“O que aconteceu tem um impacto brutal, em todos os sentidos”, disse hoje à agência Lusa Catarina Valença, da Spira, empresa de animação turística que gere a Rota Tons de Mármore, iniciada em 2013 e lançada pela Entidade Regional de Turismo do Alentejo, com apoios comunitários.
Contudo, ressalvou a mesma responsável, é necessário “relativizar as coisas”, ou seja, “o prejuízo que a dimensão turística possa ter não é, obviamente, comparável à parte pessoal, à perda de vidas, nem à parte económica das pedreiras”.
Também o Centro de Estudos de Cultura, História, Artes e Património (CECHAP), de Vila Viçosa, entidade promotora da Rota do Mármore do Anticlinal de Estremoz (RMAE), também apoiada por fundos europeus, reconheceu à Lusa que o acidente, devido ao deslizamento de terras e colapso de um troço da estrada 255 para o interior de duas pedreiras contíguas, tem impactos negativos no projeto.
“O que aconteceu afeta e de que maneira. Há várias visitas que já estavam programadas, mas as pessoas desistiram agora e pediram-nos para adiar para o verão para ver como é que isto vai evoluir”, adiantou à Lusa o investigador e historiador Carlos Filipe, do CECHAP.
O deslizamento de um grande volume de rochas, blocos de mármore e terra e o colapso de um troço de cerca de 100 metros da estrada municipal 255 para o interior de duas pedreiras contíguas em Borba ocorreram na tarde de 19 de novembro.
Dois operários de uma empresa de extração de mármore, que trabalhavam na pedreira ativa, morreram, assim como três outros homens, ocupantes de duas viaturas automóveis, que, na altura do acidente, seguiam no troço da estrada alvo da derrocada e que caíram no plano de água da outra pedreira, sem atividade.
A estrada cujo troço abateu e que ligava Borba e Vila Viçosa, dois dos concelhos da zona dos mármores do Alentejo, era percorrida diariamente por populares e trabalhadores do setor, mas também integrava o roteiro das visitas turísticas, por estar ladeada por pedreiras, unidades de transformação e escombreiras.
Antes do acidente, “tínhamos passado recentemente pela estrada com turistas”, evocou o porta-voz da RMAE, que proporciona aos visitantes experiências ligadas ao património geológico e industrial dos mármores em cinco concelhos alentejanos (Alandroal, Estremoz, Borba, Sousel e Vila Viçosa).
“Vamos a pedreiras, mas para visitar os perímetros, porque só descemos quando se trata de um estudo ou de um técnico especialista, e levamos as pessoas a unidades de transformação e ao património, para visitar palácios, igrejas ou conventos”, disse.
Vocacionada mais para um público académico, a RMAE, que começou oficialmente a funcionar em 2014 e possui “todos os registos e licenciamentos”, já recebeu “alguns milhares” de pessoas, sobretudo estrangeiros e “alunos e professores de arquitetura oriundos de universidades”.
“Temos de aguardar para ver onde é que isto vai parar”, diz, com expectativa Carlos Filipe, enquanto Catarina Valença, da Rota Tons de Mármore, iniciativa igualmente registada e certificada, expressa receios de que o seu projeto tenha os “dias contados”.
“Como projeto que juntava parceiros públicos e privados e que era um exemplo de boas práticas a nível europeu”, a rota, “de alguma forma, cai por terra e com consequências negativas para outros projetos de turismo industrial no país”, argumentou a responsável da Spira, lembrando que, na semana anterior ao acidente, tinha passado pela estrada 255 com um autocarro cheio de autarcas espanhóis.
A rota, que abrange também os cincos concelhos dos mármores alentejanos e que atrai “sobretudo estrangeiros”, abarca visitas a pedreiras, fábricas e monumentos, mas, para fazer face ao facto de estar centrada numa “atividade que é sempre de risco”, envolveu a criação prévia e propositada de procedimentos de qualidade e segurança.
“Antes, as visitas às pedreiras eram feitas de forma aleatória, descoordenada e não controlada. O que se fez com este projeto foi todo um trabalho de normalização, de garantia de qualidade, de qualificação. Formámos pessoas, colocámos escadas nas pedreiras, tornámos obrigatório o uso de capacete e de colete, não aceitamos menores de 14 anos”, entre outras medidas, contou.
O que o acidente gerou foi “uma insegurança” que, futuramente, “será muito difícil de ultrapassar”, vaticinou.
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