Uma carrinha de caixa aberta serviu de palanque a um conjunto de intervenções de alguns convidados da organização para apelar aos deputados, horas antes da votação, que a lei não seja alterada.
As centenas de manifestantes coloriram o protesto com cartazes e as mesmas palavras de ordem entre cada intervenção: “Vida sim, morte não”.
Ao microfone, o juiz Pedro Vaz Pato defendeu que a despenalização da eutanásia viola o princípio fundamental de que a vida é inviolável e alertou para o “risco sério de que a eutanásia seja a opção mais fácil e mais barata”.
A ouvi-lo atentamente, os manifestantes aplaudiam e levantavam cartazes que revelavam receios semelhantes: “Por favor, não matem os velhinhos”, lia-se num; “Os doentes também são dignos”, “Matar não é solução” e “Em democracia não se mata”, em vários outros.
A Assembleia da República discute hoje os projetos de lei do PAN, BE, PS e PEV sobre a despenalização da morte medicamente assistida, sendo que a votação será feita deputado a deputado e o resultado é imprevisível.
Todos os diplomas preveem que só podem pedir, através de um médico, a morte medicamente assistida pessoas maiores de 18 anos, sem problemas ou doenças mentais, em situação de sofrimento e com doença incurável, sendo necessário confirmar várias vezes essa vontade.
.Entre as intervenções, a do deputado centrista Ribeiro e Castro foi a mais inflamada, tendo afirmado que nunca ter pensado “viver um dia assim, em que se quisesse acabar com um direito fundamental”, que o debate no parlamento está “carregado de ilegitimidade”.
A ideia do mandato dos deputados para discutir o tema preocupava também os manifestantes. José Manuel Gonçalves, professor de religião e moral disse que ensina cidadania aos seus alunos e que segundo a Carta dos Direitos Humanos e a Constituição portuguesa a vida é “um direito inviolável”.
“Para mim que sou católico, só Deus sabe quando é inevitável. Não temos esse poder nas nossas mãos. Não sou ninguém, enquanto ser humano, para dizer a outro que me mate”, disse, em declarações à Lusa.
Sofia Reimão, médica, disse que nos últimos anos tem “refletido muito sobre a questão” e não tem dúvidas de que a resposta perante os doentes “não é nunca matá-los”, a decisão contrária ao que estrutura a profissão, argumentando com o exemplo do suicídio.
“Quando vemos alguém que se tenta suicidar a nossa primeira tentativa é que essa pessoa redescubra o seu valor e nós ao dizermos aos doentes que aquilo que temos a propor-lhes é a morte estamos a dizer que estes por serem doentes por serem mais idosos por estarem próximos do fim da vida têm menos valor do que outra pessoa qualquer a que nós ajudaríamos a redescobrir o sentido da vida”, disse.
Entre muitos jovens presentes, Vicente, à Lusa, assumiu-se como representante de uma geração, “não só dos jovens que acreditam em alguma religião, mas dos que acreditam na vida como valor primordial”.
“Não estamos aqui como ativistas radicais, estamos aqui enquanto pessoas que têm noção que tudo o que acontece na sociedade advém antes de tudo da vida. O que se discute aqui hoje é a antecipação da morte de alguém e nós enquanto defensores da vida devemos opor-nos claramente à eutanásia”, afirmou.
Em declarações à Lusa, José Maria Seabra Duque, da Federação Portuguesa pela Vida, reforçou que “legalizar a eutanásia é admitir o fracasso da sociedade, é dizer que não somos capazes de dar resposta a quem sofre", e que, mediante o sofrimento dos doentes, é “evidente que em Portugal não existe uma resposta adequada às pessoas em fim de vida”.
José Maria Seabra Duque salienta que a sociedade deveria empenhar-se em cuidar dos que mais sofrem, pois “não é só de cuidados paliativos que estamos a falar, trata-se também de criar condições que acompanhem os doentes”.
Presente na manifestação, Duarte Folque, estudante de 20 anos, diz-se igualmente contra a eutanásia, pois considera que “a vida humana é sempre inviolável”, e que “quem quiser optar pela morte, é porque a sua vida está num caos muito grande e precisa de bastante apoio.”
“O Estado tem que defender a vida em todos os seus momentos, quer na fase de concessão quer na fase final da vida. E não deixa de ser irónico que agora o Estado, e o partido socialista, sejam coniventes com a morte e queiram legalizá-la”, acrescentou.
O facto de ser um tema que não constava dos programas com que os partidos se propuseram aos eleitores nas eleições de 2015, mostra “claramente que os deputados não têm maturidade política e não têm honestidade intelectual”, acentuou ainda o estudante.
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