Na cerimónia de atribuição do título de doutor honoris causa pela Universidade de Lisboa a Leonor Beleza, o Presidente da República elogiou o seu percurso "num Portugal tão arredio de caminhos fulminantemente ascensionais de mulheres no espaço público", observando: "País ainda tão misógino, tão avesso a essas e outras mudanças de cultura cívica".
Marcelo Rebelo de Sousa fez o elogio a Leonor Beleza nesta cerimónia, realizada na Reitoria da Universidade de Lisboa, apontando a conselheira de Estado como "uma das melhores de Portugal", e defendeu que o seu doutoramento honoris causa "é um ato natural" e "mais ainda: óbvio".
O Presidente da República descreveu Leonor Beleza como "académica nata" e "constante lutadora" pela igualdade entre homens e mulheres e comparou-a a "um vulcão contido, que só não foi mais longe em todas as vertentes da sua vida porque chegou quase sempre antes do tempo numa sociedade que prefere esperar para ver antes de viver".
"Invulgar no caráter fortíssimo, duríssimo até, daqueles que Sá de Miranda gostava de invocar de antes quebrar do que torcer. Invulgar na personalidade, concebida e formada para mandar, aprendendo porém no correr dos anos a mandar ouvindo o essencial e precavendo-se contra as armadilhas com que o destino vai burilando os criadores de história", disse, elogiando-a também pela inteligência, pedagogia, "doação comunitária" e "visão de futuro".
O chefe de Estado referiu que Leonor Beleza foi "governante em vários ciclos e ingratas tarefas" – secretária de Estado da Presidência do Conselho de Ministros e da Segurança Social e ministra da Saúde – "numa época em que se contavam por dedos das mãos as mulheres no topo dos poderes públicos".
A antiga deputada e dirigente do PSD foi uma "isenta e respeitada senadora partidária em ensejos cruciais", acrescentou, considerando "que bem poderia ter sido uma das primeiras mulheres presidentes da República portuguesa".
À saída da Reitoria, em resposta a questões dos jornalistas, Marcelo Rebelo de Sousa reafirmou que Leonor Beleza poderia ter sido "uma das primeiras mulheres" na Presidência da República, juntamente com "outros nomes, como, por exemplo, a [antiga primeira-ministra] engenheira Maria de Lourdes Pintasilgo".
No seu entender, "ela poderia ter seguido uma carreira ascendente, com passagem pela liderança de Governo ou sem passagem, era um nome possível de uma área política para num determinado momento vir a ser uma candidata plausível e Presidente da República mulher", mas "optou por outro caminho, é legítimo".
Interrogado se isso poderia ter acontecido nas eleições presidenciais de 2016, em que foi eleito pela primeira vez, o Presidente da República respondeu: "Eu não sei bem localizar na data, mas houve ali um período longo em que teria podido ser".
Antes, na sua intervenção, Marcelo Rebelo de Sousa afirmou que está pessoalmente ligado, "há 55 anos", a Leonor Beleza, de quem foi colega, por uma "fraternal cumplicidade" e "uma profunda admiração".
Segundo o chefe de Estado, foi uma "aluna brilhante na Faculdade de Direito" e depois "docente respeitada e seguida com desvelo e militância – em disciplinas várias delas com traços de rutura na viragem para a democracia, como o Direito da Família ou o Direito das Sucessões".
O Presidente da República, professor catedrático de direito jubilado, enalteceu ainda o modo como Leonor Beleza exerceu o cargo de presidente do Conselho Geral da Universidade de Lisboa, as suas prestações no Conselho de Estado e a "raríssima projeção universal" da Fundação Champalimaud a que preside.
No início do seu discurso, Marcelo Rebelo de Sousa quis deixar "uma primeira palavra prévia de impressiva lembrança e gratidão para com o doutor honoris causa desta universidade, depois de ter sido seu aluno e líder estudantil, Presidente Jorge Sampaio", que morreu há uma semana, aos 81 anos.
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