Flor Valente, advogada de Morais Pires, e Rui Patrício, mandatário de José Manuel Espírito Santo, procuraram convencer o Tribunal da Concorrência que a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) não poderia ter condenado os seus clientes por infração à obrigação de prestar informação de qualidade nas notas informativas emitidas sobre a colocação de papel comercial da ESI (Espírito Santo International) e da Rioforte aos balcões do BES.
Tanto Morais Pires como José Manuel Espírito Santo foram condenados por duas contraordenações relativas à falta da qualidade da informação prestada, tendo José Manuel Espírito Santo sido condenado ainda por seis contraordenações por alegado conflito de interesses (por pertencer às administrações da ESI e do BES).
O Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, ouviu hoje à tarde Flor Valente e Rui Patrício, os últimos a alegar no julgamento dos recursos às coimas aplicadas pela CMVM, em julho de 2021, também ao Haitong Bank (ex-BESI) (300.000 euros, suspensa em 100.000 euros por dois anos), ao ex-presidente do BES Ricardo Salgado (2 milhões de euros) e aos antigos administradores Manuel Espírito Santo Silva (900.000 euros), Joaquim Goes (300.000) e Rui Silveira (100.000).
Flor Valente frisou que o dever da prestação de informação cabia, à data, às entidades emitentes e não sobre o intermediário, pelo que a infração não pode ser imputada a Morais Pires, sublinhando que, ao ser a título doloso, teria de ser provado que o ex-administrador do BES conhecia a falta de informação e queria que assim fosse transmitida aos clientes do banco.
Por seu turno, Rui Patrício invocou as funções que eram exercidas por José Manuel Espírito Santo – mais de natureza comercial, de “angariação de clientes” -, para salientar que não tinha conhecimentos nem competências técnicas, financeiras ou económicas nem no BES nem na ESI e não ocupava nenhum cargo na Rioforte.
O advogado pediu que o tribunal tenha em conta quem, de facto, tratava destas questões, apontando como “pessoas-chave” José Castella e Machado da Cruz e, no topo, Ricardo Salgado, responsável pela área financeira do grupo.
Rui Patrício concluiu que a CMVM só poderia ter imputado ao seu cliente três e não oito contraordenações, lamentando que a condenação tenha acontecido quando já era público que José Manuel Espírito Santo havia sofrido, em outubro de 2019, um AVC (acidente vascular cerebral) que o deixou “completamente incapacitado”.
Rui Patrício considerou “completamente absurda” a sanção acessória de inibição do exercício de funções aplicada pela CMVM e “exorbitante” a coima aplicada de 750.000 euros.
O advogado pediu à juíza Vanda Miguel que, caso não absolva o seu cliente, como defendeu, tenha em conta, na aplicação da coima, a situação de total dependência, bem como o facto de ter todo o seu património e parte da sua reforma arrestados.
Rui Patrício pediu que, a haver condenação, passe a admoestação ou, se assim não acontecer, seja substancialmente reduzida, já que, quanto muito, José Manuel Espírito Santo atuou por negligência, ao ter confiado “talvez demasiado” no seu primo Ricardo Salgado.
Lembrou ainda que José Manuel Espírito Santo “foi o único que pediu desculpas institucionais publicamente”, na Assembleia da República, mesmo não admitindo responsabilidades pela queda do banco.
O advogado lamentou que, nas suas alegações, o procurador do Ministério Público tenha invocado a proximidade da prescrição do processo, lembrando o despacho inicial do TCRS, o qual fez notar o tempo que demorou na fase administrativa (sete anos).
“Se o processo está moribundo e vier a prescrever, a responsabilidade não é das defesas dos arguidos”, afirmou.
No despacho em que marcou a leitura da sentença para o dia 07 de fevereiro, a juíza Vanda Miguel afirmou que a proximidade da data de prescrição não pode perturbar a serenidade e ponderação exigidas na decisão de um processo complexo.
A juíza salientou ainda o facto de não se encontrar em exclusividade, para justificar o não cumprimento do prazo de 10 dias para proferir a sentença.
Neste processo, está em causa a alegada prestação de informação falsa aos investidores na emissão de papel comercial da ESI e da Rioforte, além de não terem sido comunicadas as alterações do organograma do Grupo Espírito Santo, que colocaram a Rioforte como dona da Espírito Santo Finantial Group (ESFG), que tinha a participação do BES.
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