Andámos anos a dizer “Portugal devia investir mais no turismo!” e “Podíamos ser auto-suficientes se investíssemos mais no turismo!”. Desejámos, durante muito tempo, que Portugal fosse um destino turístico de referência na Europa e no mundo. Queríamos que os estrangeiros gostassem de nós e nos continuassem a elogiar a comida, o fado e a hospitalidade. De repente, os nossos desejos tornaram-se realidade e Portugal começou a liderar vários rankings dos melhores destinos para visitar e viver. Deixámos de ser um país de turismo de praia no verão para meia dúzia de ingleses em busca de um escaldão, e passámos a ser inundados durante todo o ano por turistas um pouco de todo o mundo. Bem, na verdade, quando digo Portugal digo Lisboa, Porto e Algarve, já que o resto ainda continua um pouco esquecido.
Como bons portugueses que somos, de ADN lamuriante, só estamos bem a dizer mal e esses desejos de investimento no turismo tornaram-se, rapidamente, em queixumes: “Portugal tem demasiados turistas!”; “Está cheio de tuk-tuks, malandros dos turistas!”; “As rendas e os preços estão muito altos por causa dos turistas!”. Tudo verdade, atenção; é chato ter de andar aos encontrões na rua, é chato ter de levar com o barulho dos tuk-tuks e é obsceno pedirem 1500€ por um T2 sem janelas, mas é o preço que temos de pagar para ter um país turístico como sempre desejámos.
“Ah, mas tu moras em Alvalade agora! Falar de barriga cheia é fácil!”, pensam alguns de vós. Certo, mas só moro em Alvalade porque a minha namorada comprou a casa barata na altura da crise imobiliária e pagamos menos de empréstimo do que pagaríamos por um T0 sem janelas no Cacém. O vizinho do lado paga 1200€ por um T2 igual ao nosso e sabem o que acontecia se fosse esse o meu caso? Voltava para a Buraca ou outra zona dos subúrbios onde a maioria das pessoas vive e sempre viveu porque os centros sempre foram inacessíveis para o comum dos mortais. Quando era pequeno também adorava ter vivido no Chiado, mas tive de me contentar com a Buraca. É a vida.
Deve haver apoios e incentivos? Claro. Deve o Estado ditar o preço ao qual um particular pode alugar a casa onde investiu? Parece-me pouco ético. O mercado manda e há quem pague 500€ por um quarto sem wi-fi. É o custo de ter cidades turísticas e cosmopolitas. É igual em todas as outras; os preços sobem. Não quero fazer de advogado do diabo, mas as rendas só estão muito altas para quem não é senhorio. Vão lá perguntar a quem tem casas para alugar se acha que as rendas deviam ser mais baixas. Sim, quem ganha o ordenado mínimo não consegue viver no centro de Lisboa a não ser num T0, dividido com mais quatro pessoas, num quinto andar sem elevador e com a casa de banho dentro do frigorífico, mas é a vida. As rendas não estão altas, os ordenados é que estão baixos, como sempre.
A única solução que vejo é começarmos a tratar mal os turistas. Temos de nos livrar daquele estigma de que somos o melhor povo do mundo na arte de receber, que somos simpáticos e afáveis, e temos de os começar a tratar mal. No fundo, aquele restaurante de Lisboa que enganava os turistas, Made in Correeiros, e os taxistas do aeroporto é que estão certos! Precisamos de mais gente que trate mal e se aproveite dos turistas para que eles deixem de cá vir e voltemos ao nosso Portugal de antigamente, por isso, sempre um turista vos perguntar o melhor sítio para comer mandem-no a um sushi chinês; sempre que um turista vos pedir indicações, mandem-nos para Massamá e, por fim, sempre que engatarem uma ou um turista, tenham apenas uma performance mediana.
Sugestões e dicas de vida completamente imparciais:
Um podcast: Conta-me tudo.
Uma série: Troglodicas.
Um evento: Stand up comedy solidário.
Comentários