O voto, que foi interpretado como uma manifestação de dignidade catalã frente à postura autoritária do governo de Madrid e à vaga repressiva das instituições espanholas, deu oportunidade aos independentistas para demonstrarem que são capazes de fazer política útil, negociar, servir os interesses da população e captar o potencial da Catalunha. A oportunidade era boa, mas está a ser desperdiçada. Os independentistas, apesar de maioritários no número de deputados, não conseguem chegar a um acordo entre eles sobre quem pode ser investido como presidente do governo da Catalunha.
Muita da responsabilidade pelo impasse é de Carles Puigdemont: o ex-presidente sabe que não vai poder governar a Catalunha a partir de Bruxelas e também sabe que, nos tempos mais próximos, não poderá voltar a Barcelona sem ser preso, por desobediência à ordem institucional espanhola. A sensatez manda que escolha dar o protagonismo da presidência do governo em Barcelona a uma figura, do seu lado, mas que tenha condições para governar com eficácia. Puigdemont, talvez por não querer eclipsar-se, não faz nenhum gesto nesse sentido, antes pelo contrário, prolonga o impasse. Não se revela homem de Estado.
Depois de meses em que o governo de Madrid mostrou deplorável incapacidade para dialogar com os republicanos da Catalunha, agora são eles, os independentistas catalães, quem não consegue o elementar que é um entendimento entre as diferentes forças catalãs para um governo capaz de fazer pontes políticas e mostrar competência para liderar os catalães.
Os independentistas catalães têm razões de sobra para se queixarem de quem tem governado as instituições espanholas. Mas os cidadãos da Catalunha, mesmo os que votaram nas forças independentistas, começam a estar fartos da inércia daqueles em quem votaram.
As sondagens mostram que o enfado com a política e os políticos cresce na Catalunha e em toda a Espanha: o PP, de Rajoy, aparece em quebra em todo país, o PSOE, de Sanchez, não consegue aproveitar, e a onda do Podemos, de Iglesias já perdeu muita da energia inicial. Perante a insatisfação das bases do PP, é o Ciudadanos, de Rivera, quem está a emergir a encabeçar a alternativa para o próximo governo de Espanha. Na Catalunha, se o impasse persistir, é forte a possibilidade de novo recurso a eleições e cresce a probabilidade de os independentistas perderem a maioria.
Em Itália, há uma semana, um partido que se declara da antipolítica foi o mais votado nas eleições. Os políticos espanhóis parecem estar a empurrar os eleitores para um semelhante voto de zanga.
Vale ver:
Este bom enquadramento sobre o que tem estado a acontecer em Itália.
Marine le Pen acredita que um dia ainda vai ser nº1 em França. Como operação de “marketing” quer mudar o nome ao partido, passá-lo de FN para RN. Mas sem sair da extrema-direita tradicional.
A Colômbia é um país que conseguiu, na presidência quase a terminar de Juan Manuel dos Santos, através da negociação, pôr fim a meio século de conflito armado com as FARC. Santos foi distinguido com o Nobel da Paz e a Colômbia é hoje uma potência que funciona na América Latina. O subcontinente tem estado a virar à direita, mas as sondagens sugerem que, em maio, a Colômbia pode virar-se para a esquerda.
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