“Os sinais que me chegam, mas como disse acabei de chegar a Portugal, são de que não há razão para nem a economia nesses setores, nem os trabalhadores, nem os que têm a ver com as empresas, fornecedores ou clientes, estarem preocupados com isso”, afirmou Marcelo Rebelo de Sousa à RTP, quando questionado se estaria preocupado com consequências para as empresas e para os trabalhadores da venda de participações de Isabel dos Santos em diversas empresas portuguesas que tem vindo a ser divulgada nos últimos dias.
Interrogado sobre um efeito “bola de neve” nas empresas e na credibilidade de Portugal no exterior, o chefe de Estado, respondeu: “Não, porque, note, são empresas, como é público e notório, têm condições de eventualmente haver interessados, se for caso disso, na aquisição de posições acionistas. Por isso, esse problema não se vai colocar, tal a importância dessas empresas nos setores e para a economia portuguesa”.
Marcelo Rebelo de Sousa, recém-chegado de uma visita a Israel, que falava à RTP a propósito dos quatro anos da sua eleição que hoje se assinala, começou por dizer que é necessário “distinguir duas realidades”.
“A prioridade é aquilo que é a colaboração ao nível judicial que possa existir entre autoridades angolanas e portuguesas e isso tem a ver com uma investigação agora ou desencadeada ou aparentemente acelerada, e veremos como é a evolução no futuro”, disse.
“Outra coisa é a situação das empresas, e em relação à situação das empresas penso que há uma preocupação muito clara de garantir a sua estabilidade (…). Algumas são em setores importantes da economia portuguesa, ou no domínio da energia ou no domínio do sistema financeiro, no domínio da indústria”, acrescentou.
O Consórcio Internacional de Jornalismo de Investigação revelou no domingo mais de 715 mil ficheiros, sob o nome de ‘Luanda Leaks’, que detalham esquemas financeiros de Isabel dos Santos e do marido, Sindika Dokolo, que terão permitido retirar dinheiro do erário público angolano, utilizando paraísos fiscais.
Isabel dos Santos disse estar a ser vítima de um ataque político e sustentou que as alegações feitas contra si são “completamente infundadas”, prometendo recorrer à justiça.
Na quarta-feira, a Procuradoria-Geral da República angolana anunciou que Isabel dos Santos foi constituída arguida num processo em que é acusada de má gestão e desvio de fundos da companhia petrolífera estatal Sonangol e que visa também portugueses alegadamente facilitadores dos negócios da filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos.
Mário Leite da Silva (CEO da Fidequity, empresa com sede em Lisboa detida por Isabel dos Santos e o seu marido), e Paula Oliveira foram constituídos arguidos em Angola e, na quinta-feira, renunciaram aos cargos de administradores não executivos da operadora de telecomunicações NOS. Mário Leite da Silva deixou também a presidência do conselho de administração do Banco de Fomento Angola (BFA).
Além destes, o Ministério Público angolano implicou também Sarju Raikundalia (ex-administrador financeiro da Sonangol) e Nuno Ribeiro da Cunha (diretor de private banking do EuroBic e gestor de conta da Sonangol), encontrado morto na sua residência em Lisboa, na quarta-feira à noite.
De acordo com a investigação do consórcio, do qual fazem parte o Expresso e a SIC, Isabel dos Santos terá montado um esquema de ocultação que lhe permitiu desviar mais de 100 milhões de dólares (90 milhões de euros) para uma empresa sediada no Dubai e que tinha como única acionista declarada Paula Oliveira.
A investigação revela ainda que, em menos de 24 horas, a conta da Sonangol no EuroBic Lisboa, banco de que Isabel dos Santos é a principal acionista, foi esvaziada e ficou com saldo negativo no dia seguinte à demissão da empresária da petrolífera angolana. O EuroBic já anunciou que a empresária vai abandonar a estrutura acionista.
Na segunda-feira, a consultora PricewaterhouseCoopers (PwC) e o EuroBic anunciaram o corte de relações contratuais ou comerciais com empresas controladas por Isabel dos Santos, enquanto a Sonae disse estar a acompanhar a situação com preocupação, devido à alusão à NOS, controlada pela ZOPT, da qual é acionista, tal como Isabel dos Santos.
O Banco de Portugal disse que retirará as devidas consequências de informação recebida do EuroBic, e a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários indicou que já avançou com ações de supervisão concretas.
Comentários