Em causa está uma participação (a segunda sobre a mesma matéria) enviada a este órgão, considerado o ‘tribunal’ do partido, pelo militante de Braga Leonel Fernandes, dirigida contra Rui Rio e Adão Silva e datada de 23 de outubro do ano passado, o dia em que foi votada em plenário uma iniciativa de cidadãos a pedir a realização de um referendo sobre a despenalização da morte assistida.
Nessa votação, a direção do partido decidiu dar liberdade de voto aos deputados, o que, segundo o queixoso, violaria a deliberação do Congresso do PSD, a que compete estatutariamente “definir a estratégia política do partido, apreciar a atuação dos seus órgãos e deliberar sobre qualquer assunto de interesse para o partido”.
Em fevereiro de 2020, o Congresso aprovou uma moção temática onde se instava a que o PSD, “através das suas instâncias próprias (Comissão Política Nacional e Direção do Grupo Parlamentar), desenvolva todas as diligências políticas, institucionais e legislativas necessárias para que venha a ter lugar um referendo nacional em que seja perguntado aos portugueses pelo seu acordo ou desacordo com os projetos de lei sobre eutanásia”.
Numa notificação a que a Lusa teve acesso datada de terça-feira, o Conselho de Jurisdição Nacional (CJN) informou o militante Leonel Fernandes que deliberou, numa reunião de janeiro, e após “instrução do processo”, “concluir que existe matéria bastante para abertura de processo disciplinar”.
Contactado pela Lusa sobre as possíveis sanções - que, segundo os estatutos, podem ir desde a advertência à expulsão, passando pela cessação de funções em órgãos do partido -, o presidente do CJN, Paulo Colaço, escusou-se a antecipar o desfecho do processo.
“Eu não comento casos que ainda estejam em apreciação e repudio a justiça espetáculo”, afirmou, confirmando que “está em cima da mesa” a deliberação sobre este processo.
O CJN já tinha arquivado uma primeira queixa do mesmo militante, considerando na altura que, “não estando esgotado o processo legislativo, não se pode considerar que tenha sido cometida qualquer infração pelos visados na participação disciplinar em apreço”.
No entanto, nessa ocasião, o CJN considerou que tanto a comissão política como o grupo parlamentar estavam “vinculados ao cumprimento das deliberações do Congresso Nacional” e defendeu que caberia a estes órgãos “encontrar uma forma de cumprir, antes do fim deste processo legislativo, a deliberação plasmada na moção ‘Eutanásia: cuidar e referendar’”.
Na deliberação de meados de outubro do ano passado, o CJN salientava que “nem todas as moções vinculam o partido do mesmo modo”, já que em todos os Congressos são habitualmente aprovadas, de braço no ar, dezenas de moções temáticas.
Este órgão refere ter analisado todas as moções apresentadas ao 38.º Congresso do PSD e considerou que o texto sobre eutanásia submetido pelo militante António Pinheiro Torres “não é incompatível com nenhuma outra moção aprovada no Congresso, é clara e circunscrita quanto ao objetivo e tempo do seu cumprimento” e “não é nem inexequível nem meramente proclamatória”.
“É, por esse motivo, de acatamento obrigatório por parte da Comissão Política Nacional e da Direção do Grupo Parlamentar. Afirmar o oposto seria entender que os demais órgãos do PSD não estão obrigados ao cumprimento das deliberações do Congresso Nacional quando estas contêm objetivos concretos, viáveis e temporalmente definidos”, defendeu então o CJN.
O facto de o processo legislativo sobre um referendo à eutanásia já estar, agora, definitivamente encerrado está na base de uma decisão diferente da Jurisdição quanto à segunda queixa e da instauração do processo disciplinar a Rui Rio e Adão Silva.
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