O anúncio da criação de um memorial a apresentar na JMJ foi feito em 3 de março, no final da Assembleia Plenária Extraordinária da CEP que serviu para analisar os resultados do estudo sobre os abusos sexuais na Igreja em Portugal efetuado pela Comissão Independente liderada pelo pedopsiquiatra Pedro Strecht.
Na ocasião, o presidente da CEP, José Ornelas, assegurou que o tema dos abusos iria ser realçado durante a JMJ com um memorial no espaço da reconciliação [Parque do Perdão], considerado “o indicado” para o efeito.
O também bispo de Leiria-Fátima confirmou, então, que a ideia da Comissão Independente para a construção de um memorial fora “totalmente aceite”, sendo a autoria do arquiteto Siza Vieira.
Após a JMJ, o memorial seria “perpetuado num espaço exterior da Conferência Episcopal Portuguesa”, segundo o comunicado final daquela Assembleia Plenária da CEP.
Hoje, questionada pela agência Lusa sobre o processo de criação do memorial, fonte da CEP informou que o projeto “ainda está em estudo e, por isso, não será apresentado durante a JMJ”, adiantando que “assim que esteja concluído e haja nova data”, será divulgada uma nota.
“Alguma outra evocação às vítimas de abuso durante a semana JMJ que exista, será divulgada oportunamente”, acrescentou a mesma fonte.
A criação do memorial e apresentação do mesmo durante a JMJ, que decorrerá em Lisboa entre 1 e 6 de agosto, não foi consensual desde o início.
O presidente da Fundação Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023, bispo Américo Aguiar — que o Papa Francisco vai elevar a cardeal em 30 de setembro -, considerou em entrevista conjunta ao Público e à Rádio Renascença, em 14 de março, que o memorial “não é a forma mais feliz” de evocar as vítimas, admitindo que a ideia lhe causava algum “desconforto”.
“Não sei se é a forma mais feliz de materializar o respeito, o ’mea culpa’ e a ‘tolerância zero’ [pedida pelo Papa Francisco para os casos de abuso]. Não sei se é a forma mais feliz de o fazer, principalmente quando, nestas coisas, passa o dia, passa a romaria e passado algum tempo alguém já não sabe o que é aquilo. Não sei se é a expressão mais positiva daquilo que possamos e devemos fazer”, disse, então, o principal responsável pela organização da JMJ Lisboa 2023.
Em fevereiro deste ano, a Comissão Independente para ao Estudo dos Abusos Sexuais contra as Crianças na Igreja Católica Portuguesa anunciou a validação de 512 testemunhos de alegados casos de abuso em Portugal, apontando, por extrapolação, para pelo menos 4.815 vítimas. Vinte e cinco casos foram enviados ao Ministério Público, que abriu 15 inquéritos, dos quais nove foram arquivados.
Os testemunhos referem-se a casos ocorridos entre 1950 e 2022, o espaço temporal abrangido pelo trabalho da comissão.
No relatório, aquela comissão alertou que os dados recolhidos nos arquivos eclesiásticos sobre a incidência dos abusos sexuais “devem ser entendidos como a ‘ponta do iceberg'” deste fenómeno.
Na sequência destes resultados, algumas dioceses afastaram cautelarmente sacerdotes do ministério.
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