O presidente da República promulgou esta segunda-feira a nova lei para a saúde mental. O decreto revoga a lei de saúde mental de 1998 e altera a legislação conexa, o Código Penal, o Código da Execução das Penas e o Código Civil.
Contudo, Marcelo Rebelo de Sousa não deixou de apontar algumas preocupações ao diploma, como a "falta de densificação de alguns conceitos e figuras jurídicas”.
O chefe de Estado espera que "este quadro normativo contribua para uma melhoria na salvaguarda de direitos e na prestação de cuidados de saúde às pessoas com necessidades de cuidados de saúde mental, nomeadamente no que refere à existência de estruturas de apoio aos referidos doentes em todas as circunstâncias", diz em nota publicada no portal da Presidência da República.
O que muda?
A presente lei, prestes a ser revogada, "estabelece os princípios gerais da política de saúde mental e regula o internamento compulsivo dos portadores de anomalia psíquica, designadamente das pessoas com doença mental".
O novo diploma visa os direitos e deveres das pessoas com necessidade de cuidados de saúde mental e regula as restrições destes direitos e as garantias de proteção da liberdade e da autonomia destas pessoas. Deste modo, a proposta de lei inova na terminologia ao abandonar expressões como “anomalia psíquica” e “internamento compulsivo”, recusando a categorização da “pessoa com doença mental”, e optando por referir o termo “pessoa com necessidades de cuidados de saúde mental”.
Em outubro, Manuel Pizarro disse que “a proposta de lei acentua a nossa visão humanista, enquanto vertente indispensável de cuidados de saúde de excelência, conferindo centralidade aos conceitos de autonomia, dignidade, participação, oportunidade e recuperação”, salientou.
Com esse pressuposto, o novo diploma acaba com a prisão por tempo indeterminado de pessoas consideradas inimputáveis.
Ou seja, vai deixar de ser possível renovar automaticamente as penas de prisão a pessoas com problemas de saúde mental. Quando terminam de cumprir a pena, independentemente de constituírem perigo ou não, terão de ser libertadas.
Contudo, nos casos de risco comprovados para a própria ou para terceiros, se precisar de tratamento, será submetida a cuidados de saúde mental. A pessoa com necessidade de cuidados indica os tratamentos que aceita receber. Se não aceitar, esse tratamento poderá ser sujeito a internamento por ordem judicial.
No caso de internamento, é reduzida para um ano a periodicidade da revisão de cada caso.
A nova lei visa, assim, proteger a liberdade e autonomia das pessoas com necessidades de cuidados de saúde mental.
As preocupações do presidente (e da oposição)
A proposta de lei apresentada pelo governo, foi aprovada na Assembleia da República em votação final global, em 26 de maio, com votos a favor de PS e PCP, votos contra de PSD e Chega e abstenções de Iniciativa Liberal, Bloco de Espera, PAN e Livre.
Os votos contra justificaram-se, na altura, pela falta de condições quanto ao acompanhamento desses doentes. A deputada do PSD, Sara Madruga da Costa, levantou receio de estes doentes serem deixados à sua sorte, quando forem libertados, referiu, no jornal Público. No mesmo jornal, foi ainda sublinhado o apelo do presidente do Supremo Tribunal de Justiça que pediu mais meios físicos e profissionais para acompanhar este tipo de processos.
Preocupação também partilhada pelo Bloco de Esquerda que viu chumbados todos os pedidos de mais meios técnicos, humanos e financeiros para essas pessoas.
Para tranquilizar, Manuel Pizarro vem, em outubro, responder a essas preocupações com o anuncio de um investimento de 88 milhões para reformar todo o processo da saúde mental, até 2026. O ministro da Saúde prometeu a construção de “quatro novas unidades de internamento em hospitais gerais e serão eliminados os internamentos de doentes agudos em hospitais psiquiátricos”. E, “nos cuidados continuados, serão criados até 1500 lugares, estando prevista a criação de 15 centros de responsabilidade integrada e a requalificação de instalações de 20 entidades dos serviços locais de saúde mental”, continuou o ministro no parlamento.
"Serão criadas 40 novas equipas de saúde comunitária e mais respostas residenciais na comunidade", com o objetivo de desinstitucionalizar este tipo de cuidados, prometeu.
A promessa, feita em outubro com um apertado calendário de três anos de execução, está dada e o presidente, mesmo com a ressalva, fez avançar o decreto que segue agora publicação em Diário da República.
*com Lusa
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