As autoridades florestais de Odisha estão a recrutar estas trupes de cânticos e danças devocionais para ajudar a combater os incêndios nas florestas de folha caduca seca em Odisha. Só este ano, os incêndios já afetaram mais de 4.500 hectares de floresta no estado, um aumento em relação aos cerca de 4.000 hectares em 2024, segundo os dados citados pelo The Guardian.

A nova aposta no poder da música para sensibilizar as populações locais tem sido muito apelativa para a população, que explica que as mensagens visam, sobretudo, desencorajar a prática comum de queimar folhas na floresta, uma tradição que se acredita beneficiar o solo, mas que nos últimos anos tem provocado incêndios florestais incontroláveis.

O distrito de Keonjhar tem sido um dos principais atingidos por ondas de calor desde abril. Dhanraj Hanumant Dhamdhere, conservador florestal adjunto, refere que os incêndios se propagam mais depressa e é cada vez mais difícil apagá-los, pelo que, este ano, a ajuda dos 80 grupos devocionais tem sido indispensável.

“Os grupos culturais são muito fortes em Odisha, e há muitos artistas nas zonas rurais”, explica. “Além disso, as pessoas aqui são muito religiosas. Os grupos cantam em línguas locais, que são facilmente compreendidas, e as suas atuações são apreciadas, por isso é mais fácil estabelecer uma ligação com o público", conta.

Segundo Dhamdhere, desde que os sankirtan mandalis (trupes devocionais) foram mobilizados, registou-se uma redução de 20 a 30% nos incêndios em algumas áreas. A zona florestal de Ghatagaon, onde se localiza Murgapahadi, é um desses casos.

Quem são estes grupos devocionais?

As mulheres da aldeia de Murgapahadi, no leste da Índia, geriram durante anos as explorações agrícolas e cuidaram dos filhos, recolheram flores e lenha nas florestas. A terra faz parte da fundação destas famílias, que hoje, através da música, celebram enquanto trabalham.

Os sankirtan mandalis datam do século XV e eram originalmente compostos por homens que tocavam címbalos, tambores, dançavam e cantavam canções devocionais. As mulheres raramente saíam sozinhas, muito menos cantavam em público. Mas há dois anos, mulheres de Murgapahadi decidiram formar o seu próprio grupo para recuperar a tradição. São as mulheres quem educa as próximas gerações para a causa ambiental, enquanto as temperaturas continuam a subir.

“Quando os homens [da aldeia] migraram para Hyderabad e Bangalore para trabalhar em fábricas, o sankirtan mandali ficou praticamente inativo. Decidimos trazê-lo de volta”, conta Pramila Pradhan, de 35 anos, líder do grupo em Murgapahadi.

Dibakar Patra, presidente de uma organização que reúne os sankirtan mandalis em Odisha, refere que existem cerca de 20 mil grupos no estado, dos quais pelo menos mil são exclusivamente femininos. “Tradicionalmente atuávamos em festivais, cerimónias de nascimento ou iniciação e casamentos”, explica. “Mas agora o governo quer utilizar-nos de uma forma mais útil. Os nossos mandalis passaram também a ser mobilizados para ações de sensibilização sobre a conservação da água nas zonas rurais, além da prevenção de incêndios florestais.”

Odisha, um dos estados mais pobres da Índia, regista também alguns dos números mais elevados de migração. À medida que os mandalis começaram a ser reativados, liderados por mulheres, as agências governamentais perceberam aí uma oportunidade.

Cantar é mais eficaz

O grupo de Pradhan, composto por 17 pessoas, das quais nove são mulheres, ficou curioso, mas hesitante, quando o departamento florestal os contactou em janeiro. Foi-lhes entregue um poema, que as mulheres adaptaram a um ritmo musical: “Ouçam, ouçam, minhas queridas irmãs, irmãos, não ponham fogo na floresta. Se a floresta sobreviver, nós sobrevivemos… teremos um clima saudável".

Embora Odisha tenha leis para punir quem for considerado responsável por incêndios em áreas florestais, o apelo das canções mostra-se mais eficaz. “Os habitantes ouvem o sankirtan mandali”, reforça Omprakash Jena, guarda florestal. “As pessoas acreditam neles, e se lhes pedirem para não fazer algo, obedecem.”

O responsável congratula o grupo de Pramila Pradhan por ajudar a minimizar os incêndios florestais registados este verão, diminuindo o total de fogos para 26 em 600 ocorridos no distrito de Keonjhar.

Além destas estratégias, os responsáveis recorrem também a tecnologias como câmaras com inteligência artificial e dados de satélite para monitorizar os focos de incêndio.