O líder do executivo de coligação PSD/CDS-PP/PPM, José Manuel Bolieiro, falava no parlamento açoriano, na Horta, após uma declaração política do CDS-PP a criticar o projeto de decreto-lei que altera o regime jurídico das atividades espaciais e que também o PS alertou ser violador da Constituição da República.
A agência Lusa noticiou hoje que, numa comunicação do gabinete do presidente do Governo dos Açores, dirigida ao gabinete do secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, o executivo regional alerta que o projeto de decreto-lei “não garante o cumprimento" do Estatuto Político-Administrativo e, consequentemente, "da Constituição da República Portuguesa”.
Um dos argumentos da presidência do Governo Regional prende-se com o facto de o projeto de diploma do Governo da República prever uma consulta “não vinculativa” à região em matérias espaciais.
Acresce que os Açores têm legislação própria produzida sobre essa matéria e, de acordo a Constituição e o Estatuto Político-Administrativo da região, é essa que deve prevalecer perante a legislação “continental”, como lhe chamou hoje José Manuel Bolieiro.
“São os atos legislativos das regiões que prevalecem. É no regime do direito supletivo que pode intervir qualquer iniciativa continental. Este é o quadro argumentativo de que não abdicaremos”, explicou o líder do executivo no parlamento.
Bolieiro manifestou a intenção de “transformar esta tentativa” do Governo da República “num nado-morto e aproveitar oportunidade para refletir sobre aprofundamento da autonomia”.
O social-democrata defendeu que, “no quadro de uma futura revisão da Constituição República, devia prevalecer a reserva de soberania”.
“Os centralistas evitaram esta possibilidade. O que é preciso é que possamos insistir no desafio de se trabalhar por uma lista de reserva de soberania”, sustentou.
Para Bolieiro, “qualquer avaliação de iniciativas de cariz maniqueísta não pode senão merecer o protesto e a censura política, em primeiro lugar, e, depois, o respetivo argumentário jurídico”.
O chefe do Governo Regional respondia, assim, à intervenção do seu antecessor na liderança do executivo, o socialista Vasco Cordeiro.
O agora deputado alertou que, “para o PS, a questão que se deve colocar no momento, antes da argumentação política, é a inconstitucionalidade flagrante da proposta de decreto-lei”.
De acordo com Vasco Cordeiro, a proposta da República “viola o artigo 228, n.º 2, da Constituição, que dispõe que, na falta de legislação regional própria, se aplicam nas regiões autónomas as normas legais em vigor”.
“Ou seja, sempre que houver legislação regional, não se aplica a legislação nacional”, avisou.
O debate começou com uma declaração política do deputado Pedro Pinto, do CDS-PP, a lembrar que o Governo da República já tinha produzido um decreto sobre questões espaciais, em 2019, tendo depois o Governo Regional aprovado regulamentação sobre a matéria.
“Trata-se de uma alteração cirúrgica que faz desaparecer o enquadramento jurídico regional para a legislação regional”, lamentou.
Para o deputado do CDS-PP, o primeiro-ministro, António Costa, “não quer que as atividades espaciais se desenvolvam nos Açores sem o controlo centralista do Governo da República”.
Com a alteração proposta, acusou, as regiões autónomas “passam de uma situação com competência para regulamentar nos seus territórios para uma situação em que apenas são consultadas”.
João Bruto da Costa, que já antes tinha feito uma declaração política contra o centralismo do Governo da República, defendeu que o parlamento açoriano deve ter uma postura “de crítica, sem medo, perante o sacudir de responsabilidades por parte do Governo, não respeitando os poderes e a autonomia dos Açores”.
“Esta assembleia tem de estar frontalmente contra esta postura de desrespeito da autonomia”, frisou.
António Lima, do BE, considerou a proposta “absolutamente inaceitável” por constituir um “ataque intolerável à autonomia”.
O deputado explicou que o BE apresentou uma proposta, para ser votada ainda durante o presente plenário regional, para que a Assembleia Legislativa dos Açores tome posição sobre o assunto.
“O que leva um Governo a tentar apagar do enquadramento jurídico nacional toda e qualquer competência regional sobre este assunto? Que interesses estão em causa, quando um Governo toma uma decisão destas com a Assembleia da República dissolvida? O que leva a que se ataque desta forma uma autonomia constitucional? Que interesses económicos e militares estão aqui em causa?”, questionou.
Na legislação em vigor, consultada pela Lusa, “os procedimentos de licenciamento das atividades espaciais, de qualificação prévia e de registo e transferência de objetos espaciais relativos a atividades a desenvolver nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, bem como o respetivo regime económico e financeiro, são definidos por decreto legislativo regional”.
A alteração proposta, que mereceu parecer desfavorável do Governo Regional açoriano, prevê que “o licenciamento das atividades espaciais que sejam desenvolvidas a partir das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira” seja “objeto de consulta ao respetivo Governo Regional”.
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