A tertúlia, organizada pela Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres, tinha como objetivo ouvir a ativista líbia Iman Bugaighis falar sobre o seu país de origem e sobre o papel das mulheres nos movimentos contra Kadafi e na Primavera Árabe.
Mas Iman, que durante anos lutou por uma Líbia livre de Kadafi e pelos direitos das mulheres líbias, tem ela própria uma história. Com a vida em perigo depois de a irmã, advogada e também ativista, ser assassinada em 2014, após as eleições parlamentares, opta por deixar o país, deixando para trás marido a filha.
Viaja para a Jordânia, sempre com a convicção de que iria voltar, mas as coisas não correm como planeado. A situação é instável e só com a ajuda da eurodeputada portuguesa Ana Gomes consegue, no Egito, um visto para vir para Portugal.
Chega a território nacional “no último dia de fevereiro de 2016”, sozinha, tentando “devagar, devagar construir uma vida”. Não vem ao abrigo de nenhum programa de recolocação, mas sim por conta própria.
“Eu não quero só trabalhar para viver, eu quero dar alguma coisa, mas não tem sido fácil porque todas as portas estão fechadas”, contou à agência Lusa.
Por seu lado, a eurodeputada Ana Gomes afirmou que a integração de Iman em Portugal “tem sido uma luta dura” porque apesar de haver boa vontade política, “há inúmeras dificuldades”.
“É muito difícil integrar-se na sociedade portuguesa porque, por exemplo, ela é uma professora universitária, dentista, e tem sido muito difícil ver reconhecidas as suas qualificações, apesar, até, de ter doutoramentos na Grã-Bretanha e na Hungria”, apontou.
A eurodeputada frisou que Iman “não é uma refugiada clássica”, já que tem meios de subsistência, mas questiona-se sobre como estarão os restantes refugiados que Portugal tem vindo a receber, que não têm apoio de familiares.
“Ao nível das associações profissionais não há sensibilidade para ajudar estas pessoas a integrar-se profissionalmente”, criticou, acrescentando que têm contactado a Ordem dos Médicos Dentistas, mas ainda sem uma resolução favorável.
Para Ana Gomes, há uma atitude “defensiva, corporativa e não sensibilizada para a importância de ajudar e facilitar a vida às pessoas que procuram integrar-se” em Portugal, sublinhando que essa integração se faz por forço de trabalho.
Iman Bugaighis já pagou 500 euros para ter o reconhecimento das suas qualificações, mas continua à espera, desde há cerca de sete meses, por uma resposta por parte da Ordem dos Médicos Dentistas, que ainda não chegou.
“Estou envolvida em muitos projetos de investigação na Líbia, por Skype, mas tudo trabalho voluntário. Em Portugal, eu poderia criar investigação, mas mesmo isso está fechado. Eu tenho muitas qualificações, poderia trabalhar com qualquer uma delas”, adiantou.
Entretanto, Iman tem aprendido português, conseguiu arranjar casa e já trouxe a filha para perto de si. Afirma que não se sente frustrada e que aceita tudo porque já passou por muito.
Sobre o que se passa no país, a ativista acredita que a situação atual é um passo na emancipação do país e recorda que a Revolução Francesa “demorou 80 anos e 12 Constituições”, mas não deixa de apontar o dedo à comunidade internacional, sobretudo os Estados Unidos, mas também a Europa.
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