2. O QUE É QUE OS BARCOS NÓRDICOS TINHAM DE ESPECIAL?

Em primeiro lugar, a flexibilidade e a capacidade de navegar em águas pouco profundas, duas características resultantes
da estrutura das embarcações e da forma como eram feitas. Depois, dentro da Escandinávia, gozavam de um estatuto cultural elevado, à época já antigo, e que não estava desligado de uma geografia onde o transporte marítimo ou fluvial era essencial. E, no contexto da expansão nórdica, os barcos tinham uma centralidade que fazia deles o território efetivo dos bandos de vikings, que em muitos aspetos eram como pequenos países sobre ondas. Há aqui muito por analisar, por isso todos a bordo, que vamos zarpar para mais um capítulo!

O QUE A GEOGRAFIA DITA

No século XI, um homem que ficou para a posteridade com o nome de Adão de Bremen escreveu um texto intitulado História dos Arcebispos de Hamburgo-Bremen. Era uma obra à qual não era estranho um propósito: enobrecer a arquidiocese em causa e legitimar a sua autoridade eclesiástica sobre a Escandinávia. Autoridade essa que tinha fundamento histórico, dado que a diocese de Hamburgo fora fundada em 831 como base para a missionação do Norte, mas, à medida que a cristianização avançava e a Igreja se enraizava, os países escandinavos reclamavam autonomia religiosa que ameaçava a primazia de Hamburgo-Bremen. A História de Adão tentava contrariar isso e, embora o esforço tenha sido inglório, derrotado que foi pela criação da arquidiocese de Lund em 1103-04, produziu um texto recheado de informação sobre a Escandinávia. É por isso que se voltará várias vezes a ele neste livro.

Entre o que nos é dito pela História dos Arcebispos de Hamburgo-Bremen está um pequeno dado com relação direta com o tema deste capítulo: no século XI, a viagem entre a Escânia, hoje o extremo sul da Suécia, e a povoação de Sigtuna, perto de Estocolmo, durava um mês se feita por terra, mas apenas cinco dias se de barco. Em linha reta está-se a falar de qualquer coisa como 450 quilómetros de distância. O motivo para essa disparidade estava não só na velocidade limitada que humanos e outros animais conseguem atingir pelo próprio pé, como também nos obstáculos naturais, de florestas densas a pântanos, do relevo acidentado a massas de água, tornando as deslocações terrestres mais lentas e demoradas. E se o inverno podia trazer neve e gelo que possibilitassem o uso de esquis e trenós, também podia ensopar o solo ao ponto de torná-lo ainda menos propício para viagens por terra. A situação não era melhor no resto da Escandinávia: na Dinamarca, a Jutlândia forma uma península contínua desde o Norte da Alemanha, mas, além das florestas e pântanos existentes à época, é marcada por rias, enseadas e fiordes, e está rodeada por mais de mil ilhas, às quais há que aceder de alguma forma; o mesmo vale para a Noruega, que além de um território muito marcado por florestas e montanhas, a mais alta das quais ultrapassa os 2000 metros de altura, é famosa pelos seus fiordes e ilhas costeiras, que são mais de duzentas mil. Neste cenário, a forma de transporte mais prática era, pois, o barco, não só pela velocidade que podia atingir, os obstáculos que evitava e os espaços insulares a que chegava, como também por poder tirar partido das muitas reentrâncias marítimas e acessos fluviais ao interior. Julga-se, aliás, que a Noruega deve o seu nome a essa realidade: «norðr vegr» ou «caminho do Norte», isto é, a rota marítima que seguiria ao longo da costa norueguesa e que denominou o território antes de identificar um país unificado, que só surgiu mais tarde.

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Se o barco era a forma de transporte mais fácil e rápida, então ele era essencial na vida quotidiana e no desenrolar de quaisquer atividades supralocais, fossem elas comerciais, políticas ou militares. Alguém que quisesse frequentar um mercado sazonal, ou participar numa assembleia num local a quilómetros de distância, teria na navegação a forma mais prática de se deslocar. O mesmo valia para o comerciante que desejasse chegar a um entreposto permanente, que muitas vezes estaria localizado junto da água já a pensar nas vantagens do transporte naval. Um líder político que quisesse mostrar-se àqueles sobre os quais governava, (re)afirmando assim o seu estatuto, teria vantagens em fazê-lo de barco, não só pela rapidez e acessibilidade, mas também pelo poder e riqueza que podia exteriorizar se viajasse numa embarcação grande e esplendorosa. E um líder militar teria todo o interesse em dispor de uma boa frota pela rapidez com que ela lhe permitiria movimentar guerreiros, tanto em campanhas defensivas como ofensivas. Na Escandinávia antiga, poder e autoridade, assim como riqueza e sucesso, estavam ligados à capacidade naval e podiam, por isso, ser simbolizados por barcos. Até porque, conforme veremos, o custo de construção e apetrechamento podia ser alto, pelo que a posse de uma embarcação (já para não falar de várias) — em especial as maiores, mais bem equipadas e ricamente decoradas — era já por si um sinal de posses e estatuto. Daí que na mitologia nórdica, segundo a estrofe 43 do poema éddico Grímnismál, o deus Freyr, que confere abundância e prosperidade, tenha o melhor dos barcos. Outra fonte também do século XIII, o Capítulo 7 da Saga dos Ynglingos, na coletânea de sagas de reis Heimskringla, atribui a mesma embarcação a Odin, o que pode ser uma tradição alternativa que faz igualmente sentido, pois do deus dos senhores da guerra espera-se que ele tenha meios que assegurem uma vitória militar. E há ainda Njörðr, pai de Freyr, que na estrofe 16 do Grímnismál é uma divindade dos portos ou do mar e, segundo a Edda de Snorri governa o vento e o espaço marítimo, protege viajantes e pescadores e é tão rico que oferece fortuna a quem a ele rezar.

Para usar uma analogia simples, pode-se dizer que o barco estava para os nórdicos antigos como o carro está para muitos de nós, europeus modernos. O transporte rodoviário tem hoje um papel central, condenando-se ao isolamento ou posição periférica os locais que não tenham acesso por estrada, incluindo ilhas, na falta de uma ponte. E essa centralidade sobre rodas faz do automóvel um símbolo de estatuto, pois, além de facilitar a mobilidade, ser-se dono visível de um bom carro (ou de vários) é para muitas pessoas uma forma de mostrar as suas posses ou elevar a sua posição social. Da mesma forma, na Escandinávia antiga, sendo central o transporte naval, eram os sítios sem acesso por água que estavam mais isolados. E o rei, o aristocrata, o proprietário rural ou o comerciante que tivesse uma boa embarcação (ou várias), além de dispor de um veículo que permitia alargar horizontes, estaria tanto mais a exteriorizar ou a afirmar o seu estatuto social quanto maior e mais luxuoso fosse o barco. No fundo, Freyr e Odin têm como que um bruto descapotável topo de gama.

DO CASCO AO CUSTO

Isto ajuda a perceber a importância das embarcações na vida e nas culturas nórdicas antigas, com reflexo não só nas relações sociais e na mitologia, como também nas práticas fúnebres, embora não de forma uniforme e universal, conforme veremos no Capítulo 9. Mas não explica as capacidades técnicas, que é o que se segue. E elas podem ser resumidas da seguinte forma: o que é natural é bom, o esqueleto vem depois da pele e toda a praia pode ser um porto.

As particularidades dos barcos que os vikings usaram começavam logo no momento em que uma árvore cortada era transformada em madeira para construção: os nórdicos não usavam serras. Se as conheceram por via de contactos entre os mundos germânico e romano, esqueceram-nas depois do colapso deste — ou então simplesmente puseram-nas de parte — e só voltaram a usá-las no século XIII. Em vez disso, seccionavam os troncos martelando cunhas até eles quebrarem ao longo dos seus veios, o que produzia tábuas naturalmente mais resistentes. A isso acrescia a preferência pela madeira verde, e desse modo mais flexível ou maleável, se preciso fosse preservando-a dentro de água até ser necessária. E o uso de formas naturais, tirando proveito da sua resistência, seria generalizado: tanto quanto possível, de troncos longos e direitos faziam-se tábuas compridas, de árvores retorcidas extraíam-se componentes curvas, peças com ângulos mais agudos eram produzidas a partir da bifurcação de ramo e tronco. Quaisquer detalhes ou ajustes que tivessem de ser talhados eram feitos com recurso a pequenos machados ou a um cinzel, mas sem pôr em causa a forma natural. Ainda dentro dos materiais de construção, à madeira era depois preciso somar pregos ou rebites de ferro, que constituía a outra matéria-prima essencial e igualmente disponível na Escandinávia, e por fim alcatrão e pele ou pelo de animal.

Claro que juntar todas as peças para construir um barco devia exigir alguma forma de planeamento e instrumentos de medição, mas não há certezas sobre quais seriam. Como as sociedades nórdicas antigas eram predominantemente orais, seria normal que o conhecimento necessário existisse de memória, passando de boca em boca e pela prática, o que, por um lado, conduziria a um grau de variabilidade, mas, por outro, deixa pouca informação coeva para o historiador moderno. É provável que se recorresse a varas ou cordas de medição, giz e incisões orientadoras, até mesmo círculos de diâmetro variável para estabelecer dimensões e proporcionalidade.

Tendo então ao seu dispor as ferramentas e os componentes necessários, o construtor naval (e os que com ele trabalhassem) entregava-se à tarefa de dar forma a uma embarcação, começando por fixar três partes: a proa (ponta da frente) e a popa (ponta de trás), ambas curvas e cada uma feita de um único pedaço de madeira; e a quilha, que era como que a coluna do barco, ligando as duas extremidades, e normalmente feita também de uma única peça — embora, no caso de navios mais longos, pudesse necessitar de várias, com natural prejuízo estrutural. E estabelecido assim o comprimento e uma espécie de trave-mestra, o casco começava a ser construído a partir de baixo, mas não de forma a criar uma superfície lisa. Em vez disso, as linhas de tábuas eram parcialmente sobrepostas, gerando como que degraus ou, na terminologia correta, um casco trincado. Para impermeabilizar a embarcação, punha-se pelo ou pele de animal com alcatrão na zona de contacto entre tábuas, que eram fixadas com recurso a pregos ou rebites. E à medida que o  casco ganhava altura, ia sendo acrescentado um esqueleto interno que reforçava a forma já criada pelas tábuas e oferecia resistência a pressões laterais. As primeiras componentes dessa estrutura eram peças curvas, adaptadas para a forma do casco e fixadas no fundo do barco, depois reforçadas por outras, paralelas e perpendiculares, conforme os lados da embarcação cresciam. Durante esse processo, caso estivesse planeada uma vela, afixava-se ainda à quilha e ao esqueleto interno uma base para o mastro, cuja pressão era assim distribuída. E o resultado era um barco ao mesmo tempo resistente e flexível, com um calado baixo, isto é, com uma quilha pouco profunda; tanto assim que o perfil transversal de embarcações sobreviventes é o de um V pouco acentuado, por vezes até parecido com uma chaveta, o que permitia navegar em águas pouco fundas e, em muitos casos, usar qualquer praia, fluvial ou marítima, como ponto de desembarque. Sinal disso, a poesia nórdica antiga faz uso da expressão «aurborð» ou «tábua de gravilha», supostamente as que, estando no fundo, raspavam no solo. O que tem paralelo arqueológico numa embarcação sobrevivente (a Skuldelev 2, já lá vamos aos nomes), cuja quilha mostra sinais de desgaste passíveis de terem sido criados pelo contacto com superfícies rochosas ou areosas.

Livro: "No Tempo dos Vikings"

Autor: Hélio Pires

Editora: Saída de Emergência

Data de Lançamento: 18 de julho de 2024

Preço: € 18,80

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Mas à estrutura naval cuja construção foi aqui esboçada falta ainda adicionar alguns elementos essenciais: mastro e vela, que seria quadrangular ou retangular e feita de lã; cordas de fibra vegetal, pele de foca ou morsa, crina de cavalo ou talvez até de cânhamo;12 remos apoiados em pregas de madeira, forquetas ou em orifícios nas últimas linhas de tábuas. Havia ainda um remo adicional que servia de leme e que era posto na parte direita da popa, já que a maioria das pessoas é destra. Essa prática originou o termo «styriborð», literalmente a «tábua de dirigir», aplicado também ao flanco pelo qual a embarcação era manobrada — as tábuas da metade em que se dirige ou conduz. A palavra tem paralelo noutras línguas germânicas e é delas que, por intermédio do francês, vem o português «estibordo», o lado direito da embarcação.

Por fim, havia ainda a decoração, fosse ela sob a forma de gravuras, pintura ou ambas. Uma vez mais, a poesia antiga e a arqueologia moderna coincidem: além das alusões poéticas a tábuas negras, talvez por causa do alcatrão usado para impermeabilizar, há referências a cascos vermelhos, azuis ou simplesmente a embarcações pintadas, com indícios físicos nos destroços sobreviventes do barco Hedeby 1. Os próprios remos podiam ser decorados e pintados, como na embarcação tumular de Oseberg, e o mesmo aplica-se ao leme, como no barco de Gokstad. E a isto junte-se o trabalho estético na proa e na popa, incluindo as famosas cabeças de dragão ou serpentes, que podiam incluir peças de metal.

Ora, tudo isto seria certamente demorado e caro de se fazer, pelo menos para as embarcações de maior dimensão, com vela e mais remos, e maior requinte. Com base em exemplares (parcialmente) sobreviventes e experiências de reconstrução, calcula-se, por exemplo, que para um barco de 20 a 25 metros de comprimento seriam necessárias cerca de onze árvores com um tronco de 1 metro de diâmetro e 15 a 18 de altura. A quantidade de pregos ou rebites necessários para cada metro de tábuas seria cerca de cinco, tendo sido empregues mais de mil no Skuldelev 3, que tem uns meros 14 metros de comprimento. Uma vela de 80 metros quadrados podia ter exigido um ou mais anos de trabalho a três ou quatro pessoas e, no caso do Skuldelev 2, de 29 metros de comprimento, estima-se que a sua construção pode ter exigido ao todo mais de 2500 horas de trabalho e necessitado de mais de 2 quilómetros de corda para navegar. São dados como estes que obrigam a concluir que as primeiras expedições vikings não foram organizadas por indigentes e indivíduos de poucas posses em busca de uma vida melhor; esses podem ter participado como parte de um séquito guerreiro ou membros da tripulação, mas não foram os organizadores. Pelo menos de início, terá sido um investimento ao alcance de apenas alguns — membros da realeza, aristocratas, grandes proprietários rurais — os que podiam mobilizar os necessários recursos humanos e materiais, não só para construir e equipar, como também para reunir uma tripulação devidamente motivada e na expectativa de ganhos a curto prazo. Claro que essa situação pode ter mudado à medida que o período viking avançava, já que as sucessivas campanhas podem ter granjeado a indivíduos comuns a fama e a fortuna sufi cientes para, pelos seus meios e se assim o desejassem, adquirirem embarcações e associados próprios. Uma mobilidade social permitida pelo renome e pelas riquezas ganhas, mas que não alterava o facto fundamental de que ser-se viking tinha um custo material elevado que alguém tinha de pagar. Não por acaso, uma inscrição rúnica sueca do século XI, a U 778, refere com aparente orgulho que o homenageado era o único dono de uma embarcação. E na inscrição DR 335, o mesmo Faðir que mandou fazer o texto rúnico com que se abre este livro presta homenagem a Björn, com o qual ele partilhava a posse de um barco. Uma espécie de sociedade que terá dividido a meias os custos de um navio.

TIPOLOGIAS

Os leitores mais atentos terão reparado que eu mencionei que a cultura nórdica antiga era essencialmente oral, pelo que não produziu manuais e registos escritos que permitam identificar as técnicas, o tempo e as despesas de construção. Mas, se assim é, como é que temos essa informação? Parte da resposta está na tapeçaria de Bayeux, um relato pictórico e praticamente coevo da conquista do trono inglês por Guilherme da Normandia, em 1066, e onde a construção da frota normanda está retratada com detalhe suficiente para se poder vislumbrar métodos e ferramentas, além dos usos e aparência das embarcações, que seriam ainda reflexo de modelos escandinavos. A mesma informação, mas em grau mais limitado, pode ser extraída de pedras pictóricas da ilha de Gotland e de moedas nórdicas cunhadas nas protocidades da Idade Viking. E a isto soma-se ainda a poesia, alguns detalhes textuais de inscrições rúnicas e a descoberta arqueológica de ferramentas da época. Mas os mesmos leitores — ou outros ainda mais atentos — terão também notado que eu já dei uma outra parte da resposta à pergunta, embora de passagem: as embarcações sobreviventes, que são um tesouro informativo que a arqueologia tem vindo a desvendar.

Não sabemos que nomes elas tinham, se alguns, pelo que hoje são conhecidas pelos dos sítios onde foram encontradas. Por exemplo, o barco de Oseberg é assim chamado por ter sido descoberto na quinta norueguesa de Lille Oseberg, tal como o de Gokstad o foi numa propriedade com o nome de… Gokstad. Quando há mais do que uma embarcação com a mesma origem é adicionado um número, como no caso das seis que foram encontradas nas proximidades de Skuldelev, na Dinamarca, e que são hoje conhecidas pelas denominações pouco criativas, mas claras, de Skuldelev 1, Skuldelev 2 e assim por diante. E o grau de conservação dos diferentes achados é diverso: se no caso do barco de Oseberg sobreviveu cerca de 95 por cento da madeira original, o que permitiu uma reconstrução quase integral, do Roskilde 6 só chegou aos nossos dias coisa de 20 por cento do casco. Há casos piores, como o do barco de Ladby, que foi usado como sepultura por alturas do ano 900 e se decompôs integralmente, ficando apenas a marca no solo e as peças de metal. Um fantasma de uma embarcação desaparecida, mas que mesmo assim permite estimar que teria pelo menos 21,5 metros de comprimento, vela e trinta a trinta e dois remos. Mas quando a madeira resiste, mesmo se apenas em parte, há muito que se pode aprender com ela: da estrutura sobrevivente retira-se conhecimento sobre as diferentes componentes e como é que elas eram dispostas; das marcas de ferramentas deduz-se quais seriam e como eram usadas; pode-se até saber que tipo de madeira foi empregue, com que origem, em que data aproximada e se a embarcação foi alvo de reparações. E, não menos importante, os achados tornam possível a arqueologia experimental, isto é, a aplicação prática do conhecimento adquirido de forma a testá-lo, aumentá-lo ou pelo menos refiná-lo. Ou seja, estudar as embarcações sobreviventes dos nórdicos antigos fazendo réplicas artesanais e lançando-as ao mar para melhor se perceber as técnicas de construção, os recursos necessários e as capacidades de navegação. Por exemplo, do Skuldelev 2 fez-se uma cópia que, em 2007, viajou da Dinamarca até à Irlanda, contornando a Escócia, antes de regressar a águas dinamarquesas pelo canal da Mancha, já em 2008. Neste tipo de experiências, a Escandinávia tem aliás alguma tradição: em 1893, uma réplica do barco de Gokstad atravessou o Atlântico e foi exposta na Feira Mundial de Chicago, numa forma pouco subtil de recordar que os nórdicos tinham chegado à América antes de Cristóvão Colombo. E os exemplares sobreviventes ensinam-nos ainda outra coisa: nem todos os barcos eram iguais, nem feitos com o mesmo propósito ou cuidado, e a construção naval nórdica não era estática.

No estudo moderno do tema reconhece-se de forma genérica embarcações escandinavas de dois tipos: as de guerra e as de carga, separadas por coisas como a relação entre largura e comprimento, o número de remos ou a capacidade de transporte, que se traduziam numa maior aptidão para um ou outro uso. O primeiro tipo é essencialmente o navio longo, ou «langskip», embora essa denominação seja mais descritiva do que técnica, tal como a de «herskip» (navio de guerra), deixando-nos na dúvida sobre qual, se algum, seria o termo exato que os nórdicos tinham para esse género de embarcação. Na poesia, a palavra «skeið» é usada com regularidade para barcos em atividades ou com características bélicas, pelo que talvez fosse esse o vocábulo específico para esse tipo de navio. Mas, nomenclatura à parte, o maior exemplar sobrevivente do género é o Roskilde 6, que teria quase 38 metros de comprimento, cerca de 4 de largura, setenta e oito a oitenta remos e um calado de menos de 1 metro. Feito de carvalho norueguês por volta de 1025, e reparado pelo menos uma vez com madeira da região do Báltico, as dimensões sugerem que terá sido construído por ordem de um aristocrata abastado ou de um rei. E, devido ao seu comprimento, a quilha é feita de três peças ligadas por dois entalhes de 2 metros cada. Outro barco de guerra, mas no extremo oposto em termos de tamanho (e qualidade!), o Skuldelev 5 tinha apenas cerca de 17,5 metros de comprimento, 2,5 de largura, vinte e seis remos e um calado de pouco mais de 1 metro. Foi feito por altura de 1030, em parte de carvalho, mas terá sido uma embarcação de custo reduzido: não só parece
ter estado bastante desgastada quando foi afundada, como foi construída (ou pelo menos reparada) com recurso à reutilização de partes de outros barcos, com materiais diferentes (madeira de pinheiro e freixo) e dimensões distintas, que obrigaram a tapar alguns orifícios para remos e a abrir outros. Um Frankenstein naval, se se quiser*. Não terá sido por isso uma embarcação régia ou aristocrática; ou, se foi, o proprietário era muito poupadinho ou estava a passar por dificuldades financeiras.

Quanto aos navios de carga, a historiografia moderna identifica-os pelo termo «knörr»** (plural, «knerrir»), palavra que está atestada para o período viking, mas cujo sentido à época pode ter variado: se por um lado parece ter sido usada como sinónimo genérico de «barco», por outro, a partir do final do século X ou início do XI, pode ter adquirido um sentido marcadamente mercantil e, por isso, de barco de carga. Uma evolução semântica que pode ter ocorrido em simultâneo com uma naval, na medida em que o desenrolar da expansão nórdica terá originado uma especialização de embarcações que, numa fase inicial, teriam um uso indistinto. Talvez sinal disso, o barco de Klåstad, datável do final do século X e hoje classificado como knörr, tem
dimensões próximas das dos mais antigos Tune (c. 910), Gokstad (c. 895) e Oseberg (c. 820), sendo que estes três também dispunham de entre vinte e quatro e trinta e dois remos, quantidades características das embarcações de guerra posteriores, que por terem uma função bélica não podiam estar dependentes da força e da direção do vento. Já os knerrir do século XI não só mantêm ou reduzem o comprimento dos barcos mais antigos (em contraste com navios longos como o Roskilde 6), como o número de remos é cortado para o mínimo necessário para manobrar, restando o vento como única força motriz. O que tem uma justificação simples: menos remos equivale a menos remadores e logo a uma tripulação mais pequena, maximizando-se o espaço para mercadorias num knörr. Assim, o Skuldelev 1 tinha quase 16,5 metros de comprimento para cerca de 4,5 de largura, uma capacidade estimada de 24 toneladas e, de acordo com os testes em várias réplicas, requeria uma tripulação de apenas cinco a sete pessoas. Um valor próximo do que foi constatado para o Skuldelev 3, que de dimensões mais modestas (14 metros de comprimento, 3,5 de largura e até 5 toneladas de capacidade) teria sido manobrável com apenas quatro ou cinco pessoas a bordo. Ainda na categoria de navios de carga, os fragmentos do Hedeby 3, datáveis de c. 1025, indicam um knörr de dimensões consideráveis, com uns 22 metros de comprimento, 6 de largura e uma capacidade estimada em 60 toneladas. E não sem relação com a sua função mercantil, os knerrir têm frequentemente uma estrutura interna mais complexa, sendo por isso embarcações mais robustas e menos flexíveis, adequadas para o comércio que se desenvolveu no Atlântico Norte, da Gronelândia à Escandinávia.

No entanto, em maior ou menor medida, estes e outros barcos terão sido o produto de investimentos consideráveis (mesmo o poupadinho Skuldelev 5). São uma espécie de modelos de topo ou de gama média, média-alta. Na vida diária da maioria dos nórdicos antigos, as embarcações usadas seriam bastante mais modestas e seriam essas também as mais numerosas, embora o registo arqueológico esteja enviesado para as de maior dimensão e qualidade, não só pela sua notoriedade como também por serem as que têm mais hipóteses de sobrevivência até aos nossos dias. Ainda assim, há alguns exemplares: em Årby, na Suécia, a escavação de uma sepultura revelou um pequeno barco com uns meros 3,8 metros de comprimento e um esqueleto interno mínimo, numa versão em miniatura e simplificada dos navios de que se falou nas linhas acima. Teria facilmente navegado pelos rios e lagos da Suécia central, região onde foi achado. E noutro exemplo ainda mais gritante: na Dinamarca, em 1966, descobriu-se uma embarcação datável do final do século XI que mais parece uma jangada e que pode ter sido feita e usada localmente como um ferry entre ilhas e margens de massas de água pouco extensas. Um lembrete de que nem todos os nórdicos eram vikings, nem todos faziam a vida de pirata em navios longos com proas com cabeças de dragão.

NAÇÕES A BORDO

Porém, para os que o faziam, a embarcação podia ser o sustento e a base de uma existência comunitária. Durante o seu primeiro século a século e meio (e ainda em parte no resto do período), a atividade viking foi um fenómeno altamente descentralizado e privado. Regra geral, não foram campanhas planeadas ou patrocinadas por grandes monarcas da Dinamarca, Suécia ou Noruega, mas por uma multiplicidade de planos e ações em que cada cabeça levava a cabo a sua sentença, desde que na posse dos meios navais necessários. E havia muitas cabeças vikings! Era reflexo do panorama político escandinavo referido no capítulo anterior: fragmentado em pequenos poderes e entidades que competiam entre si, levando a uma busca por recursos na pirataria; mas também a uma adesão ao modo de vida do viking por parte de exilados e ostracizados. Como organizadores ou apenas participantes, de forma perpétua ou temporária. E para quem o fizesse durante anos, era toda uma existência coletiva que ganhava forma. Marítima, móvel, com uma identidade própria e, pelo menos nalguns casos, talvez até mais socialmente nivelada do que a vida em terra.

Nisto, tem-se feito uma comparação com os grupos de piratas do Atlântico nos séculos XVII e XVIII, que existiam à margem das sociedades dominantes da época, com tripulações muitas vezes compostas de ostracizados e desfavorecidos, podendo inclusive ser multiétnicas, e que não só recebiam parte dos despojos como podiam pedir contas às lideranças navais. No século xviii houve quem apelidasse essa realidade marítima de hidrarquia, termo baseado na figura mitológica da hidra, cujas várias cabeças tinham a capacidade de, se se cortasse uma, gerar outras duas. Na tradução do conceito, mate-se um líder pirata e outro emerge da tripulação que ele comandava. Ou então esta fragmenta-se, juntando-se a outros bandos ou fundando novos, ou outros grupos de piratas preenchem o vazio nos casos em que a tripulação não sobrevive. Não havia uma cabeça que, uma vez cortada, matasse o fenómeno da pirataria, porque ele tinha muitas cabeças ou lideranças, cada qual com a sua sentença e com a capacidade de se autorreproduzir. E esse fenómeno descentralizado e resistente tem semelhanças com a atividade viking nos seus primeiros séculos, quando múltiplos bandos agiam por sua conta e risco, sem obedecer a uma autoridade central, mas podendo, ainda que temporariamente e se nisso vissem vantagem, aliar-se a poderes régios, lutar contra outros piratas ou juntar-se a vários deles para, pela força dos números, atingirem objetivos de interesse mútuo. Uma realidade em que a noção de hidrarquia assenta bem.

Claro que grupos dessa natureza precisam de uma cola que os mantenha coesos e funcionais, pois se eles podem juntar-se a outros, também podem fragmentar-se em unidades mais pequenas se as condições o favorecerem. Eram precisos laços de fidelidade e entreajuda que reduzissem (embora não eliminassem) as hipóteses de uma desagregação e dispersão, o que, no caso dos vikings, podia ser feito de diferentes maneiras. Uma delas era por via do líder, que se fosse uma pessoa de estatuto e renome podia agregar à sua volta um grupo de guerreiros e projetar fama sufi ciente para criar a expectativa de fortuna para quem o acompanhasse. No fundo, a dinâmica dos senhores da guerra e respetivos séquitos, mas num contexto marítimo. Se bem que isso vinha com riscos, pois se as promessas de fama e estatuto não se concretizassem, ou, havendo vitórias, o líder não recompensava  generosamente a lealdade e o desempenho dos que o seguiam, estes podiam abandoná-lo. Havia uma pressão da base sobre o topo. Em alternativa (ou em simultâneo), podia haver um recrutamento entre familiares, fazendo uso de laços de lealdade preexistentes que eram assim assimilados pelo bando marítimo. Nesse sentido, e como veremos no capítulo seguinte, há referências textuais a vikings que viajavam com as suas famílias. E em Repton, Inglaterra, dois guerreiros nórdicos sepultados lado a lado no século IX eram parentes próximos, talvez meios-irmãos ou pai e filho, segundo o indicado pela análise genética. Porém, podia haver situações de pressão em que a lealdade ao grupo tinha de se sobrepor a laços familiares que pudessem rompê-lo; ou então o bando, na origem ou à medida que fosse crescendo, podia ter uma composição diversa, sem laços prévios e até com diferenças culturais. Nesses casos, a cola teria de ser outra e capaz de substituir identidades preexistentes por uma nova que assegurasse a coesão. Por outras palavras, o grupo tinha de se construir como um nós distinto dos outros. Isso podia acontecer naturalmente, com a camaradagem que nasce da partilha prolongada de experiências, mas podia ser reforçado com costumes, ritos e símbolos comuns que fomentassem um sentimento de pertença e irmandade de armas. Um processo semelhante ao da formação do espírito de grupo em milícias e exércitos modernos, inclusive em cenários de guerra civil, como na Líbia. E tal como na agregação em torno de um líder, de que se falou acima, muito disto seria também verdade para bandos de guerreiros nórdicos em terra, mas transposto para uma existência marítima.

De tudo isto há vestígios e indícios, textuais e arqueológicos. Os já referidos guerreiros aparentados de Repton são um deles, mas há mais, a começar pelo que é dito nos Anais de São Bertino. Segundo essa fonte, em 861, um grupo de vikings entrou no Sena e cercou um segundo bando que já estava fortificado na ilha de Oissel. O rei franco viu nisso uma oportunidade, mas não para atacá-los. Em vez disso, entregou uma quantidade elevada de prata e víveres aos sitiantes, na condição de se irem embora uma vez tomada a fortificação. Pelo meio houve ainda um terceiro grupo que subiu o Sena e juntou-se ao cerco. Quando a base de inverno situada na ilha por fim caiu, os vikings que a defendiam foram forçados a entregar ouro e prata aos vikings que os sitiaram e a tornarem-se aliados deles. E depois, diz o texto, partiram todos, separando-se de acordo com as suas «sodalitates», isto é, as suas sociedades, associações; numa tradução mais livre, de acordo com as suas irmandades. É uma alusão clara ao elo interno dos grupos de vikings, que agiam de forma independente e podiam, por isso, coligar-se ou lutar uns contra os outros, enfrentar ou negociar com reis e aristocratas em terra, mantendo um sentido de identidade própria. A mesma dinâmica terá estado na génese do Grande Exército de 865 a 879, em Inglaterra (tema para o capítulo seguinte), já que ele teve vários líderes simultâneos e dividiu-se em 874. Ou seja, terá sido uma confederação de vários grupos vikings que se terão agregado com vista a ganhos conjuntos e desagregado conforme os interesses se distanciavam.

O termo «sodalitates» tinha equivalência no nórdico antigo «lið», cujo sentido básico seria o de um conjunto de indivíduos, podendo assim, em contexto bélico, identificar um exército, séquito ou bando de guerreiros agregados em torno de um líder, convertendo-se em tripulação armada caso se deslocasse de barco. Por exemplo, a inscrição rúnica Sö 338 alude a um grupo de características militares: dois irmãos são descritos como os melhores homens do lið, um deles como «forungi» (líder), tendo morrido «i orrostu» (em batalha) no Leste europeu. E o texto diz que estiveram ativos tanto no seu país como fora dele, pelo que tratar-se-ia de um bando guerreiro que podia operar em terra ou de barco. Outra inscrição, a U 778, a mesma em que o homenageado é descrito com aparente orgulho como único proprietário de uma embarcação, conta que ele navegou para oriente no lið de Ingvar. A N 184 coloca a morte de um homem chamado Björ no lið quando Knútr atacou Inglaterra, enquanto a Sö 217 é uma homenagem de cinco filhos ao seu pai, Ótryggr, que morreu como membro do lið de um Guðvé, não é dito onde. E a DR 295, embora não contendo a palavra, é uma homenagem a um «drottin» (senhor) feita pelos seus «drengjar» (guerreiros), que elogiam a coragem dele, descrevem-se como os mais próximos do seu líder (seriam o séquito ou guarda pessoal) e referem-se a ele como «sinn bróður» (seu irmão). Neste caso o grupo atuou em terra, mas a identidade e a irmandade de armas patentes no texto rúnico podiam ser transpostas para um contexto naval se senhor e guerreiros se fizessem ao mar.

Se é verdade que os bandos eram compostos por nórdicos, eles não o seriam totalmente, podendo aceitar e assimilar pessoas de outras etnias, incluindo de origens humildes. Uma vez mais, os Anais de São Bertino dão o mote: em França, em 864, um homem que fora monge antes de retomar a condição de leigo juntou-se aos vikings, passando, diz o texto, a viver segundo os costumes deles. Presume-se que terá assumido os traços identitários do grupo a que se juntou, embora os motivos não sejam conhecidos. A possibilidade de uma síndrome de Estocolmo não pode ser excluída, mas é igualmente viável que ele o tenha feito de livre vontade como tentativa de melhorar um estatuto social que talvez não passasse da cepa torta. Isto é, que ele tenha decidido correr o risco de se juntar aos vikings na esperança de aventuras e de uma ascensão social que estar-lhe-iam vedadas na sociedade franca. E como ele terá havido outros: um sermão pelo arcebispo Wulfstan, de York, no século XI, embora críptico na linguagem, permite a leitura de que escravos ter-se-ão somado aos vikings; e, na Irlanda, a análise isotópica de três indivíduos sepultados com armas de características nórdicas indiciou, para dois deles, uma origem escandinava e, para o outro, uma possível proveniência britânica. Outra análise isotópica, mas às ossadas de dezenas de homens decapitados e depositados numa vala comum no Sul de Inglaterra, entre a segunda metade do século X e a primeira do XI, revelou também indícios de origens diversas. Em concreto, Sul e Norte da Escandinávia, países bálticos e Leste da Europa, com trinta e oito deles a terem vivido fora das Ilhas Britânicas nos dois a cinco anos anteriores à sua morte. Seriam membros de um ou mais bandos vikings, de adolescentes a homens nos seus cinquenta anos, capturados e executados no local. Quanto a símbolos e ritos que ajudariam a transformar a diversidade étnica em identidades comuns, os Anais de São Bertino contam que, em 865, o rei franco recebeu estandartes capturados a um grupo viking que estava no rio Loire. Estilos de roupa, joalharia e cores dos escudos podem também ter sido empregues para criar e demonstrar uma identidade de grupo, havendo algumas possibilidades arqueológicas. E um relato bizantino de uma dança encenada por membros da guarda imperial, ao que tudo indica escandinavos, dá corpo à hipótese da formação do espírito de grupo com recurso a práticas rituais.

Em suma, muitos dos bandos vikings, principalmente aqueles cuja atividade se prolongava por vários anos consecutivos, eram como que uma espécie de pequenas repúblicas marítimas. Isto é, entidades político-militares que dispunham de uma população, estrutura de poder, forças armadas, identidade e símbolos próprios, rendimentos provenientes da atividade pirata, mercenária ou comercial (como a venda de escravos), relações com governos em terra ou com outros bandos e que agiam com independência, a sós ou em coligação, podendo ganhar ou perder membros. E isto, como aponta Christian Cooijmans, obriga a olhar para as hidrarquias vikings não como grupos caóticos de selvagens, com lideranças impulsivas e sem noção, mas como entidades racionais, proativas e adaptáveis. Não eram bandos de suicidas meio à deriva a atacar o que lhes aparecesse pela frente; eram pequenas comunidades ambulantes e autossustentáveis, cuja sobrevivência e prosperidade dependiam da sua capacidade de executar estratégias bem pensadas. Como território «fixo», porque mais duradoiro, tinham apenas as suas frotas, que podiam chegar às dezenas de embarcações e que eram assim mais do que simples veículos. Pelo menos até essas hidrarquias se territorializarem, fosse pela conquista ou colonização, como no Norte e no Leste de Inglaterra, fosse por doação, como a que veio a dar origem ao ducado da Normandia, quando Hrólfr, ou Rollo, passou de hidrarca a senhor feudal franco. Se dúvidas há, o próximo capítulo deverá tratar de algumas delas.

* Mas em lado nenhum do mundo alguém vai ter uma Noite das Bruxas de sucesso se se mascarar de Skuldelev 5.

** Sim, como a marca de caldos. Não me perguntem porquê.