No dia 21 de julho, na mais recente “vaga” migratória em direção às costas portuguesas, chegaram à ilha do Farol, perto de Olhão, 21 jovens, todos homens e indocumentados e que referiram ser de nacionalidade marroquina.
Após deporem perante o Tribunal judicial de Faro, foram transferidos para a prisão do Linhó (concelho de Cascais) onde aguardam os “trâmites do processo de afastamento” que lhes for instaurado. A maioria deverá ser extraditada para Marrocos, de onde partiram.
Nos últimos oito meses, entraram no Algarve 69 homens provenientes do Norte de África, mas apenas um garantiu o estatuto de refugiado. Os restantes não pediram asilo ou foi-lhe recusado esse estatuto, e pelo menos 13 fugiram.
Para as autoridades portuguesas, não se trata de uma nova rota migratória, e este fenómeno está longe de ser comparado com as chegadas a Espanha, Itália ou Grécia em 2020.
Pelo contrário, o Governo afirma-se empenhado em negociar com Marrocos um mecanismo de migração legal, com medidas que facilitem a procura de emprego a cidadãos marroquinos.
Assim, na passada quarta-feira, o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, manteve uma reunião em videoconferência com o seu homólogo marroquino, em que a chegada ao Algarve nos últimos meses de migrantes vindos do país do Magrebe também foi abordada.
De acordo com o comunicado oficial, foi sublinhada a necessidade de manter e intensificar a cooperação no domínio da prevenção e da luta contra a imigração clandestina e o tráfico de seres humanos, quer a nível bilateral – através de uma coordenação reforçada entre o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e o seu correspondente marroquino – como no âmbito das relações entre Marrocos e a União Europeia.
Nesse sentido, foram também discutidas a “importância e interesse mútuo da conclusão das negociações em curso para um acordo sobre imigração legal entre Portugal e Marrocos”.
Em 22 de julho, o ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros português, Augusto Santos Silva, garantia que o executivo está a seguir “com muita atenção” os vários episódios migrantes que têm desembarcado no Algarve nos últimos tempos, e também se pronunciou pela perspetiva de uma migração legal.
O ministro considerou a migração legal como a “verdadeira alternativa às migrações irregulares e a toda a sorte de tráfico que se alimenta delas e as fomenta”, em linha com a política que vem adotando, e recusou que o país esteja incluído numa nova rota.
No início de 2020, e durante a sua vista a Marrocos, Santos Silva tinha já proposto a este país um texto de acordo de migração laboral, que Marrocos está a analisar.
“Acertei com o meu colega marroquino que faríamos avançar as negociações para um acordo relativo à migração legal”, disse na ocasião.
Mas reconheceu que a pandemia de covid-19 tornou os processos negociais mais lentos.
“Temos usado todos os mecanismos ao nosso dispor para trabalhar com as autoridades marroquinas, através designadamente dos respetivos embaixadores para que possamos chegar tão depressa quanto possível a um acordo”, disse.
Numa referência ao quinto e último grupo de 21 migrantes que desembarcaram no Algarve, Eduardo Cabrita, também já tinha previamente rejeitado a eventualidade de uma nova rota de imigração.
"Nós tivemos 48 chegadas com 7.700 em Espanha. Não é desvalorizar, mas temos de ter a medida da dimensão do que estamos a falar", disse em 23 de julho quando questionado pelos jornalistas sobre a chegada dos migrantes irregulares à costa algarvia.
"Estamos a avaliar a situação em diálogo direto com as autoridades marroquinas, tendo consciência que isto não altera em nada a nossa abordagem global sobre os fenómenos migratórios que devem ser legais e ordenados", acrescentou, frisando que Lisboa apresentou um plano para fluxos legais e ordenados com vários Estados.
No entanto, em 22 de julho, o sindicato que representa os inspetores do SEF considerou estar demonstrada e existência de uma rota de imigração ilegal para o Algarve, e que Portugal funciona sobretudo como uma porta de entrada para Europa.
“As evidências não se negam e há aqui uma realidade. Há uma rota e nós somos um destino”, disse à agência Lusa o presidente do sindicato, Acácio Pereira, após a chegada dos últimos 21 migrantes oriundos de Marrocos.
“As coisas devem ser assumidas e tratadas devidamente, esta é a única forma de as resolver”, disse, sublinhando que, “enquanto que Espanha já tem com Marrocos acordos de readmissão e de retorno”, Portugal ainda está em negociações para um acordo de imigração ilegal com aquele país.
Acácio Pereira considerou que “estas questões já deviam estar resolvidas há muito tempo”, revelou que o Sistema Integrado de Vigilância e Comando e Controlo (SIVIC) “nunca funcionou” e "nunca conseguiu" detetar as cinco embarcações que chegaram à costa algarvia, e lamentou que o país não possua “único centro de instalação temporária” para migrantes enquanto se aguarda a conclusão do processo.
A Organização Internacional para as Migrações (OIM) também já admitiu a possibilidade de uma nova rota, mas fez também depender a sua evolução das reações e decisões das autoridades de Portugal e de Marrocos.
Em paralelo, e numa medida anunciada em 30 de julho, a Marinha Portuguesa anunciou o reforço da vigilância na costa sul do país com uma lancha de fiscalização rápida e uma corveta, com o objetivo de “aumentar a capacidade de deteção, localização, identificação e de reação atempada, tendo sempre em vista a preservação da segurança marítima e a salvaguarda da vida humana no mar”, de acordo com o comunicado então divulgado.
Apesar de Marinha Portuguesa não se ter pronunciado sobre a eventual existência de uma nova rota migratória com destino ao Algarve, o chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas de Portugal, almirante Silva Ribeiro, alertou no início de julho para os desafios e problemas colocados pelas “migrações irregulares para a Europa, onde não será de negligenciar o possível surgimento de uma nova rota de Marrocos com o Algarve”.
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