Num hotel de Díli, Marcelo Rebelo de Sousa transmitiu aos jornalistas o seu “balanço positivo” desta visita de três dias em que representou o Estado português e a União Europeia nas cerimónias de posse do novo Presidente timorense, José Ramos-Horta, e nas comemorações dos 20 anos da restauração da independência de Timor-Leste.
“Dececionado, nada. Surpreendido para melhor, em praticamente tudo”, declarou, dando como exemplos a “maior presença da língua e da cultura portuguesas” neste país, “o funcionamento do sistema escolar” e “o sentido cívico da mudança” na chefia do Estado timorense, após uma eleição em que Ramos-Horta venceu o Presidente em exercício, Francisco Guterres Lú-Olo.
O Presidente da República referiu que, um dia depois de tomar posse, Ramos-Horta escolheu Francisco Guterres para fazer a leitura da declaração da independência e observou que “isto não é o habitual por esse mundo fora, o que há menos é democracias e o que há mais é ditaduras”.
Sobre as suas expectativas em relação a Timor-Leste, onde nunca tinha estado, Marcelo Rebelo de Sousa revelou que veio com ”um temor de que estivessem muito vivas as feridas da competição recente”, mas isso “não se encontrou”.
“Tinha dúvidas sobre os sinais de algum movimento económico, e começa a haver uns sinais, depois da pandemia e da quebra que teve no turismo, da vontade de reiniciar a atividade económica. Em todos os setores que pude contactar, os meus medos ou as minhas dúvidas sobre Timor foram dissipadas”, acrescentou.
O chefe de Estado realçou que Ramos-Horta aceitou o seu convite para realizar, “por altura da Web Summit, uma visita longa de Estado a Portugal”, e quer estabelecer uma “parceria com Portugal naquilo que considera um novo ciclo da economia timorense”.
Feito o balanço da visita, Marcelo Rebelo de Sousa foi questionado sobre a sua experiência de nadar na costa norte de Timor-Leste — sem comunicação social, mas rodeado de pessoas que partilharam o momento nas redes sociais – e se não receou encontrar crocodilos no mar.
“Isso é uma fábula”, respondeu.
O Presidente da República contou que quando estava na praia “apareceu o único português que foi mordido” por um crocodilo nestas águas “e foi mordido não porque estivesse a nadar, mas porque fazia pesca submarina, portanto, em condições muito especiais e em águas especiais, com uma certa profundidade, correu esse risco”.
“Quem quiser vir a Timor e nadar na zona balnear tradicional não há risco rigorosamente nenhum de ser mordido por um jacaré ou crocodilo. É uma fábula”, afirmou.
Marcelo identifica "um bastião" geopolítico com "recuperação do português"
Em resposta a perguntas dos jornalistas, o chefe de Estado foi desafiado a explicar aos portugueses a importância desta sua primeira visita oficial à República Democrática de Timor-Leste, e invocou "razões do passado" e "razões do futuro".
Quanto ao futuro, argumentou que há "uma posição estratégica de Timor que é fundamental", tendo em conta a região em que se insere.
"Nessa zona Ásia-Pacífico, onde muito da geopolítica do presente e do futuro se joga, há um bastião chamado Timor, que pertence à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP)", afirmou, acrescentando: "Pode ser uma base económica muito importante para Portugal numa área onde não temos outra base".
Marcelo Rebelo de Sousa referiu que Timor-Leste é um país "que quer estreitar laços com Portugal, que alinha as suas posições na CPLP com Portugal, que é de uma lealdade total nas posições conjuntas".
Timor-Leste, prosseguiu, "tem um Presidente [José Ramos-Horta] com um raríssimo prestígio internacional, tem um líder histórico carismático [Xanana Gusmão] com um raríssimo prestígio político e internacional – são mais valias para Timor, mas para Portugal".
"Some-se tudo isso, os portugueses perceberão que tem futuro. Quanto ao passado, isso percebem, porque ainda hoje não esquecem o que Timor significou como uma causa comum", defendeu.
Segundo o Presidente da República, Portugal e Timor-Leste viveram "uma resistência conjunta contra uma dominação estrangeira que não houve em nenhuma outra descolonização" e "não há a mesma unanimidade em nenhum outro caso desse tempo histórico".
Sobre as línguas faladas pelos timorenses, interrogado se o desconhecimento do português não constitui um fator de exclusão social, o chefe de Estado respondeu que ficou com a impressão de que "se fala mais português, há maior presença da língua portuguesa"
"Há projetos específicos para várias áreas de poder: Administração Pública, poder judicial, poder político, atividade empresarial", assinalou.
No seu entender, "é uma revolução silenciosa que está a ocorrer", após "vários ciclos" linguísticos em Timor-Leste: "Um ciclo antigo em que havia ainda o português presente, depois um ciclo de avanço da Indonésia, e não só, da Malásia, vários avanços".
"E agora há um ciclo de recuperação do português, com peso da comunicação social, os jornalistas a falarem, a utilizarem o português, e a aproximarem o tétum do português", sustentou, concluindo: "Está a mudar no bom sentido".
Nesta sua primeira visita oficial à República Democrática de Timor-Leste, centrada na capital, Díli, Marcelo Rebelo de Sousa esteve acompanhado pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho.
O programa do chefe de Estado começou na quinta-feira e terminou hoje com um encontro com a comunidade portuguesa. A partida para Lisboa está prevista para domingo de manhã em Díli, ainda madrugada em Lisboa, onde são menos oito horas.
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