Devastado por décadas de guerra, o Iraque continua a ser palco de atentados do grupo extremista Estado Islâmico e de assassínios políticos, perto de 40% dos seus jovens estão desempregados e, apesar do petróleo, grande parte da população é pobre.
Neste contexto, o escrutínio suscita pouco entusiasmo entre os 25 milhões de eleitores e os observadores preveem uma fraca participação.
Previstas inicialmente para 2022, estas legislativas foram uma das raras concessões do primeiro-ministro, Mustafa al-Kazimi, ao movimento de contestação do outono de 2019, que levou dezenas de milhares de iraquianos às ruas para reclamar a queda do regime. Apesar das promessas, nada mudou.
“O sistema político está quase falido, económica e ideologicamente”, indicou Renad Mansour, do centro de reflexão Chatham House, citado pela agência France-Presse.
“Ele é incapaz de garantir empregos e serviços públicos ou convencer (…) que é verdadeiramente pró-reformas, anticorrupção”, adiantou.
Segundo exportador de petróleo no mundo, o Iraque obtém mais de 90% da sua receita do “ouro negro”, mas perto de um terço dos 40 milhões de habitantes do país são pobres. A pandemia da covid-19 e a queda do preço do petróleo em 2020 acentuaram a precariedade.
“O país continua atolado na corrupção, que afeta todos as instituições (…) e contribui para minar a confiança no Estado”, disse o analista iraquiano Ihsan al-Shamari.
Depois da votação, a designação de um novo primeiro-ministro poderá, como de costume, ser objeto de negociações intermináveis, como aconteceu com Kazimi, nomeado para um cargo vago há cinco meses.
Militantes e partidos ligados à contestação boicotam o escrutínio, denunciando um clima antidemocrático e a proliferação de armas.
Às fações armadas pró-Irão é atribuída a repressão da revolta popular que causou perto de 600 mortos e 30.000 feridos.
A ONU e militantes denunciaram igualmente o papel das “milícias” numa vaga de raptos, assassínios políticos e ataques visando figuras do movimento de protesto.
“As armas representam um grande desafio”, reconhece Shamari, considerando que os que as detém estão “acima da lei”.
Por outro lado, estas fações participam na votação, através da sua “montra política”, lembrou o especialista.
O politólogo Fadel Abu Raghif evoca “os riscos de uma deterioração da segurança após o anúncio dos resultados”, tendo em conta que quase todos os campos políticos estão ligados a grupos armados.
“Alguns blocos políticos exageraram o seu peso”, explicou, numa alusão aos discursos triunfalistas de alguns. Se “os resultados não corresponderem às expectativas” pode degenerar em violência”, disse.
Shamari também não exclui “fricções” ou um aumento da violência se “as fações armadas não conseguirem representação suficiente no executivo”.
Na semana passada, a mais alta autoridade xiita do Iraque, o grande ayatollah Ali Sistani, apelou à participação da população nas legislativas para “operar uma verdadeira mudança” no poder.
“A autoridade religiosa suprema encoraja toda a gente a dar provas de responsabilidade participando nas próximas eleições”, indica um comunicado dos serviços do ayatollah Sistani, adiantando tratar-se “do meio mais seguro de conduzir o país para um futuro que esperamos melhor”.
A mais alta autoridade xiita “não apoia absolutamente nenhum candidato ou lista eleitoral”, instando os eleitores a escolherem os candidatos “que defendam a segurança e a prosperidade” do Iraque, país de maioria muçulmana xiita.
O escrutínio, cujo grande favorito é o bloco do líder xiita Moqtada al-Sadr, que tem o maior grupo parlamentar no parlamento cessante, conta com missões de observação eleitoral da União Europeia e da Missão de Assistência das Nações Unidas para o Iraque (UNAMI na sigla em inglês).
Para “garantir a proteção total durante o processo eleitoral”, as autoridades iraquianas informaram que vão limitar a circulação entre as províncias e encerrar aeroportos e passagens fronteiriças “do dia 09 de outubro até à manhã do dia seguinte” ao das eleições.
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