazer ajustes e, quando reagimos, já era tarde. Foi o meu último jogo oficial e não pensaria terminar a carreira daquela maneira”, admitiu Carlos Xavier, vencedor de seis troféus pelo Sporting, incluindo duas Taças de Portugal (1981/82 e 1994/95), por entre 334 partidas e 23 golos.

A superioridade do Benfica no relvado passaria para segundo plano antes do apito final, por causa da morte do adepto ‘leonino’ Rui Mendes, que foi atingido na bancada norte do Estádio Nacional, em Oeiras, por um foguete very light disparado a partir do topo sul por Hugo Inácio, homólogo ‘encarnado’, por ocasião dos festejos do tento inaugural de Mauro Airez.

“Estava no banco e ouvi o barulho de um foguete a passar. Foi tão rápido que nem vi a direção, mas pensávamos que iria para o ar ou coisa assim. De repente, olhámos para a esquerda, estava um burburinho na bancada do Sporting e percebemos que tinha havido um acidente grave. No final, aconteceu o impensável”, rememorou o antigo internacional português, aposta na derradeira meia hora do então treinador ‘leonino’ Octávio Machado.

Usado como sinal de emergência ou para iluminação temporária, o artefacto pirotécnico sobrevoou o terreno de jogo a baixa altura e alojou-se no tórax da vítima, que tinha 36 anos, era pedreiro de profissão e vinha da Mealhada, tendo morrido quase de imediato.

“Sinceramente, não me apercebi de que tivesse havido alguma conversa entre capitães, treinadores ou presidentes para ser tomada alguma medida. Na altura, deviam ter dado a partida como suspensa e retomá-la mais tarde. Mas lá está, é o futebol que temos. Eu já cheguei a ir jogar a Chaves por dois minutos [precisamente na época 1995/96], porque faltou luz [nos holofotes do estádio]. É impensável. O que aconteceu foi ridículo”, frisou.

Apesar dos pedidos de socorro nas hostes ‘verde e brancas’, com a multidão a rodear o corpo de Rui Mendes, posteriormente transportado para o hospital, e de uma reunião de emergência entre o então Presidente da República, Jorge Sampaio, e o primeiro-ministro António Guterres, a final da 56.ª edição da Taça decorreria sem paragens naquela tarde de sábado.

“Era complicado estar ao mesmo tempo com a cabeça no jogo e na bancada. Depois de sabermos das notícias, ficámos todos transtornados e tristes pela perda de um sócio do Sporting. Se fosse com um associado do Benfica, era igual. Eu acho que não há motivo algum para se continuar a jogar futebol depois de um acontecimento daqueles”, insistiu.

Carlos Xavier não esteve no funeral, que foi custeado pelo Sporting, mas vinca que Rui Mendes “não sai do pensamento” do universo ‘leonino’ e espera que o futebol português tenha aprendido, mesmo que os artefactos pirotécnicos continuem a entrar nos recintos.

“Obviamente, o Benfica nunca estaria de acordo com aquilo nem creio que seja isso que faça ferver mais um dérbi. As alturas são diferentes, tal como as pessoas que lideram os clubes. Foi o momento mais negro dos dérbis, mas não acredito que se repetirá ou que tenha contribuído para um afastamento muito grande entre Benfica e Sporting”, assumiu.

Passados 29 anos, e numa fase em que seguem em igualdade pontual na liderança da I Liga a quatro jornadas do fim, com supremacia ‘verde e branca’ no confronto direto e na diferença de golos, os rivais vão encontrar-se numa final da Taça de Portugal pela nona ocasião em 25 de maio, após seis triunfos ‘encarnados’ e dois dos campeões nacionais.

“Espero que seja um jogo agradável e que as pessoas que paguem o bilhete sintam que, no final, valeu a pena. Acima de tudo, que seja um jogo correto, sem casos e com muito ‘fair play’, o que é mais difícil nestes dias. Que se respeitem uns aos outros, que entrem apenas para jogar futebol, que ganhe o melhor e que o melhor seja o Sporting”, desejou.

Benfica teve glória sem festa no Jamor

O Benfica saboreou uma “festa sem glória” na Taça de Portugal em 1995/96, admite o ex-futebolista Mauro Airez, cujo golo inaugural precedeu a morte de um adepto do Sporting, atingido com um very light disparado por um apoiante ‘encarnado’.

“Durante bastante tempo, o que aconteceu ofuscou um bocado a importância que podiam ter dado nos títulos dos jornais à superioridade do Benfica. Falou-se imenso do incidente, que não ficou por ali, visto que teve seguimento [nos tribunais]. Não digo que a vitória do Benfica tenha passado ao esquecimento, porque uma pessoa até vai ao museu e vê lá o troféu, mas, inevitavelmente, falariam mais dessa situação”, referiu à agência Lusa o ex-avançado internacional argentino, de 56 anos, que jogou nas ‘águias’ entre 1996 e 1997.

Em 18 de maio de 1996, sob arbitragem de Vítor Pereira, o Benfica ganhou por 3-1, com golos de Mauro Airez (nove minutos) e do capitão João Vieira Pinto (39 e 67), enquanto o suplente Carlos Xavier reduziu de penálti para os ‘leões’ (83), num lance em que o defesa central brasileiro Ricardo Gomes foi expulso com duplo cartão amarelo nos ‘encarnados’.

“Olhei para o Sporting e via-se nos rostos dos seus jogadores uma equipa muito nervosa, que não estava focada no início do jogo. Disse ao João Vieira Pinto que iríamos ganhar. Tivemos a sorte de marcar dois golos na primeira parte, mas, tirando os últimos minutos, fomos superiores. Sentíamos a importância desse encontro, que culminava uma época atribulada e tornou-a menos má. Estávamos a melhorar, mas ficámos bem longe do que podíamos ter alcançado”, frisou o reforço contratado ao Belenenses quatro meses antes.

A superioridade do Benfica no relvado passaria para segundo plano antes do apito final, por causa da morte do adepto ‘leonino’ Rui Mendes, que foi atingido na bancada norte do Estádio Nacional, em Oeiras, por um foguete very light disparado a partir do topo sul por Hugo Inácio, homólogo ‘encarnado’, por ocasião dos festejos do tento inaugural de Mauro Airez.

“Estávamos muito concentrados e não nos apercebemos de nada nessa altura. Sentimos é que passou uma coisa similar de bancada a bancada no aquecimento, mas que bateu nas árvores. Ouvia-se como se fosse um foguete a passar, uma coisa muito leve”, notou.

Usado como sinal de emergência ou para iluminação temporária, o artefacto pirotécnico sobrevoou o terreno de jogo a baixa altura e alojou-se no tórax da vítima, logo após Mauro Airez ter adiantado o Benfica e festejado com o seu célebre mortal, aproveitando as defesas imperfeitas do guarda-redes ‘leonino’ Costinha aos remates de Calado e Ricardo Gomes.

“Não andei muito bem durante algum tempo, porque pensava que se não tivesse feito o festejo… Celebrei uns metros para o lado esquerdo da baliza do Sporting, perto da zona onde o adepto morreu. Era como se fosse um sentimento de culpa inevitável”, assumiu.

Apesar dos pedidos de socorro nas hostes ‘verde e brancas’, com a multidão a rodear o corpo de Rui Mendes, posteriormente transportado para o hospital, e de uma reunião de emergência entre o então Presidente da República, Jorge Sampaio, e o primeiro-ministro António Guterres, a final da 56.ª edição da Taça decorreria sem paragens naquela tarde.

“Continuamos muito focados até ao intervalo. Acho que fui o primeiro da nossa equipa a aperceber-se de que tinha acontecido algo grave. Quando saio [do relvado] e começo a correr no túnel, pois era um dia de muito calor e eu estava cheio de sede, encontrei uma ambulância que ia a sair do estádio e quase me atropelou. Ao regressar para a segunda parte, viu-se que havia um clarão enorme na bancada e manchas de sangue”, recordou.

O Benfica recebeu o troféu uma semana mais tarde, ao defrontar o Vitória de Guimarães num particular no antigo Estádio da Luz (1-0), mas “a festa não foi a mesma” para Mauro Airez, convicto de que “algo assim não acontecia hoje” e levaria à suspensão imediata do jogo.

“Com estes acontecimentos, a segurança tinha de crescer. Há partidas de alto risco, mas não acontecem só em Portugal e eu sou de um país em que o alto risco significa mesmo isso. [A organização logística] Está bem melhor. A rivalidade existe há muitos anos e vai perdurar. Às vezes, pode haver cânticos que ferem e não deviam ser entoados, mas não há ambientes perfeitos no futebol. Se houver, deve ser no Principado do Mónaco”, atirou.

Passados 29 anos, e numa fase em que seguem em igualdade pontual na liderança da I Liga a quatro jornadas do fim, com supremacia ‘verde e branca’ no confronto direto e na diferença de golos, os rivais vão encontrar-se numa final da Taça de Portugal pela nona ocasião em 25 de maio, após seis triunfos ‘encarnados’ e dois dos campeões nacionais.

“Essa memória virá ao de cima, porque se vai falar no assunto e é inevitável. Se as duas equipas chegarem no seu pleno, sem muitas lesões e focadas, haverá um grande jogo. Ambas estão muito equiparadas. Até a própria arbitragem terá muito peso e um jogo de grande pressão por tudo o que tem acontecido desde o início do campeonato”, pressagiou.

Dérbi lisboeta decide troféu 29 anos depois da final do very light

Benfica e Sporting reencontram-se na final da Taça de Portugal de futebol em 25 de maio, 29 anos depois do triunfo ‘encarnado’ em 1995/96, quando um adepto ‘leonino’ morreu, atingido com um very light disparado por um apoiante rival.

Se o recordista de troféus superou nas ‘meias’ o Tirsense, do Campeonato de Portugal, quarto escalão luso, o campeão nacional eliminou o também primodivisionário Rio Ave.

Os rivais lisboetas irão discutir o troféu pela nona vez, numa altura em que seguem em igualdade pontual no topo da I Liga a quatro jornadas do fim, após os triunfos dos ‘leões’ em 1970/71 e 1973/74 e das ‘águias’ em 1951/52, 1954/55, 1969/70, 1971/72, 1986/87 e 1995/96, o último com a festa transformada em tragédia fora das quatro linhas no Jamor.

Em 18 de maio de 1996, sob arbitragem de Vítor Pereira, o Benfica ganhou por 3-1, com golos do argentino Mauro Airez (nove minutos) e do capitão João Vieira Pinto (39 e 67), sendo que o suplente Carlos Xavier reduziu de penálti (83), num lance em que o defesa central brasileiro Ricardo Gomes foi expulso com duplo cartão amarelo nos ‘encarnados’.

A equipa orientada por Mário Wilson erguia a 23.ª das 26 Taças de Portugal do seu historial, após o segundo lugar no campeonato, atrás do FC Porto, que alcançou o segundo dos cinco títulos do inédito ‘penta’ e já havia perdido por 3-0 com o Sporting, terceiro colocado, na finalíssima da Supertaça Cândido de Oliveira, em Paris.

A superioridade do Benfica no relvado passaria para segundo plano antes do apito final, por causa da morte do adepto ‘leonino’ Rui Mendes, que foi atingido na bancada norte do Estádio Nacional, em Oeiras, por um foguete very light disparado a partir do topo sul por Hugo Inácio, homólogo ‘encarnado’, por ocasião dos festejos do tento inaugural de Mauro Airez.

Usado como sinal de emergência ou para iluminação temporária, o artefacto pirotécnico sobrevoou o terreno de jogo a baixa altura e alojou-se no tórax da vítima, que tinha 36 anos, era pedreiro de profissão e vinha da Mealhada, tendo morrido quase de imediato.

Apesar dos pedidos de socorro nas hostes ‘verde e brancas’, com a multidão a rodear o corpo de Rui Mendes, posteriormente transportado para o hospital, e de uma reunião de emergência entre o então Presidente da República, Jorge Sampaio, e o primeiro-ministro António Guterres, a final da 56.ª edição da Taça decorreria sem paragens naquela tarde.

Se muitos adeptos do Sporting foram deixando o recinto no primeiro tempo, o apito final precipitaria a festa do Benfica, que recebeu o troféu uma semana depois, ao defrontar o Vitória de Guimarães num particular no antigo Estádio da Luz (1-0), numa altura em que as autoridades já analisavam as imagens das câmaras na zona de disparo do very light.

Residente na Amadora e com antecedentes criminais, Hugo Inácio, de 22 anos, acabaria por ser detido na zona de Cascais em julho e foi a julgamento com mais 13 arguidos, acusados de venda e posse de arma proibida e com ligações aos No Name Boys, grupo organizado de adeptos associado ao Benfica, mas sem reconhecimento oficial do clube.

Ao responder pelos crimes de homicídio com dolo eventual, posse e uso de substâncias explosivas e utilização de documentação alheia, admitiu ter sido o autor do disparo, mas garantiu que a sua única intenção era festejar o golo de Airez, alegando que não estava sóbrio e foi empurrado por alguém da claque, o que terá alterado a trajetória do foguete.

A negligência grosseira custaria a Hugo Inácio quatro anos de prisão efetiva em fevereiro de 1997, com os outros arguidos absolvidos, num julgamento repetido precisamente um ano depois por ordem do Supremo Tribunal de Justiça, face a insuficiência da matéria de facto, dando provimento ao recurso do Ministério Público, defensor de penas mais duras.

Ao não ser provado o dolo eventual, Inácio enfrentou a mesma sanção e teve um cúmulo jurídico com outra por tráfico de droga, que elevaria a condenação para cinco anos, dos quais havia cumprido um ano e meio na cadeia do Linhó, em Sintra, de onde fugiu após uma saída precária, em 2000, quando lhe faltavam 15 meses e seis dias de pena efetiva.

Recapturado 11 anos depois, voltou a ser punido em 2012, desta vez com 18 meses de prisão e dois anos de interdição de recintos desportivos, por agredir e injuriar um polícia.

Em 2016, a posse de material pirotécnico acarretaria mais três anos de cadeia e sete de proibição de entrada em espaços desportivos, punição desobedecida em 2018 por Hugo Inácio, detido no Estádio da Luz antes de um jogo entre Benfica e Desportivo de Chaves.

Independentemente do teor da sentença, o julgamento expôs as falhas de segurança no Estádio Nacional, onde o autor do disparo entrou incólume e nunca foi intercetado pela posse ilícita de material pirotécnico, tendo o Conselho de Disciplina (CD) da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) decretado a interdição do Estádio da Luz por três partidas.

Se as medidas de controlo da violência no panorama desportivo foram aperfeiçoadas, a família de Rui Mendes não se conformou e submeteu um processo cível contra a FPF e Hugo Inácio, condenados em 2001 a indemnizá-la em 30.030 contos (sensivelmente 150 mil euros), numa sanção agravada três anos mais tarde para 47.000 (cerca de 235.000).

Antes de o tribunal dar como provada a responsabilidade da FPF no caso, “por omissão de diligências preventivas para evitar atos violentos”, o organismo e o Governo apoiaram os familiares e o Sporting custeou o funeral do malogrado associado, que é evocado em Alvalade, mas também visado por adeptos ‘encarnados’ com silvos alusivos a very lights.

*Por Ricardo Tavares Ferreira, da agência Lusa