“Jamais esquecerei as imagens horríveis de civis mortos em Bucha. Solicitei imediatamente uma investigação independente para garantir uma efetiva responsabilização. Também estou profundamente chocado com testemunhos pessoais de violações e violência sexual que agora estão a surgir”, disse António Guterres, na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque.
“O Alto-Comissário para os Direitos Humanos falou de possíveis crimes de guerra, graves transgressões do direito internacional humanitário e sérias violações (…) dos direitos humanos”, acrescentou Guterres, numa declaração perante o Conselho de Segurança da ONU, que se encontra hoje reunido para abordar a situação na Ucrânia, nomeadamente o alegado massacre de civis por parte das forças russas em Bucha.
Centenas de civis mortos foram encontrados em Bucha, uma cidade a 60 quilómetros de Kiev, espalhados na rua, nalguns casos com as mãos amarradas atrás das costas e atirados para valas comuns, tendo as autoridades ucranianas e os seus aliados acusado os soldados russos de terem cometido esses crimes quando ocuparam a cidade.
Moscovo rejeitou qualquer responsabilidade e disse tratar-se de uma encenação de Kiev.
Além de referir as vítimas mortais e os danos nas infraestruturas da Ucrânia causados pela guerra, Guterres afirmou que ofensiva russa também levou ao deslocamento de mais de dez milhões de pessoas em apenas um mês, “o movimento populacional forçado mais rápido desde a Segunda Guerra Mundial”.
Também o impacto económico da ofensiva russa, visível na inflação dos preços dos alimentos, energia e fertilizantes, foi referido pelo secretário-geral das Nações Unidas, que frisou que as “pessoas apanhadas pela crise em todo o mundo não podem pagar o preço por esta guerra”.
“Como Secretário-Geral das Nações Unidas, é meu dever chamar a atenção do Conselho para os graves danos causados à economia global, particularmente para pessoas vulneráveis e países em desenvolvimento. (…) Já estamos a ver alguns países passarem da vulnerabilidade para a crise e sinais de grave agitação social”, alertou.
“No que diz respeito aos alimentos, pedimos a todos os países que mantenham os mercados abertos, resistam a ataques injustificados e restrições desnecessárias à exportação e disponibilizem reservas para países em risco de fome. Não é hora de protecionismo. (…) A nossa análise indica que 74 países em desenvolvimento, com uma população total de 1,2 mil milhões de pessoas, são particularmente vulneráveis ao aumento dos custos de alimentos, energia e fertilizantes”, salientou Guterres.
O ex-primeiro-ministro português pediu uma ação urgente do G20 e das instituições financeiras internacionais para aumentar a liquidez e o espaço fiscal para que os Governos possam fornecer redes de segurança para os mais pobres.
“As instituições financeiras internacionais devem entrar em modo de emergência. (…) A reforma que venho pedindo do sistema financeiro global está muito atrasada”, disse.
António Guterres lamentou ainda “profundamente (…) as divisões” que têm impedido o Conselho de Segurança de agir não apenas na Ucrânia, mas em relação a outras ameaças à paz e à segurança em todo o mundo.
“Exorto o Conselho a fazer tudo o que estiver ao seu alcance para pôr fim à guerra e mitigar o seu impacto, tanto sobre o povo sofredor da Ucrânia, como sobre as pessoas vulneráveis e países em desenvolvimento ao redor do mundo”, concluiu.
A reunião de hoje do Conselho de Segurança da ONU contará com a presença do Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, que abordará o alegado massacre de civis por parte das forças russas em Bucha.
A Rússia lançou em 24 de fevereiro uma ofensiva militar na Ucrânia que matou pelo menos 1.430 civis, incluindo 121 crianças, e feriu 2.097, entre os quais 178 menores, segundo os mais recentes dados da ONU, que alerta para a probabilidade de o número real de vítimas civis ser muito maior.
A guerra já causou um número indeterminado de baixas militares e a fuga de mais de 11 milhões de pessoas, das quais 4,2 milhões para os países vizinhos.
A invasão russa foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que respondeu com o envio de armamento para a Ucrânia e o reforço de sanções económicas e políticas a Moscovo.
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